Na primeira parte deste artigo, foi discutida a idéia de uma definição
para Destino dentro das obras de Tolkien. Entretanto, nesta segunda
parte será tratada a correlação entre um conto tolkieniano encontrado
no Silmarillion e a trilogia Fronteiras do Universo de Phillip Pullman.
Antes de iniciar a correlação propriamente dita, é necessário fazer
Pullman e sua obra um pouco mais conhecidos dos leitores tolkienianos
que não apresentam muito conhecimento acerca de ambos. Para início,
Pullman é inglês e tornou-se conhecido internacionalmente com a
trilogia Fronteiras do Universo (A bússola de ouro; A faca sutil; A
luneta âmbar).
Em muitos países da Europa, esta trilogia foi uma verdadeira dor de
cabeça quando foi lançada e os religiosos disseram que o tratamento que
merecia era ser queimada na fogueira. A grande diferença entre esses
dois autores ingleses reside na religião: Tolkien era católico e
Pullman é ateu. Países como a Irlanda e o Brasil não têm grande
receptividade pelos livros por três fatores em essencial : Deus é um
simples anjo e uma marionete de outros da mesma espécie mais poderosos;
a Igreja é cruel e manipuladora; o Pecado Original era, na verdade, a
salvação da humanidade.
Falando simples assim pode parecer um livro de cunho político e
religioso do começo ao fim. Mas, na realidade, apresenta questões em
conflito muito semelhantes com aquelas apresentadas pelo Mestre
Tolkien, entre elas a questão do Destino.
Neste artigo será abordado o conto tolkieniano de Lúthien e Beren, que
corresponde a um caso no qual o destino de ambos os personagens foi
mudado pelos Valar. Ambos os amantes tiveram a existência interrompida
e o cantar carregado de sentimento da elfa, além de trazê-los à vida,
ainda possibilitou que se unissem sob a mesma raça. Enfim, além de
mudança do destino….. um favorzinho à parte.
Analisando agora Fronteiras do Universo, a personagem principal é Lyra.
A garota possui doze anos e recebe como presente um aletiômetro –
instrumento similar a uma bússola feita de ouro. Este presente
possibilita à garota que manipule o seu destino e o das pessoas que a
cercam. Todas as respostas às dúvidas da menina sobre o melhor caminho
a seguir ou a melhor posição a ser tomada podem ser lidas mexendo-se
nos ponteiros presentes no aletiômetro e interpretando-os.
No mundo criado por Pullman não há um Deus ou Poderes que ajudem seres
terrestres a cumprirem o seu Destino. Aliás, os anjos do mundo de Lyra
não se importam como Destino dos seres humanos – considerados
inferiores -, na verdade é mais uma visão pagã.
Assim como no caso do Ragnarok – destino certo para o fim do Mundo – da
mitologia nórdica, os seres humanos não podem e nem devem interferir
nas disputas entre os deuses e muito menos no Destino do Mundo.
Naturalmente há Deuses, sendo o principal Odin, mas eles não estão
interessados com o Destino dos homens. Personagens como Siegfried
chegam a dizer em Nibelungielied que os deuses deixam sinais escritos
no céu para que os homens tomem suas decisões de forma correta, mas que
cabe a cada indivíduo tomar sua decisão e então não haverá
interferência dos deuses. A única real presença divina para esta
mitologia é na morte dos guerreiros: as Walkirias vêm e os carregam
para Valhalla.
O mesmo lema de “Quem se importa com o Destino dos Homens?” é muito
mais antigo e remete ao berço da civilização ocidental: A Grécia
Antiga. Uma das histórias que mais chocam quando se pensa na ligação
deuses e destino é a do famoso Hércules. Embora o herói fosse filho do
todo-poderoso Zeus, em nenhum momento o pai interferiu para que seu
filho tivesse uma vida mais fácil do que aquela que o Oráculo de Delfos
disse ser a resposta. Depois que Hércules mata os seus três filhos,
Zeus não faz por modificar a decisão do Oráculo de que para o herói se
redimir ainda em vida precisava cumprir doze tarefas, consideradas
impossíveis de sobreviver.
Agora, já que estamos falando de destinos em histórias, por que não
falar de um dos casos mais famosos em nosso próprio mundo? Na
sexta-feira do dia 13 de outubro de 1307, centenas de Cavaleiros
Templários por toda a França foram presos simultaneamente por agentes
de Filipe, o Belo. Foram torturados para confessarem a heresia da
própria ordem religiosa, fato que provavelmente esteve na origem da
superstição de as sextas-feiras dia 13 serem dias azarados.
Filipe tomou as consideráveis riquezas dos Templários e acabou com o
seu sistema bancário monástico. Em 1314 o último grão-mestre, Jacques
de Molay, foi queimado na fogueira em Paris. De acordo com a lenda, de
dentro das chamas, este amaldiçoou o rei, o papa Clemente V e o
ministro Guilherme de Nogaret, afirmando que os iria convocar para o
tribunal de Deus em um ano. De fato, todos os três morreram dentro
deste prazo.
Depois de atravessar tantas épocas distintas, é importante lembrar que
apesar das fortes diferenças que o Cristianismo apresenta com as
crenças e religiões pagãs citadas, o deus cristão – Jesus Cristo –
tinha um destino a cumprir também. A Paixão de Cristo é um fato que,
mesmo aos ateus ou pagãos, chama a atenção. Os ateus diriam que foi uma
história inventada, mas mesmo assim a Igreja afinou a sua mente com uma
crença que atravessou séculos e seguiu pelos mais diferentes povos. Se
foi verdade, prova que todas as histórias desenvolvidas pelos
anteriores povos pagãos continha uma essência de verdade e que foi uma
preparação para aceitar o milagre divino.Tenho certeza que Tolkien
optaria pela segunda definição, por ser um católico fervoroso e crente
nos Mistérios de sua religião.
Bom, esta foi a minha segunda parte do artigo. A terceira parte falará sobre outro tema envolto com o destino: Profecias.