O que pouca gente sabe é que essa mudança se deve ao texto original, da primeira edição de “O Hobbit”, no qual Gollum, incrivelmente, de fato estava disposto A CEDER O ANEL (oops! de novo, no bom sentido!) a Bilbo. Assim mesmo, na boa, sem luta.
Após escrever “O Senhor dos Anéis”, quando o Anel se tornou muito mais perigoso e sinistro do que a obra original sugeria, Tolkien se viu compelido a modificar o capítulo em que Bilbo confronta Gollum, numa segunda edição de “O Hobbit”. John Rateliff, que teve acesso ao manuscrito original da aventura de Bilbo, mostra em detalhes como a imagem e o comportamento de Sméagol (que não tinha esse nome nessa época, claro) era menos pesada.
Isso não quer dizer que Gollum nunca pretendeu devorar o pobre Bilbo. Os desejos canibais da criatura estão lá desde o princípio, e ele fica salivando só de pensar na carne do hobbit. Mas, quando o jogo de adivinhas termina, Gollum se põe diligentemente a cumprir sua promessa – no caso, dar “um presente” para Bilbo. O presente é nada menos que o Anel. “Devemos dá-lo, precioso; sim, devemos, devemos pegá-lo, precioso, e dar à coisa [Bilbo] o presente que prometemos.”
Presente de aniversário
Eis como Tolkien explica a situação toda:
“Gollum tinha um anel, um anel maravilhoso e muito bonito, um anel que ele tinha ganhado de presente de aniversário eras e eras atrás, em dias antigos quando tais anéis eram menos incomuns.”
Tal como na versão da história que conhecemos hoje, Bilbo, porém, já tinha pegado o anel do chão. Gollum fica nervoso ao descobrir que o objeto sumiu, mas a impressão que fica é que ele está irritado principalmente por não poder cumprir sua palavra. “Não sei quantas vezes Gollum pediu desculpas a Bilbo. E ele ofereceu peixe fresco para comer no lugar do anel (Bilbo estremeceu só de pensar nisso, mas disse não, obrigado, educadamente.”
Esperto, o hobbit disse que poderia substituir o anel pela ajuda de Gollum em sair do fundo das montanhas. E, acredite ou não, a criatura leva Bilbo até as proximidades do portão. Os dois se despedem relativamente na boa. Afinal, “o Gollum [assim mesmo, com artigo definido] tinha aprendido muito tempo atrás a nunca trapacear no jogo de adivinhas”.
É incrível como, no fim das contas, não havia nada de inevitável na história que tornar-se-ia mundialmente famosa.