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Já assistimos “O Hobbit: A desolação de Smaug”!

Zemanta Related Posts ThumbnailQuerido povo valinoreano, é com a voz trovejante de Smaug/Benedict Cumberbatch ainda ressoando em meus ouvidos que sento para escrever mais uma das nossas tradicionais resenhas de filmes tolkienianos.

Quem já leu esses textos escritos pela Equipe Valinor por aqui sabe que a minha tendência é ser detalhista até o nível do paroxismo (hehehe) e não babar em demasia o ovo de Peter Jackson e companhia. Pra variar, vamos ter esses dois elementos nesta resenha de “O Hobbit – A Desolação de Smaug”. Preparem-se, portanto, pra SPOILERS E MAIS SPOILERS EM LETRAS GARRAFAIS nos parágrafos a seguir.

Resumindo muito resumidamente o que vou explicar com spoilers e requintes de crueldade depois, eu diria que, do ponto de vista de quem é fã dos livros como eu (e, desculpaê, mas eu aposto o meu toba no truco que as obras de arte realmente perenes e que devem ser levadas a sério são os livros, não os filmes), minha sensação geral depois de assistir a “Desolação” é de ambivalência.

Explicando melhor: embora seja difícil obter um quociente objetivo de “fidelidade”, minha impressão é que este filme é o menos fiel em relação aos livros de todos os da hexalogia (se é que a palavra existe), por enquanto, contando os da trilogia SdA. E, em geral, quem tenta fazer diferente de Tolkien acaba fazendo caquinha. Achei “Desolação” inferior a “Uma Jornada Inesperada” – por pouco, é verdade, mas inferior.

Por outro lado, o positivo, as cenas de ação estão mais comedidas e bem executadas no segundo filme (com exceção das que envolvem um certo elfo platinado), Smaug de fato é o dragão mais descaralhante da história do cinema, Martin Freeman é sempre um excelente Bilbo, Balin e Thorin não decepcionam. E, pasmem, Tauriel não compromete. A moça sabe até usar athelas. E balança até corações anões (é, você entendeu certo).

Vamos, então, aos detalhes saborosos (e outros nem tanto).

Na balada em Bri

Taí um lugar que eu não esperava ver nesse filme, mas o fato é que “Desolação” começa com um flashback do fatídico encontro de Gandalf e Thorin em Bri que levou ao recrutamento de Bilbo para a demanda de Erebor (mais detalhes você encontra nos apêndices do SdA e em “Contos Inacabados”). Cá entre nós, sou só eu que se irrita quando retratam Bri como um lugar tenebroso nos filmes? Bri era pra ser ALEGRE! Bom, deixa pra lá…

O que interessa mesmo é que, nesse papo de Gandalf com Thorin, o roteiro introduz a seguinte ideia: o plano de Gandalf seria o de usar Bilbo para pegar a Pedra Arken na surdina e trazê-la para Thorin. Assim, o príncipe anão teria em mãos a joia que era a prova do direito divino de seus ancestrais de reinar sobre a Casa de Durin e todos os demais anões. Assim, todos os demais domínios anânicos (ô palavra feia docaray) uniriam-se a Thorin para finalmente fazer uma bolsa fashion com o couro de Smaug.

Hmmm. Tá. Eu sinceramente não sei o que pensar dessa inovação dos filmes. Por um lado ela ajuda a esconder o fato de que, no livro, Thorin e Cia. simplesmente não tinham um plano decente (não acho que eles imaginassem que Bilbo ia matar o dragão sozinho). Por outro, ela complica, e muito, o plano espertíssimo de Bilbo para tentar forçar a reconciliação de anões, elfos e humanos antes da Batalha dos Cinco Exércitos usando justamente a Pedra Arken como material de barganha. Bem, problema pro terceiro filme resolver, não é mesmo?

Corta para o “presente”, no qual Bilbo, atuando como espião da trupe, vê que os orcs estão se aproximando deles novamente e, pior, nota a silhueta de um urso gigantesco na escuridão. Gandalf faz uma cara esquisita e diz: “Temos de procurar abrigo numa casa aqui perto. O dono pode ajudar vocês – ou decidir matá-los. De qualquer jeito, vocês não têm escolha”.

