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A Volta dos Três Caçadores

Edhelwen acordou com os primeiros raios de sol da manhã. Saltou da cama, abriu a porta do seu quarto e depois de olhar para os longos corredores vazios, correu até o quarto de Emeliel. Ela ainda dormia. Aproximando-se devagar da cama, acariciou os longos cabelos escuros da irmã e disse, suavemente:
– Acorde, Emeliel! Temos muito a fazer hoje! É dia de festa! Vou acordar Eldarion. – e saiu em disparada.
Do lado de fora do palácio, o povo de Gondor trabalhava desde a aurora. As mulheres preparavam a comida e os enfeites, enquanto que os homens montavam mesas, erguiam estandartes e cantarolavam antigas canções da Guerra do Anel. Tudo para celebrar os cinqüenta anos da coroação do Rei Elessar.
 
Gondor jamais conhecera tamanha prosperidade como no início da Quarta Era. Aragorn Elessar era um rei muitíssimo amado e respeitado, bem como sua rainha Arwen Undómiel, em cujo rosto permanecia a beleza élfica e sabedoria de muitos anos. Os três filhos, Eldarion, Edhelwen e Emeliel eram belos, inteligentes e doces. No entanto, o mais velho, Eldarion, do alto de seus treze anos, já tentava se comportar como herdeiro do trono, e acompanhava seu pai em diversas tarefas do dia-a-dia. Já as moças, de dez e oito anos, ainda estavam entretidas com as brincadeiras de infância, mas sabiam agir como verdadeiras princesas quando necessário.
Depois de praticamente acordar a todos na residência real, Edhelwen finalmente correu até o aposento dos pais, onde abraçou o pai calorosamente.
– Com o entusiasmo destas crianças, certamente a festa será um grande sucesso. – disse Aragorn, rindo.
– É verdade. Há dias que elas não falam em outra coisa. E de fato é um motivo de grande orgulho. – disse Arwen, beijando a testa do marido.
– Encontrei Thibolt e os outros guardas no corredor, papai. Pediram para avisar que está tudo pronto, e que os convidados começaram a chegar. – disse Edhelwen, ainda saltitando pelo quarto.
– Ótimo, pequena informante. – disse seu pai. – Então vá e se apronte com seus irmãos. Ao meio-dia temos que estar no terraço principal.
Quando a família real surgiu, imponente, elegante e alegre, no terraço, foi saudada com grande alegria pela população e pelos convidados de honra do rei, que estavam em uma ala separada. Entre eles, o elfo Legolas e Gimli, o anão, seus grandes amigos dos tempos da Comitiva do Anel, que eram visita sempre constante e muito bem-vinda na Cidade. Lá estavam também o Rei Éomer, de Rohan, com sua esposa Lothíriel e o pai dela, o príncipe Imrahil de Dol Amroth. Os filhos de Elrond, Elladan e Elrohir, também estavam presentes, em seus últimos anos de Terra-média. Algumas ausências foram notadas, mas foram totalmente justificadas. O Regente de Ithilien, Faramir, não pôde comparecer, pois sua esposa Éowyn de Rohan, estava no último estágio da gravidez, e seria arriscado tirá-la de casa. Já os hobbits e também companheiros do rei, Meriadoc, Peregrin e Samwise, ficaram retidos no Condado para ajudar vários hobbits desabrigados após uma grande tempestade. Mas todos mandaram vários presentes e cartas em homenagem a Aragorn e sua família.
O dia inteiro foi passado em intensa alegria, com fartura, música e dança, e com o cair da noite, os amigos de Aragorn foram convidados a passar alguns dias no palácio. Foi servida uma pequena ceia, onde todos conversaram alegremente. Legolas contou que passara uma temporada em Eryn Lasgalen, com seu pai Thranduil. Gimli estava tentando livrar Moria dos orcs que haviam restado lá. Mas Aragorn, sempre perspicaz e atento às emoções alheias, logo sentou-se ao lado de Éomer.
