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Entrevista exclusiva com Ricky Whittle, o Shadow de Deuses Americanos!

Tem coisas que só o Valinor faz pra vocês 😉 No ano passado, bati um papo muito interessante com Ricky Whittle, o Shadow da série American Gods/Deuses Americanos, baseada no livro de mesmo nome do mestre Neil Gaiman. Eis aqui o áudio da conversa, em inglês. Temos legendas automáticas em inglês e também em português feitas “no braço”. Confira no canal do YouTube abaixo.

Você também pode acompanhar a íntegra da entrevista em formato de texto abaixo. O resumo está na reportagem publicada aqui no site da Folha. 

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REINALDO – Imagino como deve ser difícil enfrentar esse monte de entrevistas num dia só.

RICKY – Não tem problema, estou cheio de energia, então vai dar tudo certo!

REINALDO – Que bom! Bom, já que você está cheio de energia, posso começar com a pergunta mais chata?

RICKY – Claro!

REINALDO – Você certamente sabe que houve vários relatos sobre problemas quando vocês estavam filmando a segunda temporada. Resumindo, por que você acha que filmar essa segunda temporada foi tão complexo e tão difícil?

RICKY – Há problemas na filmagem de qualquer programa de TV, qualquer filme, de qualquer tamanho. É só a produção, é o que acontece, e não é diferente de qualquer outro programa. O que é diferente é que temos nas mãos um programa que é um monstro, que é enorme.

Então, para nós, o importante é que cada um faça seu trabalho. Nós, atores, decoramos nossas falas, gente como eu e como Pablo Schreiber precisa malhar, temos de comer nossas 5.000 calorias por dia e chegar a um certo peso porque temos de ficar com uma certa aparência, aparecemos no set de filmagem e somos profissionais.

Tenho a benção de fazer parte de um elenco incrível que rala pra caramba, que aparece todo dia para o trabalho com uma ética de trabalho incrível. Eles continuam a elevar os patamares e continuam a ser o melhor elenco conjunto da TV, é incrível. E cabe a nós manter essa responsabilidade para os nossos personagens. Na temporada 1, desenvolvemos esses personagens com Bryan Fuller e Michael Green e estabelecemos esses personagens.

E isso realmente criou raízes em nós e se desenvolveu, e agora eles são parte de nós. Então não importa quem acaba chegando à série. Quando Jesse Alexander veio para a temporada 2, ele não precisou se preocupar com os personagens, porque era nossa responsabilidade manter essa consistência. Assim, se algo não estava muito bem, havia essa enorme colaboração para termos certeza de que tudo prosseguiria sem problemas.

Vai ser a mesma coisa no futuro. Quem quer que se integre à equipe, cabe a nós, atores individuais, manter a consistência e a continuidade dos personagens. Se Shadow diz alguma coisa que não soa certa, cabe a mim dizer “Não acho que ele diria isso, acho que diria algo mais desse jeito”, e aí temos uma conversa a respeito e achamos a melhor solução para seguir em frente.

REINALDO – OK. Falando sobre o próprio Shadow, é um papel difícil, certo? Por que, ao menos no livro, ele é um cara muito taciturno, você raramente sabe o que ele está pensando por meio do que ele fala, tudo acontece dentro da cabeça dele. Como você faz isso na série, onde é preciso ter diálogos, sem mudar demais essa característica do Shadow?

RICKY – Sinto que talvez essa seja a parte mais difícil como ator, para mim, essa coisa de retratar as emoções de Shadow sem falar. Muito da história de Shadow no livro é retratado como monólogo interno, que temos no programa, mas sem palavras. Então meu papel é ter esse monólogo interno na cabeça e mostrar para o público o que ele está pensando por meio das expressões, das reações dele.

