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Ciência da Terra-média: sobre olifantes e dinossauros

OK, ele pode ter sido cinza como um camundongo e grande como uma casa (como diz a musiquinha de Sam no original inglês do SdA), mas foi criado de forma realista? Em outras palavras, o olifante (ou mûmak) tolkieniano é um paquiderme que poderia ter existido no mundo real? A resposta é, pra variar: depende. Depende de alguns conceitos básicos de física e biologia e do tamanho que a gente escolhe para o nosso olifante.

 

Começando do começo, há uma série de fatores limitantes para o tamanho de um animal, em especial se ele é um mamífero, como se supõe que o nosso olifante era, já que ele não passa de um elefante "sarado", por assim dizer. Grosso modo, pode-se dizer que o mais importante é a relação espacial entre as tripas e a pele de determinado bicho. Para colocar de forma menos tosca: entre a superfície externa e o volume interno do corpo do animal.

O que acontece é geometricamente inescapável: quando maior um bicho fica, seu volume interno fica proporcionalmente mais avantajado quando em comparação com a superfície de sua pele. Por que isso é importante? Ora, porque todo o metabolismo de um ser vivo — os processos básicos que envolvem respiração, nutrição e, erm, excreção — dependem da interação entre volume interno e superfície externa. O organismo acha truques pra controlar os problemas oriundos de quase tudo isso em animais grandes, mas há uma pedra de tropeço inescapável: o calor.

Olifantes superaquecidos
Quanto maior um animal e, portanto, maior seu volume em relação à superfície de sua pele (principalmente no caso de bichos terrestres), fica cada vez mais séria a dificuldade de se livrar do calor produzido pelo metabolismo dele. Mamíferos, como todos sabemos, são bichos de sangue quente, ou seja, mantêm sua temperatura interna constante por meio da autoprodução de calor — o que os coloca numa posição especialmente delicada quando se trata de exportar o excesso de temperatura para o ambiente que os circunda.

Coincidência ou não, nenhum mamífero terrestre jamais sequer chegou perto do tamanhão dos grandes dinossauros. (Os únicos que se comparam são as baleias, que vivem em ambiente aquático, onde é muito mais fácil dispersar calor.) E aí é que voltamos aos olifantes.

O problema é que o próprio Tolkien não nos dá nenhuma indicação clara sobre o tamanhão absoluto das criaturas de Harad. Só diz que os elefantes atuais ficariam no chinelo perto de um mûmak. Bom, isso pelo menos sugere que o maior mamífero terrestre vivo, o elefante africano (Loxodonta africana), com suas dez toneladas, não serve. Curiosamente, sabemos que uma das muitas espécies de mamute, o Mammuthus trogontherii (concepção artística aqui), pode ter alcançado mais de 15 toneladas, mais ou menos o mesmo tamanho do também extinto Indricotherium transouralicum (pode ser visto aqui), um rinoceronte sem chifre que mais parece uma supergirafa.

Ao que tudo indica, esse é o tamanho máximo que um mamífero terrestre pode alcançar sem simplesmente derreter de dentro pra fora. Se os olifantes tinham essa ordem de grandeza, OK — o Professor não falou bobagem. Agora, Peter Jackson que nos desculpe, uma vez que seus olifantes são muito legais, mas ao que tudo indica ele forçou a barra.

Afinal, na versão cinematográfica de "O Retorno do Rei", os bicharocos têm a mesma dimensão de grandes dinos saurópodes (os quadrúpedes pescoçudos, como os diplodocos). Elefantes desse tamanho teriam de remodelar toda a sua biologia — perdendo o sangue quente, provavelmente, além de desenvolver ossos pneumáticos para aliviar o peso do esqueleto e superorelhas pra dispersar o calor — caso quisessem sobreviver minimamente bem.

Portanto, o nosso veredicto é: olifantes do livro? Talvez. Os do cinema? De jeito maneira. E na próxima edição da série "Ciência da Terra-média": imortalidade élfica!

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