-Meu amigo, sinto que embora tenha tentado disfarçar, há algo que o aflige. Vejo em seus olhos e seu rosto, ainda que você tente suavizá-lo com sorrisos.
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– Você enxerga como um verdadeiro homem de Númenor, Aragorn. – disse Éomer, com um leve sorriso. – Não achei que conseguiria esconder de você. No entanto, hoje é dia de festa, e me regozijo com sua conquista e sua felicidade; não pretendo estragá-la com meus problemas. Hoje comemoramos; amanhã conversamos.
– Assim seja! – disse Aragorn, e ordenou que os músicos recomeçassem a tocar.
No dia seguinte, após o desjejum, Aragorn convocou Éomer, Legolas, Gimli e um dos capitães da guarda, Thibolt, para uma reunião no salão do trono. Eldarion implorou ao pai para participar, e foi atendido. Arwen, Lothíriel e as jovens princesas passariam a manhã juntas.
– Rohan e Gondor estão unidas por laços de amizade que não podem ser rompidos. – começou Aragorn – E quando Rohan pede ajuda, Gondor sempre estará a seu serviço. Diga agora, Éomer, o que tanto o perturba.
Todos se voltaram para Éomer, que com a expressão abatida, iniciou seu relato.
– Há algumas semanas, alguns de nossos cavalos desapareceram e foram encontrados mortos perto de um lago que fica a duas milhas de Meduseld. Restaram apenas seus ossos. Nós os reconhecemos pelos arreios, pois cada um tem o seu diferente. Achamos que fosse algum fato isolado. No entanto, há dois dias atrás, houve um novo episódio com sete excelentes cavalos; e dessa vez – olhando para Legolas e Aragorn – Arod e Hasufel estavam entre eles.
– Oh, não! Meu velho amigo Arod! Isso é terrível! Um cavalo magnífico! – disse Legolas, consternado. Gimli, que havia montado Arod junto com Legolas, também se mostrou muito aborrecido, embora anões não sejam grandes apreciadores de cavalos.
– Pobre Hasufel. Não poderia ter desejado melhor companheiro quando você nos ofertou a montaria naquela época, Éomer. Cavalos notáveis. Isto é de fato lamentável! E vocês não descobriram a causa da morte? – perguntou Aragorn, nitidamente preocupado.
– Infelizmente não. – respondeu Éomer. – Só encontramos os ossos, e reconhecemos os cavalos pelos arreios. Não há sinais de luta nos locais em que os achamos.
– E o que fazem os cavalos perto do lago? – perguntou Gimli.
– Nós os soltamos algumas vezes para que tomem um pouco de ar, e pastem na grama próxima ao lago. Nestes tempos de tranqüilidade, eles ficam muito tempo nos estábulos, e isso não é bom para eles. Mas agora com estas mortes, voltamos a prendê-los. Mas o problema não é só este. Ontem, um de meus guardas, Féomine, cujo cavalo, Tergo, também foi atacado, disse que iria até o local para ver se descobria alguma coisa. Eu o desaconselhei, mas ele foi à revelia. Algumas horas mais tarde, como ele não voltava, enviei alguns homens até as proximidades. E lá estavam apenas os ossos de Féomine, a alguns metros do lago. – disse Éomer.
Todos soltaram exclamações de horror. Eldarion, esquecendo a pretensão de futuro herdeiro, agarrou involuntariamente o braço do pai.
– Isto está tomando proporções inaceitáveis. – disse Aragorn, severo. – Pelo que pude discernir, há algo em torno do lago que está realizando estes ataques.
Podem ser orcs, podem ser outros animais. De qualquer maneira, isso tem que ser resolvido. Thibolt! Convoque dez dos meus melhores homens. Parto para Edoras esta tarde.
– Não vim até aqui relatar meus problemas para que você pessoalmente os resolva! – exclamou Éomer, levantando-se da cadeira. – Envie alguns homens para investigar, e já será suficiente!