Shadow está sempre pensando, em todos momentos e todas as cenas, seja na temporada 1, quando ele fica pensando se o Sr. Wednesday é um velho pervertido, ou um sujeito misterioso, ou um mocinho ou um vilão, ele está sempre pensando em alguma coisa. Sabe, de fato é um grande desafio, mas fica mais fácil com a ajuda de atores como Ian McShane, que é incrível, e eu estou apenas reagindo ao seu trabalho fantástico.

Então às vezes há momentos em que podemos acrescentar uma voz para retratar algo que não está sendo passado diretamente, em outras horas é meu papel transmitir tudo de maneira visual, como reação de atuação. Mas é muito difícil transmitir as nuances desses monólogos internos lindos que Neil Gaiman escreveu no livro e, como ator, minha tarefa muitas vezes é deixá-los “tocando” na minha cabeça para entender o que Gaiman quis dizer e mostrar o que Shadow estava tentando pensar ou está pensando em algum momento específico. Sim, essa é provavelmente a parte mais difícil de representar Shadow.

REINALDO – Outra coisa que as pessoas provavelmente te perguntam muito: você era um leitor de livros sobre mitologia ou folclore antes da série, era algo que te interessava?

RICKY – Não, não me interessava nem um pouco…

REINALDO – De jeito nenhum?

RICKY – De jeito nenhum! Nunca foi uma coisa minha. Quando eu era criança, adorava biografias, adorava ler sobre meus heróis esportivos favoritos, suas lutas e dificuldades e coisas assim, astros do futebol ou Michael Jordan, ou comediantes, como Billy Connolly, que eu adorava. Então eu comecei a estudar mitologia quando a série começou, e passei a descobrir coisas muito interessantes que talvez eu devesse ter aproveitado antes.

Neil Gaiman já escreveu tantos livros do gênero, sobre esses assuntos, mas, tal como Shadow, eu vou aprendendo ao longo do caminho. A série é uma plataforma fantástica, um jeito de educar o mundo sobre várias religiões, mitologias, raças, fés, e é algo capaz de mostrar todas elas em sua verdadeira beleza, de mostrar como cada cultura é bela.

Não é algo que mostre que uma é verdadeira e outra falsa, que meu deus é verdadeiro e o seu é de mentira, mas mostra que eles podem coexistir, que todos existem juntos, contanto que você acredite neles – o importante é acreditar. Nesta nova temporada, temos uma nova personagem, Sam Crow, que é interpretada por Devery Jacobs. Sam Crow é uma lésbica e membro das Primeiras Nações [indígenas americanos]…

REINALDO – É uma personagem muito divertida no livro!

RICKY – Ela é fodona! Pois é, e na vida real Devery Jacobs é uma lésbica e membro das Primeiras Nações! Continuamos esse processo de escolher o elenco a partir do livro. Os fãs estão felizes, mas estamos também representando o máximo possível de pessoas, este é o elenco mais etnicamente diverso da TV e o melhor conjunto de atores da TV. Tomara que continue! Ainda não chegamos lá, mas estamos cobrindo bastante coisa. Espero que no futuro todo mundo seja representado, porque estamos retratando o mundo da maneira como ele é hoje.

Quando Salim e o Gênio apareceram naquela cena de sexo, foi a primeira vez que personagens muçulmanos do mesmo sexo apareceram tendo um relacionamento numa tela de TV. Não deveria ser a primeira vez, porque isso é uma coisa de todo dia, é a vida hoje em dia, então a ideia é retratar o mundo como ele realmente é, sabe, fazer com que todas as pessoas sejam vistas o máximo possível e mostrando a beleza de cada pessoa. Por isso, tenho muito orgulho da série, do que ela representa e do que estamos nos esforçando para fazer, e que isso tenha uma vida longa.

REINALDO – Já que você mencionou a religião, você pessoalmente é religioso ou não?

RICKY – Sim, eu acredito em alguma coisa.

Fui criado como católico, frequentei uma escola católica e tive freiras como professoras, o que foi uma ótima experiência, elas eram adoráveis e muito assustadoras às vezes. Mas agora eu tendo a lidar com a crença da maneira como a mostramos na série.