Os anões, então, correm loucamente em direção à casa de madeira que enxergam ao longe, sendo perseguidos pelo ursão. Conseguem entrar e trancar o portão nas fuças do bicho. A casa está cheia de bois chifrudíssimos, ovelhas, cavalos e colmeias (no 3D, fiquei com medo que uma abelha picasse o meu nariz). “O que era aquilo?”, pergunta um deles. “Nosso anfitrião”, responde Gandalf.

Quando raia o sol, numa cena digna de “Um Lobisomem Americano em Londres”, vemos o urso monstruoso virar Beorn, que entra na casa e põe-se a conversar com a companhia de Thorin. A parte triste é que, mesmo com quase três horas de filme, a participação de Beorn é quase uma ponta, de tão curtinha. Achei que o excesso de pelo facial fez o ator ficar com cara daqueles “lobisomens mexicanos” com problemas hormonais, e o sotaque meio bizarro foi desnecessário. Mas foi bacana ao menos a fala mal humorada do troca-peles: “Não gosto de anões, mas gosto menos ainda de orcs, então vou ajudar vocês”. Ah, detalhe: Beorn dá a entender que ele é o último de toda uma raça de troca-peles que vivia na região – até onde não sabemos, não tinha nada disso na Terra-média tolkieniana.

No meio do mato eu vi

Corta para as bordas da Floresta das Trevas. Os anões e Bilbo estão apeando de seus pôneis beórnicos quando Gandalf recebe uma mensagem telepática de Galadriel (pois é…) convocando-o para investigar os túmulos dos antigos Espectros do Anel (!?) no norte para descobrir, afinal, quem reocupou Dol Guldur. É só então que o mago decide deixar os anões seguirem viagem sozinhos (até esse momento ele pretendia entrar na floresta com eles).

E lá se vai Gandalf, enquanto Thorin e Cia. adentram a mata. Eles tentam não deixar a trilha, mas vão ficando progressivamente mais e mais desorientados (meio com cara de quem tomaram chá de cogumelo, na verdade; por que será que o PJ nunca consegue retratar alguém meio perdidaço sem fazer a pessoa parecer drogada?). Para tentar sair dessa situação esquisita, Bilbo escala uma das árvores e vê, lá do alto, que os anões não estão assim tão longe do fim da floresta.

Só que, ao descer, o hobbit vê que seus amigos sumiram e é rapidamente atacado por uma aranha monstruosa, que o enrola feito novelo de lã em dois tempos. Sim, são elas, as crias de Laracna. As quais, para crédito de PJ, estão absurdamente assustadoras mesmo.

Passado certo tempo, vemos todos os novelinhos prontos para serem devorados. Uma aranha está prestes a mordiscar Bilbo quando ele consegue enfiar Ferroada no bucho da bicha e coloca o Anel. Nosso hobbit, a partir daí, passa a entender o que dizem as aranhas, que estão querendo comer os anões de uma vez. Sai dando espadadas a torto e a direito e as aranhas logo gritam: “ele tem um ferrão, ele tem um ferrão”, a deixa perfeita para o batismo de Ferroada. Infelizmente não rolou a musiquinha da Aranhoca. Triste, né?

Mas Bilbo parte para resgatar seus amigos, até que uma flecha saída aparentemente do nada planta-se nas fuças da aranha mais próxima. Sim, é a elfa guerreira Tauriel, acompanhada de Legolas e do resto do exército do rei élfico Thranduil. Enquanto dizimam as aranhas, os elfos já vão dando uma de cuzões pra cima dos anões, desarmando e amarrando os coitados.

Enquanto isso, Bilbo perde momentaneamente o Anel e parte feito um alucinado para cima de uma aranha que está impedindo o hobbit de pegar seu “Precioso”. Bilbo mata a aranha e ainda berra pra ela, com voz meio golúmica: “É meu!”. Creepy…

Os anões são levados para a fortaleza subterrânea de Thranduil e devidamente trancafiados. Kili, todo malandrovski, já vai jogando um xaveco em Tauriel dizendo “Você não vai revistar minhas calças? Vai que eu escondi uma espada lá dentro”, no que ela responde “Pode ter uma espada, ou pode não ter nada aí embaixo”. Hmmm…

Thranduil continua sendo o elfo mais insuportável da história do cinema e convoca Thorin para uma tentativa de acordo. Diz que pode liberar os anões se eles conseguirem trazer pra ele alguns tesouros de Smaug que deseja. Thorin diz que, depois que seu povo foi rejeitado pelo rei élfico quando mais precisava, nunca mais iria confiar em Thranduil. E assim volta Thorin pro xilindró.