– Algo me diz que este problema não é tão fácil de ser solucionado. Eu sinto que há algo estranho nessa história. E penso que cabe a mim ajudar a resolvê-la. Gimli e Legolas, ficarão aqui ou retornarão à suas casas? – perguntou Aragorn aos amigos.
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– Nem uma coisa nem outra. – disse Legolas. – Eu o acompanharei, pois quero saber o que fizeram com estes pobres animais e com o guarda. É o mínimo que posso fazer pela memória do pobre Arod.
– Eu também irei – disse Gimli, cofiando a barba. – Pois há tempos que sinto falta de um pouco de ação, e esta é uma boa oportunidade de desenferrujar meu machado. E também não aprecio crueldade com nenhum ser vivo.
– Espero que não precisemos usar muito seu machado, Gimli. – disse Aragorn. Vamos nos preparar. Os Três Caçadores voltam à ativa! – Legolas e Gimli sorriram para ele, velhas lembranças cruzando suas mentes.
– Posso ir junto, papai? Já sei carregar uma arma! Deixe que eu vá com vocês, por favor! – disse Eldarion, olhando para o pai com olhos de súplica.
– Não, Eldarion. Você é muito novo ainda. E além disso, quem cuidará de sua mãe e irmãs enquanto eu estiver fora? Você será importante aqui.
– Mas papai! Jamais estive em Rohan. E você me prometeu que me levaria para montar os grandes cavalos. Quero conhecer Rohan, por favor!
Aragorn hesitou, mas por fim cedeu à insistência do filho, que saiu da sala saltitante.
Éomer ainda tentou dissuadir Aragorn da idéia de partir pessoalmente para Edoras, pois se sentia mal de privar Gondor de seu rei em tal momento de júbilo. Mas Aragorn, antes de ir a seus aposentos, disse ao amigo:
– Durante a Guerra do Anel, quando Pippin e Merry foram aprisionados pelos orcs, Pippin soltou seu broche de Lórien para que nos servisse de pista, e me contou mais tarde como fora difícil se livrar dele. E eu disse a ele que aquele que, numa necessidade, não consegue jogar fora um tesouro, está acorrentado. Pois é a mesma situação. Se eu, como rei, não posso sair de meu palácio e do meu conforto para ajudar um irmão, num momento de necessidade, que espécie de rei sou eu? Estaria acorrentado também. Não, Éomer; terá que se contentar comigo nesta aventura.
Éomer não conseguiu dizer mais nada.

Após o almoço, Aragorn, vestindo suas surradas roupas de viagem e portando Andúril, despediu-se dos filhos e de Arwen, que lhe pediu cautela e notícias e um rápido retorno. Edhelwen e Emeliel ficaram no terraço com Arwen durante muito tempo, observando a pequena tropa que partia, liderada por Aragorn. Eldarion, que para sua idade já cavalgava muito bem, andava orgulhoso ao lado do pai.
A viagem até Edoras fluiu sem nenhum contratempo, e em poucos dias os cavaleiros avistaram os reflexos dourados de Meduseld. Os guardas ficaram surpresos ao ver que Aragorn, Legolas e Gimli acompanhavam Éomer, e logo prepararam os aposentos para convidados tão ilustres.
Na manhã seguinte à chegada, Éomer levou os amigos e alguns soldados de ambos os reinos para inspecionar a região onde os cavalos haviam sido atacados. A contragosto, Eldarion ficou no palácio em companhia do filho de Éomer, Elfwine, enquanto seus pais e os outros desciam a colina onde Meduseld estava situado. Lá embaixo havia um grande campo verde e, pouco mais adiante, um bosque. Alguns metros antes das primeiras árvores, havia um pequeno lago de águas escuras e margens barrentas.
Aragorn deitou-se no chão para ver se identificava algum som, para espanto dos guardas, que murmuravam atônitos. Aragorn levantou-se e sorriu para os guardas. Legolas disse, rindo bastante:
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– Não é comum que os reis de Gondor deitem no chão para farejar pistas, mestre Elessar. Mas enquanto eles vêem seu rei fazer o trabalho sujo, eu vejo apenas Passolargo de volta.
