Autor: Reinaldo José Lopes

  • Descubra os Sete Nomes de Gondolin!

    As breves menções em O Silmarillion que atribuem a
    Gondolin o título de “Cidade dos Sete Nomes” costumam deixar os
    leitores curiosos a respeito das denominações da cidade de Turgon. O
    único lugar em que esses nomes são citados é a narrativa “A Queda de
    Gondolin”, publicada em The Book of Lost Tales II. Vale a pena conferir
    o trecho:

     

     
    “Então disse Tuor: ‘Quais são esses nomes?’. E o líder da Guarda
    respondeu: ‘É dito e é cantado: Gondobar sou chamada e Gondothlimbar,
    Cidade de Pedra e Cidade dos que Habitam na Pedra; Gondolin, a Pedra da
    Canção, e Gwarestrin sou nomeada, a Torre de Guarda, Gar Thurion ou o
    Lugar Secreto, pois estou oculta dos olhos de Melko; mas aqueles que me
    amam mais grandemente chamam-me Loth, pois como uma flor eu sou, e
    mesmo Lothengriol, a flor que desabrocha na planície’”.

    É preciso ter em mente, porém, que esses nomes foram criados por
    Tolkien em torno de 1915-16, o que faz com que eles não sejam
    compatíveis com o sindarin “maduro”. Mesmo assim, eles ajudam a ter uma
    idéia do papel fundamental que Gondolin desempenhou desde sempre na
    imaginação tolkieniana.

  • Haleth, O Caçador???

    A evolução dos textos que compõem O Silmarillion nunca deixa de
    surpreender o leitor. Mas uma das transformações mais surpreendentes e
    radicais na estrutura histórica da Primeira Era com certeza é a sofrida
    por Haleth, a indomável líder dos Haladin de Brethil. O fato é que, até
    a época em que O Senhor dos Anéis foi publicado, Haleth era um homem.
     
     
     
    A primeira aparição de Haleth nos textos
    tolkienianos data do começo dos anos 30, no Quenta Noldorinwa ou
    “História dos Noldor”. A princípio, Tolkien concebera a chegada dos
    Edain a Beleriand como liderada por dois personagens principais: Bëor,
    o Velho, e Hador, o Cabeça-dourada. Um dos filhos de Hador seria
    Haleth, o caçador. Posteriormente, porém, Tolkien decidiu separar
    Haleth da Casa de Hador, e criar a Terceira Casa dos Edain, os homens
    da floresta de Brethil. Como é possível perceber também, o intervalo de
    tempo entre a chegada dos Edain e o fim da Primeira Era era bem menor;
    assim, apenas duas gerações separavam Bëor de Beren, o mesmo
    acontecendo com Hador, que nas genealogias posteriores tornar-se-ia
    membro da QUARTA geração dos Edain em Beleriand.

    Pelo menos até 1951 (quando O Senhor dos Anéis já estava concluído)
    Tolkien ainda concebia Haleth como homem, como se pode perceber lendo
    “Os Anais Cinzentos”, um dos textos-base do Silmarillion publicado por
    Christopher Tolkien. Provavelmente foi só em 1958, quando Tolkien
    revisou o “Quenta Silmarillion” e escreveu o capítulo “Da Vinda dos
    Homens para o Oeste”, que a história de Haleth como a valente filha de
    Haldad e única governante feminina da Primeira Era finalmente se
    estabeleceu.

  • Quantos anos durou a Guerra da Ira?

    Tolkien escreveu pouquíssimo material a respeito
    do fim da Primeira Era depois que O Senhor dos Anéis foi concluído e
    publicado. Praticamente os únicos dados que temos a respeito da Guerra
    da Ira, a grande batalha na qual os Dias Antigos terminaram, está no
    Conto dos Anos da Primeira Era, publicado no livro The War of the
    Jewels.
     