Entrementes (adoro essa palavra), Tauriel dá uma passadinha na cela do Kili (após ouvir de Thranduil que “meu filho não é pro seu bico”) e os dois conversam… sobre a luz das estrelas e da Lua, já que os elfos estariam celebrando Mereth em-Gilith, a Festa das Estrelas. Sério, simples assim. Na verdade é um bom tema à la Silmarillion para uma elfa e um anão conversarem, já que as duas raças chegaram ao mundo antes do surgimento do Sol. Sinceramente, achei bonitinha e bem feita a cena quase romântica entre eles.

Os anões estão chafurdando em desespero quando Bilbo finalmente tira o Anel e começa a libertá-los. (Antes disso, rola uma cena engraçadíssima na qual Thranduil diz: “Você aí, não pense que não estou vendo você nas sombras” e Bilbo acha que é com ele, mas na verdade o rei está falando com Tauriel.)

Rapidamente – muito mais rapidamente do que no livro, como sabemos – Bilbo se aproveita do bebum do velho Galion (sim, o elfo pinguço aparece!) para pegar as chaves da prisão e libertar seus camaradas, enfiando-os rapidamente nos barris vazios de vinho e jogando-os no rio. (Momento pastelão: Bilbo esquece de pegar um barril para si próprio e acaba pulando no rio e se agarrando a um dos barris dos anões.)

Vem então a sequência de perseguição no rio, que pra mim é a parte mais ridícula e desnecessária do filme. Ocorre que os orcs que estavam na cola de nossos heróis anânicos desde Eriador reaparecem no meio da floresta (Thranduil demitiu o ministro da Defesa depois dessa) e tentam matar os anões nos barris, mas acabam batendo de frente com Legolas e Tauriel. Legolas simplesmente fica em pé equilibrando-se na cabeça de Dwalin e, creio, Bombur pra ficar flechando orc atrás de orc. Aí em dado momento o Bombur é jogado pra fora do rio e, ainda entalado no barril, enfia os braços por dentro da madeira, tipo mestre do kung-fu, e sai machadando orcs como se fosse um helicóptero. Cascata.

O resumo da ópera é que os anões e Bilbo finalmente descem o rio até o lago e encontram na beira d’água um barqueiro que é ninguém menos que… Bard. Após muito papo em cima do rapaz, inclusive uma oferta generosa de dinheiro, os anões finalmente conseguem que ele lhes dê uma carona até a Cidade do Lago.

Entrementes (olha aí a palavra de novo), Gandalf e Radagast verificam que os Espectros do Anel não estão em suas covas e Gandalf, ao chegar a Dol Guldur, percebe que há lá um feitiço para ocultar um exército de orcs na região. Os orcs tentam atacá-lo, e Gandalf está prestes a dar no pé quando o mago é detido por uma espécie de sombra maligna que se espalha por todos os cantos de Dol Guldur. A sombra vai lentamente tomando forma: alterna-se entre um olho em chamas e uma silhueta em chamas com uma conhecida forma de capacete espinhudo. “Sauron”, murmura o aterrorizado mago. É um gênio, esse Gandalf.

Intrigas políticas

Para evitar que os anões sejam impedidos de entrar na Cidade do Lago, Bard combina com um mano dele pra cobrir os barris dos pobres com peixe. Como insulto final, ele ainda traz os anões pra dentro da sua casa entrando pela privada.

Todas essas precauções acontecem porque o Mestre da Cidade do Lago (Stephen Fry, divertido) tem tido sua autoridade contestada pelo povão, que tem Bard como uma de suas figuras queridas. O arqueiro (sim, ele carrega um arco no encontro com os anões na beira do lago) tem sua casa vigiada. O coitado ainda é viúvo e pai de três filhos. O filme coloca isso em termos de uma espécie de disputa política entre aristocratas versus democratas. Pra mim pareceu meio babaca, até porque complexidade política nunca foi o forte do PJ.

A grande treta surge porque os anões querem armas para seguir viagem rumo à Montanha, e Bard diz que o único jeito é invadir o arsenal da cidade. A coisa toda quase dá uma merda federal, mas no último momento Thorin se revela como o herdeiro do Rei sob a Montanha e promete que dividirá todas as riquezas de Erebor com o povo de Esgaroth se a Cidade do Lago o apoiar. Bard, que todos sabem ser o herdeiro do rei Girion de Valle, diz que é loucura atacar o dragão, mas, como no livro, o povão de Esgaroth fica do lado de Thorin.