– E você sempre viu melhor que os outros, meu bom Legolas. Não tenho medo da terra. Mas não sinto nada de estranho aqui no piso; pensei que ainda pudesse haver alguns uruk-hai por aqui, mas não há sinais das pegadas pesadas e imundas deles. Porém, vejam aqui: há marcas de patas de cavalos, sendo arrastadas até o lago.
– Este lago jamais teve este tamanho. Parece que aumentou de ontem para hoje! Isto é realmente estranho! – disse Éomer, observando o lago com mais atenção.
Enquanto isto, Gimli havia entrado no bosque com seu machado, para ver se encontrava algo, e retornou anunciando que tudo parecia normal.
Acho que deveríamos montar guarda durante a noite, Senhores. – disse Thibolt a Aragorn e Éomer. Talvez, se acamparmos aqui, poderemos observar alguma coisa.
– É uma boa idéia, Thibolt. Fiquem com a corneta. Se virem algo de estranho durante a noite, toquem-na. Viremos correndo. – disse Aragorn.
– Não voltaremos ao palácio. Creio que devemos ficar por perto no caso de qualquer eventualidade. Estão vendo aquele casebre, há cerca de duzentos metros daqui? Gimli, Legolas Aragorn e eu dormiremos ali, para não nos afastarmos muito. – disse Éomer.
Os dez soldados trazidos por Aragorn e mais alguns de Éomer montaram algumas barracas próximas ao lago, mas numa distância segura, e se revezaram na guarda. Aragorn e seus companheiros já haviam se retirado para o casebre. O céu estava bem escuro, sem estrelas, e já era alta noite. Thibolt, que fazia a guarda, levantou-se com seu cachimbo e caminhou alguns metros, sem tirar os olhos do lago. Era uma noite com brisa, e as águas do lago se moviam suavemente. Thibolt deu a última tragada no cachimbo, e virou-se para jogá-lo de volta em sua mochila. Ao olhar para frente novamente, ficou paralisado de horror. Diante de seus olhos, um pequeno vulto escuro parecia engatinhar no solo, muito próximo das margens do lago. Antes que Thibolt pudesse enxergar melhor ou gritar, uma sombra negra e alta surgiu das águas do lago. Com velocidade incrível, agarrou o vulto, que tentou se debater e gritar, e tragou-o para dentro do lago, desaparecendo em seguida.
Aragorn e seus amigos saltaram da cama de palha como gatos, ao ouvir os sons trêmulos da corneta de Gondor. Todos saíram correndo com armas em punho, em direção ao lago.
Ao chagarem no local, aproximaram-se de Thibolt, que pálido e atônito, estava cercado pelos soldados que tentavam acalmá-lo. Aragorn aproximou-se gentilmente e pediu a ele que contasse o que viu.
– Um vulto, Senhor! Parecia ser de uma criança engatinhando, não pude ver muito bem. E a sombra em forma de braço! Parecia um braço gigante e escuro, que saiu do lago e o agarrou! Não pude fazer nada, foi tão rápido! Fiquei paralisado. Pobre criatura! – disse Thibolt, trêmulo.
– Não creio que seja recomendável ir até lá agora. Teremos que esperar, e ver se a ossada apar
ece amanhã. Se eu tivesse ficado aqui, talvez tivesse visto exatamente o que ocorreu. Mas quem será que veio a essa hora gazetear em um lugar como esse? A população não está informada a respeito do lago? – disse Legolas.
– Sim, todos estão proibidos de vir até aqui. – disse Éomer. Não sei quem pode ter sido tolo o suficiente de se arriscar assim.
Ficaram em silêncio por alguns minutos, quando sons de passos apressados fizeram com que notassem um soldado que corria na direção do acampamento, vindo de Meduseld. Éomer reconheceu um de seus guardas pessoais.