Eu dou graças antes de cada refeição, mas é mais como um “obrigado”, não é necessariamente para alguém ou algo, é mais como a minha maneira de dizer obrigado a quem quer que seja pela vida que estou levando, porque toda vez que a gente acorda, respira o ar e fica de pé, estou cercado por amigos e familiares lindo, eu amo meu trabalho em “American Gods”, sinto-me muito sortudo e abençoado nessa vida, e por isso sou grato. E sinto que devo dar graças por isso, que a gente não deveria simplesmente existir nesta vida.

Devíamos realmente vivê-la, e sinto que estou vivendo minha vida. Estou vivendo uma boa vida. E por isso sou muito grato, e muito agradecido, e me sinto muito abençoado. Assim, todo dia vou dar graças e sempre agradecer a quem quer que seja por tudo isso.

REINALDO – Legal. É uma bela atitude. Bom, você já falou um pouco sobre o tema dessa próxima pergunta, mas queria saber o que acha. Quando a série estreou, foi um pouco esquisito, mas também muito legal, ver as pessoas dizendo como ela era politicamente relevante, especialmente na Era Trump – considerando que no fundo é uma série sobre imigrantes. Esse tipo de relevância política é algo que é confortável pra você, é algo que traz uma dimensão interessante pro seu trabalho?

RICKY – Eu acho isso incrivelmente importante – e incrivelmente impressionante, porque Neil Gaiman escreveu isso em 2001. E agora virou a série mais politicamente relevante da TV!

Na pré-estreia da série em Los Angeles, ele me disse que daria todo o dinheiro, toda a riqueza, a fama, o reconhecimento, para que esse show continuasse a ser só uma fantasia. Mas infelizmente toda essa fantasia a respeito da qual ele escreveu agora é a vida real.

Todos esses temas – homofobia, racismo, misoginia, controle de armas – todos esses temas que há na série foram jogados por Trump nas primeiras páginas de todos os jornais ao fazer seus comentários ultrajantes para obter algum tipo de marca política.

Então, sinto que é nossa oportunidade e nossa responsabilidade fazer com que a conversa sobre esses temas continue acontecendo, porque minha sensação é que às vezes pessoas negativas vão continuar a dividir nações e oprimir outras pessoas quando o foco deveria ser a positividade, o estímulo para que as pessoas sejam as melhores versões de si mesmas.

E não segregar as pessoas, empurrá-las para longe por causa de sua raça, seu sexo, religião ou o país de onde vêm, isso não tem nada a ver, não passa de uma agenda pessoal. Do meu ponto de vista, o importante é criar um mundo positivo, uma pessoa de cada vez – se eu continuo sendo positivo, é possível que eu consiga transformar você numa pessoa positiva também.

Você não precisa acreditar no que eu acredito, isso não me incomoda. Nós dois podemos vir de países diferentes – é o nosso caso –, podemos ter raças diferentes, ter interesses sexuais diferentes, religiões e crenças diferentes, que seja. Eu julgo as pessoas com base no seguinte: se elas são pessoas boas ou más. E, quanto mais pessoas boas continuarem assim, e quanto mais pessoas más pudemos converter, melhor o mundo será, e vamos poder parar de dividir as pessoas o máximo possível, que é o que aquele homem está tentando fazer.

E não é uma boa estratégia. Os EUA são um grande país por causa de todos os sabores de diferentes culturas. O país inteiro é construído com base na imigração. A não ser que você seja das Primeiras Nações, um nativo americano, todos são imigrantes naquele país, tal como o próprio Trump e suas muitas esposas. Então, acho importante abraçar a riqueza das outras pessoas em vez de provocar o medo, que é um método de controle.