Parêntese importante: quando estão na casa de Bard, os anões veem no alto da maior torre da cidade uma espécie de catapulta (que está mais para uma balista ou um escorpião, lançadores de armas parecidas com lanças da época romana) e Balin lembra que só uma “flecha preta” (na verdade uma lança) disparada de uma arma daquelas poderia derrubar um dragão, e lembra que Girion tentou, mas não conseguiu atingir Smaug quando Valle e Erebor foram destruídas. Ao que tudo indica, PJ achou que seria inverossímil que um arco e flecha “normal” derrubasse Smaug, o que sinceramente achei uma babaquice, mas beleza.

Bem, de volta à ação: após receberem armas, roupas e serem homenageados num banquete, os anões se preparam para partir. Só que Thorin barra Kili, que foi ferido por uma flecha orc e anda meio zureta (a flecha na verdade está envenenada) e deixa lá também Óin (o deficiente auditivo), para ajudar a cuidar dele, e Bofur, que encheu a cara e não chegou a tempo de pegar o barco. Trash.

É com seus números diminuídos, portanto, que os anões e Bilbo finalmente põem os pés em Erebor. O drama para achar a porta com “a última luz do dia de Durin” é basicamente o mesmo do livro, com Bilbo, recusando-se a perder a esperança, como sempre, notando o tordo batendo o caracol na parede de pedra e finalmente achando o buraco da fechadura.

Enquanto isso, os orcs chegam à Cidade do Lago para tentar acabar com os anões, e os pobres, junto com os filhos de Bard, quase vão para o saco, sendo salvos no último minuto por… Legolas e Tauriel, claro. O elfo loiro fodão quase toma um cacete de Bolg (sim, ele aparece), mas o orc acaba fugindo, com Legolas a persegui-lo. Tauriel prefere ficar pra tentar salvar a vida de Kili, usando – lógico! – folhas de athelas para isso e tendo sucesso. Meio grogue, meio poeta, o anão a compara à luz das estrelas e pergunta se algum dia ela poderia tê-lo amado. Ela faz que vai responder e fica quieta (sério, é enigmático assim!).

Com os anões dentro da Montanha Solitária, o plano é simplesmente para que Bilbo entre lá, surrupie a Pedra Arken e dê no pé. Mas é claro que Smaug o detecta. A conversa dos dois é praticamente idêntica à do livro (aleluia!), inclusive com as referências sinistras do dragão. É disparado a cena mais empolgante do filme.

Mas é claro que Smaug percebe que Bilbo na verdade quer a Pedra Arken e põe o pobre hobbit pra correr (na fuga ele encontra Thorin e fica ambíguo se, no fim das contas, Bilbo pegou ou não a pedra, Thorin quase dá uns cascudos nele por causa disso). Os anões começam uma fuga desesperada pelo interior da montanha. (Coisa bem bacana do ponto de vista visual: peito do Smaug começa a brilhar toda a vez que ele vai soltar uma rajada de fogo.) Chegam a um beco sem saída, até que Thorin resolve armar alguma maneira de, afinal, enfrentar o assassino de seu povo.

O plano é complicadinho, colocado em prática em sequências de ação extremamente rápidas, mas, em suma, consiste em atrair Smaug para perto de uma enorme forja de Erebor, na qual os anões põem-se a derreter gigantescas quantidades de metal e a derrubar todo tipo de coisa pesada na cabeça do dragão. No fim das contas, Thorin sobe perto de uma imensa estátua dos reis anões do passado e desafia abertamente Smaug, dizendo que veio para se vingar. A estátua de pedra, então, desfaz-se, lançando sobre o dragão um oceano de ouro derretido. Ele afunda.

Nada poderia a sobreviver a isso, certo? Mas Smaug, feito um boi que pisou num rio lamacento, vai saindo do ouro derretido, aparentemente sem feridas mais graves. E, com uma voz entre assustado e enfurecido, grita que os anões verão o que é vingança. E bate asas rumo ao lago. Bilbo murmura: “O que foi que nós fizemos”. E eis que vêm os créditos. Cabou. Agora, só em dezembro de 2014.

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