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– Grimbel! O que faz aqui? Não era um dos soldados convocados! – disse Éomer, surpreso.
– Eu sei, Senhor, mas é que… – olhando para Aragorn com hesitação, continuou. – O jovem Eldarion desapareceu.
Aragorn, totalmente perplexo, olhou para o soldado e empalideceu. Éomer pôs a mão sobre a boca. Legolas e Gimli se entrolharam, com uma expressão de pura consternação. Os soldados soltaram exclamações de terror. Thibolt quase perdeu os sentidos.
Éomer foi o primeiro a conseguir dizer algo:
– Como, desapareceu? Ele estava com meu filho! E onde está Elfwine?
– Seu filho está bem, Senhor. Ele me contou que ambos concordaram em dormir cedo, e cada um foi para seu quarto. Porém, Elfwine acordou ouvindo passos nos corredores, e pensou que fosse um dos soldados. Mas não conseguiu mais dormir, e ao entrar no quarto de Eldarion, viu que ele não estava lá! Ele também está procurando pelo jovem. – respondeu Grimbel.
Aragorn, que até aquele momento não conseguira tirar os olhos do soldado, só conseguiu murmurar: – Como é possível? Eu o mandei ficar lá. Ele não pode ter desobedecido. Ele não pode ter vindo até aqui. Teria que ter nos seguido. Não pode ser. Ele está lá, com certeza. Não, não pode ser ele que… Thibolt, o vulto… não era meu filho, era? Diga que não era meu filho!
Éomer pôs a mão sobre o ombro de Aragorn, em cujos olhos cinzentos, sempre austeros e seguros, podia se ler, pela primeira vez, o mais absoluto pavor e desespero. Thibolt levantou-se. Olhou com profunda tristeza para seu rei, e disse apenas:
– Não posso jurar, Senhor.
Aragorn caiu sobre os joelhos, com as mãos no rosto, e soltou um grito. E um silêncio mortal se abateu sobre todos.

Aragorn permanecia no chão, imóvel, cercado pelos soldados e Gimli, que se sentara ao lado do companheiro. Legolas andava de um lado para outro. Éomer enviou todos seus guardas de volta ao palácio, e ordenou uma busca por toda Edoras.
– Como poderei contar a Arwen? – murmurou finalmente Aragorn. – Como poderei dizer a ela que nosso filho me seguiu e está… – não conseguiu terminar a frase.
– Não perca as esperanças, meu amigo! – disse Legolas. – O próprio Thibolt disse que não tinha certeza de que era uma pessoa. Pode ter sido algum bicho. Amanhã certamente teremos uma resposta.
– Pode ser que ele tenha ido para outro lugar, e esteja escondido. Mas sob meu teto! Não sei o que lhe dizer, Aragorn. Estou mortificado. – disse Éomer, lívido.
– Não é sua culpa, Éomer. Sempre foi um menino muito ativo e voluntarioso. – disse Aragorn, com dificuldade.
– Não prefere voltar ao palácio? – perguntou Gimli.
– Não. – disse Aragorn. – Se os ossos que voltarão deste lago são os do meu filho eu quero… eu preciso saber. – e sentou-se numa pedra, com o rosto entre as mãos. Todos olhavam para Aragorn com pena e pesar. Éomer pensava em como se justificaria para Arwen. Gimli batia seu machado no chão, tentando não pensar nas lágrimas das pequenas Edhelwen e Emeliel.
Ficaram todos imersos nestes negros pensamentos quando, minutos mais tarde, um leve som de águas se movendo fez Aragorn se virar. Legolas acompanhou seu olhar, e viu estupefato que o pequeno vulto foi suavemente atirado para fora do lago, totalmente inerte. Aragorn quis correr, mas Legolas o segurou:
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– Calma! Se você for até lá agora, pode ter o mesmo fim que esses ossos. Espere o sol nascer, e tentaremos afastar o corpo do lago. Ou melhor, tenho uma idéia. Amarrem a corda em minha cintura.