Essa é a minha opinião – mantenha essa positividade e mantenha a grandeza dos EUA do jeito que deveria ser, com diferentes culturas e religiões e fés e crenças, e todo mundo ascendendo como uma coisa só.

REINALDO – Última pergunta, prometo! Em termos de história – se é que você pode contar, se não for spoiler demais –, qual é o núcleo narrativo mais importante da temporada 2? É a House on The Rock/Casa na Pedra?

RICKY – Nós começamos onde tínhamos parado na temporada 1. Na primeira temporada, Laura foi contar a seu marido, Shadow, que ela foi morta pelo Sr. Wednesday, ou por Mad Sweeney por ordem do Sr. Wednesday. Então, quanto e como ela contou a Shadow?

Começamos então com os quatro dentro de um carro – Laura, Shadow, Wednesday e Sweeney –, e as tensões já ficam altas desde a cena 1 do episódio 1. E essa tensão continua a subir até culminar no maior final de temporada possível. É enorme. Os últimos dois episódios são épicos. Seguindo o ímpeto da temporada 1, a segunda temporada só vai ficando cada vez maior.

Continuamos seguindo a linha do tempo do livro, vamos nos encaminhando para a Casa na Pedra, temos alguns momentos incríveis nesse lugar e depois vamos para o salão funerário…

REINALDO – Com o Sr. Ibis…

RICKY – Isso, Shadow vai encontrar o Sr. Ibis e também Bast, que é conhecida dos fãs do livro…

REINALDO – Há uma cena bastante sexy com Bast…

RICKY – Foi uma cena sexy de filmar, não vou mentir, foi bem interessante, para dizer o mínimo. E vamos continuar nessa linha com cenas que não necessariamente estão no livro, então fãs do livro terão um material novo, sobre o qual não sabem nada, que poderão curtir. E isso vai nos levar finalmente até Lakeside.

Neil Gaiman disse, na ComicCon de Nova York, que não chegamos a Lakeside, e que essa seria a temporada 3, e isso está correto, a temporada 3 vai ser em Lakeside. Mas vamos seguir o livro até lá, e vai ser uma temporada ainda melhor que a primeira. Como eu disse, preste atenção no final da temporada, vai ser épico. Se a temporada 1 foi de apresentações, foi “olá”, a temporada 2 vai ser “adeus”.

REINALDO – E vocês conseguiram filmar dentro da verdadeira House on The Rock, ou foi mais no set?

RICKY – Filmamos praticamente tudo na House on the Rock. Mandaram a maioria dos atores até o Wisconsin e… É um lugar de verdade.

REINALDO – Eu sei, eu sei!

RICKY – As pessoas costumam comentar como a casa é maluca no livro. Neil Gaiman na verdade deu uma maneirada…

REINALDO – … em quão maluca a casa é…

RICKY – … em quão maluca a casa é, porque as pessoas não iam acreditar.

Depois de ter estado lá eu mesmo, agora entendo o que ele quis dizer, porque o lugar é MALUCO. A coisa chega a este ponto: nossa série é cheia de efeitos especiais, temos uma equipe maravilhosa de efeitos especiais. Mas com a mágica da House on the Rock, a gente não precisou de efeitos especiais, porque a mágica já é trazida pelo fato de essa casa ser tão incrível. É uma locação de fazer você pirar.

Chris Burn, que é nosso produtor-executivo e diretor, filmou a primeira e a última cena do episódio final, não precisou usar efeitos especiais. Só de filmar no carrossel já foi um negócio mágico. Só de filmar as diferentes salas você já pira e começa a pensar em como eles fizeram isso aqui, como carregaram isso aqui pra cá, por que esse negócio está no meio do nada – a casa é insana, é maluca, recomendo fortemente que as pessoas vão até lá conhecer, é bizarro.

Mas economizou muito dinheiro do orçamento, já que não precisamos de efeitos especiais por causa da insanidade da casa.

REINALDO – OK. Ótimo, maravilhoso, maravilhoso.

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