– O que vai fazer? – perguntou Gimli.
– Vou até lá. Sou mais rápido e silencioso que os homens. Chegarei lá e olharei os ossos, para ver se são humanos. – disse Legolas, olhando para Aragorn com pena. – Se algo acontecer no lago, vocês me puxam enquanto corro de volta.
Sem fazer nenhum ruído, Legolas começou a caminhada até o lago. À medida que ia se aproximando da ossada que jazia próxima das margens, o coração de Aragorn ficava mais pesado. Alguns instantes depois de fitar os ossos com seu olhar agudo, Legolas retornou. Tinha um sorriso nos lábios.
– Jamais pensei que fosse ficar tão feliz ao ver os ossos de uma raposa morta.
Os soldados deram um grito de alegria. Gimli e Éomer lançaram suas armas ao alto. As pernas de Thibolt falharam e ele desabou no chão, sem se importar com as gozações dos colegas, que não sabiam como ele podia confundir uma pessoa com uma raposa. Aragorn, com o coração transbordando de alívio, tinha lágrimas nos olhos, e não conseguia falar. Ficou alguns minutos em silêncio, até conseguir dizer:
– É um alento, uma felicidade que jamais pensei que poderia sentir. Mas ainda assim, não estou tranqüilo. Pois não sei onde meu filho está.
– Pelo menos não está na barriga do monstro do lago, Aragorn. E ainda precisamos descobrir do que isso se trata. Será algum truque que Sauron deixou para trás? – disse Gimli.
– Será possível que, apesar de derrotado, ele ainda consiga nos fazer tanto mal? – perguntou Éomer, cerrando os dentes.
– Ainda que Sauron tenha sido vencido, várias criaturas que ele criou, e anteriores a ele, permanecem na Terra-média. Não apenas orcs desorientados, mas seres malignos que têm seus próprios desígnios, e precisam se alimentar. Meu palpite é que esta criatura não é originária deste lago, mas que veio para cá e o tomou como lar. E precisa se alimentar. Os cavalos devem ter tomado água, e foram presas fáceis.
– Ainda assim, deve ser uma criatura forte, pois cavalos não são lagartos. – disse Gimli. – Será que era algum parente daquele Vigia das Águas que encontramos em Moria? Será que a sombra que viu era de um tentáculo, Thibolt?
– A sombra que vi sair do lago era como um grande braço escuro. Podia até ser um tentáculo, mas era muito grosso. – disse Thibolt.
– Eis o que faremos: vamos voltar a Meduseld e comer um pouco. Vocês soldados ficarão aqui, para ver se algo acontece. Não se aproximem do lago, e se houver algum perigo, toquem a corneta. – disse Éomer.
Ao voltar ao palácio, os soldados informaram que, depois de horas de busca por toda Edoras, ainda não havia sinal de Eldarion. Aragorn, tenso e preocupado, comeu algo rapidamente e, acompanhado por seus amigos e Elfwine, resolveu fazer uma busca por todos os aposentos de Meduseld. Eldarion n&ati
lde;o estava em nenhum quarto. Cansado, Aragorn desabou sobre uma poltrona. Gimli disse:
– Não sabia que Meduseld tinha tantos aposentos, Éomer! De fora não temos esta impressão.
– Realmente, – disse Éomer – há muitos quartos internos, cujas portas e janelas não se vêem de fora, e… – parou, com os olhos arregalados. Olhou para Aragorn com um sorriso triunfante no rosto. – Já sei onde ele pode estar! Na antiga biblioteca! Como não me lembrei dela!
E saiu em disparada, seguido por Aragorn, elétrico. Entraram na biblioteca principal, na qual já tinham estado. Porém Éomer retirou o vaso que ficava diante de uma das paredes, revelando uma pequena porta.
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– Se Eldarion estiver aqui, ele é realmente muito esperto. – disse Éomer. – Esta biblioteca secreta foi construída há muitos anos, e nela estão livros raros e importantes da história da Terra-média. Ela fica um pouco abaixo do solo.
– Então vamos! – disse Aragorn, abrindo a porta e descendo uma pequena escada de pedra.
No fim da escada, podia-se ver um pequeno salão, com as quatro paredes forradas de livros e mapas. Havia também uma pequena mesa de centro, e sobre ela estava um grande livro aberto com figuras de vários animais, e um pequeno castiçal com uma vela apagada. E dormindo com a cabeça entre os braços, encolhido no chão, cercado por uma grande pilha de livros, estava Eldarion.
Ao ouvir os passos, ele se mexeu, abriu os olhos, e viu Gimli, Legolas, Éomer e Aragorn em pé. Levantou-se de um salto, e falou, de um fôlego só:
– Papai! Senhor Éomer! Lamento muito! Não devia estar aqui, não é? Mas é que não conseguia dormir, e estava tentando achar alguma informação que pudesse ajudá-los a descobrir o que há no lago. Então fui até a biblioteca, e notei esta porta! Entrei, e vi tantos livros! Devo ter perdido a noção da hora, e cochilei. Lamento se o preocupei, papai. Prometo nunca mais desobedecer. Se estraguei alguma coisa, Senhor Éomer, prometo arrumar tudo. E aliás, creio que descobri o que há dentro do lago. Já pensaram em serpentes? Porque estava lendo neste livro que havia algumas serpentes gigantes que viviam sob a terra. É bem possível que seja uma cobra grande! Mas por que está me olhando assim, papai? Está zangado comigo por ter vindo até aqui? Não vai me perdoar?
Aragorn, com os olhos cheios de lágrimas, fitava com ternura aquele pequeno e amado rosto que até alguns minutos antes achava ter perdido para sempre, e abraçou-o com toda a força. Eldarion, surpreso e comovido, ficou envolvido pelos braços do pai por longos minutos.
– Filho querido! – disse Aragorn, segurando-o pelos ombros. Claro que o perdôo. Ainda mais porque deu uma luz para esse caso misterioso! Uma serpente gigante da Terra Parda!
– Serpente gigante? Não sabia que havia serpentes assim na Terra-média! – disse Gimli, surpreso.
– Existem sim. – disse Aragorn. Elas vivem sob a terra, e são raras. Mas a idéia faz sentido, e corresponde com a descrição de Thibolt.
– Eldarion puxou ao pai – disse Éomer, sorrindo para o menino. – Quem diria que depois da preocupação que nos fez passar, nos daria a resposta para o enigma?
– O enigma foi solucionado, mas não o problema. Esta serpente tem que ser morta. E isso não será fácil. Temos que agir juntos, e precisamos de uma isca. Quanto a você, filho, vá procurar Elfwine, e peça desculpas. Ele estava muito aflito atrás de você. E não suma mais!
– Pode deixar, papai. Estou realmente envergonhado. – disse Eldarion, e saiu em direção ao quarto de Elfwine.
Naquela mesma tarde, Aragorn e Éomer elaboraram um plano para atrair a serpente e atacá-la.
– Colocaremos um porco morto nas proximidades do lago, e esperaremos a cobra atacar. Quando ela o fizer, deveremos ser rápidos. Legolas, para isso contamos com você. – disse Éomer.
– Farei o possível. – disse Legolas, acariciando uma de suas flechas. – Mas preciso de cobertura.
– Você a terá. Ficarei a postos. – disse Gimli.
– Pois então vamos. Precisamos contar o plano aos soldados.
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Ao entardecer, o grupo se reuniu no acampamento, para colocar o plano em prática. Enquanto Thibolt e mais dois soldados levavam o porco para perto do lago, Legolas procurava uma posição para melhor acertar sua flecha. Gimli ficou ao lado oposto de Legolas, cercando o lago. Aragorn e Éomer ficaram atrás de um arbusto, com as espadas em punho. Thibolt e os outros estavam quase no ponto em que deixariam o porco no chão. Porém, o que se seguiu foi um grande caos. Pressentindo a presença de estranhos, a grande serpente se ergueu do lago em fúria selvagem. Possuía uma cabeça oval, cor de lodo, com escamas pontudas e olhos amarelos. O corpo viscoso e escorregadio era de um verde escuro e brilhante. A boca se abriu para mostrar as presas úmidas de saliva e veneno. Com um movimento rápido, lançou-se contra os soldados, que se atiraram ao chão. A cobra, então, engoliu o porco e voltou-se para atacar Derlim, um dos soldados, que estava inconsciente.
Legolas então atirou sua primeira flecha, que atingiu a cobra de raspão. Isso distraiu-a por um momento, e Thibolt conseguiu tirar Derlim de perto dela. Gimli tentou se aproximar do lago para atingi-la com o machado, mas a cobra golpeou-o antes, e ele caiu no chão, inerte.
– Gimli! – gritou Aragorn, que a esta altura já estava nas margens do lago, brandindo Andúril. – Éomer! Tire-o de lá!
Éomer seguiu o comando e correu até o anão. A cobra seguiu-o com os olhos cheios de malícia, e preparou-se para dar o bote. Mas Aragorn foi mais rápido. Com um golpe forte, conseguiu fazer um corte na cabeça da cobra, que se contorceu de dor. Legolas gritou: – Por Arod, Hasufel e Féomine! – e atirou sucessivas flechas, que atingiram a cobra e ficaram espetadas nela. Os soldados que haviam ficado no acampamento surgiram aos gritos, com as espadas e lanças na mão, e após sucessivos golpes, a cobra parecia que não poderia mais impor resistência. Aragorn então brandiu Andúril e gritou: – Por Eldarion! – e arrancou a cabeça da cobra cambaleante.

Na manhã seguinte, Aragorn, Eldarion e seus soldados montaram seus cavalos para retornar a Gondor. Legolas e Gimli, que estava enfaixado devido ao golpe que levara, também iriam junto, pois ficariam mais algumas semanas na companhia do rei. Éomer presenteou Legolas e Gimli com cintos de ouro, e a Aragorn, uma faca banhada em ouro e prata, antiguidade dos tempos de Eorl, o Jovem. Também deu a Aragorn e Legolas os arreios de Hasufel e Arod, como lembrança dos belos cavalos que um dia montaram. Elfwine deu de presente a Eldarion o livro sobre animais da Terra-média. Com palavras calorosas de agradecimento e eterna amizade, o rei e sua comitiva partiram.
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Aragorn chegou a Gondor saudado pelo povo, que teve sua admiração aumentada pelo gesto de amizade e coragem demonstrado, em um momento que deveria ser apenas de festa, e não de trabalho. Sua família, ciente e orgulhosa disso, recebeu-o com emoção e carinho. Arwen abraçou seu marido e fi
lho calorosamente. Edhelwen se atirou nos braços do pai. Emeliel, que não estava entendendo toda a comoção que a volta de seu pai causara, beijou-o e perguntou porque Andúril estava manchada. Eldarion recebeu com embaraço os beijos efusivos das irmãs. Minutos mais tarde, Edhelwen se aproximou de Aragorn e disse:
– Thibolt me contou o que aconteceu em Rohan, papai. Ora, essa! Eldarion some e ainda volta com presentes e saudações, como se nada tivesse acontecido? Acho que vou me esconder na biblioteca e procurar coisas sobre olifantes. Quem sabe não ganho um de presente?
– Se eu lhe der um olifante, Edhelwen, ele dormirá na sua cama, e você ficará nos estábulos, está bom assim? – disse Aragorn. Edhelwen fez uma careta de desaprovação.
Rindo bastante, Aragorn beijou a mão da filha, pôs o outro braço em torno de Eldarion e foi caminhando em direção ao palácio, com Arwen e Emeliel logo atrás.

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