     
     
    Como em quase todos os
    manuscritos de Tolkien, a quantidade de mudança e correção no Conto dos
    Anos foi imensa. Porém, de acordo com Christopher Tolkien, a decisão
    final de seu pai sobre a data do início da Guerra da Ira foi 545 da
    Primeira Era. Mais surpreendente, porém, é o fato de que a data de
    TÉRMINO da guerra é o ano 587. Ou seja: uma longa guerra de quarenta e
    dois anos foi necessária para que Morgoth pudesse ser derrotado. E olha
    que o texto do capítulo “Da Viagem de Eärendil e da Guerra da Ira”
    parece dar a impressão de que houve apenas uma grande batalha…

    Outro fato interessante: o Contos
    dos Anos também indica o líder do exército dos Vanyar na Guerra, que
    teria sido Ingwiel, filho do Rei Supremo Ingwë.

  • A última aventura de Húrin Thalion

    A história de Húrin, Senhor de Dor-lómin e maior dos guerreiros mortais
    na Primeira Era, sempre teve uma importância central para a mitologia
    tolkieniana. Não é por acaso que grande parte de O Silmarillion relata
    as desventuras de Húrin, sua esposa Morwen e seus filhos Túrin e
    Nienor. Em The War of the Jewels, décimo-primeiro livro da série The
    History of Middle-earth, Christopher Tolkien revela aos leitores o
    texto “The Wanderings of Húrin” (As Andanças de Húrin), no qual uma
    aventura até então não relatada desse grande herói vem à tona.
     
     
     
    O texto conta que Húrin, assim como seu filho
    Túrin, reúne à sua volta um grupo desesperado de proscritos depois de
    ser libertado de Angband. Ele tenta achar a entrada para Gondolin, sem
    sucesso, e depois parte para Brethil, onde encontra Morwen, sua esposa,
    à beira da morte. Quando esta morre, Húrin passa a acreditar que o povo
    de Brethil havia se recusado a auxiliá-la, e deseja vingança.

    Contudo, enquanto descansava, Húrin é surpreendido pela guarda de
    Brethil. Os soldados o tratam com desprezo, e desejam mantê-lo, mas ele
    é salvo pelo capitão deles, Manthor, um membro da Casa de Haleth.
    Contudo, o atual governante de Brethil, Hardang, crê que Húrin foi
    enviado por Morgoth para destruir Brethil, e manda encarcerá-lo até que
    aguardasse julgamento. Manthor, revoltado com isso, procura auxiliar
    Húrin durante o julgamento.

    Mas o resultado acaba sendo catastrófico: acusando os Haladin de
    negarem abrigo a Morwen, Húrin acaba fazendo com que exploda uma guerra
    civil em Brethil, na qual tanto Hardang quanto Manthor acabam mortos.
    Impassível, Húrin parte da floresta em busca dos seus companheiros
    proscritos, carregando consigo o peso da maldição de Morgoth.

  • Um pouco de humor tolkieniano

    Nosso leitor Ricardo Pinheiro enviou uma pequena lista dos sintomas manifestados por quem é viciado em Tolkien. É, a coisa é patológica…
    Você sabe que está lendo Tolkien demais quando:
    • Fica procurando runas élficas escritas nos brincos de argola da sua namorada… e depois os joga no fogo!

     

    • Começa a chamar gente baixinha de hobbit;

     

    • Jura que Bill Gates, na verdade, é Sauron disfarçado;

     

    • Vai na Floresta da Tijuca e tenta ouvir os animais e as árvores;

     

    • Vê um episódio de Jornada nas Estrelas e se pergunta: o Sr. Spock não é um elfo que foi parar em outro mundo?

     

    • Coloca no seu curriculum, na parte de idiomas: noções de alto-élfico e entês;

     

    • Monta uma rede com 9 computadores e os batiza assim: Gandalf, Aragorn, Frodo, Gimli…

     

    • … e reserva para aquele Windows que só trava e você detesta o nome de Sméagol, ou mesmo Gollum;

     

    • Monta 2 servidores no seu trabalho: Minas Tirith e Minas Morgul;

     

    • Vê um sacoleiro vindo do Paraguai e pergunta a ele se tem algum parentesco com os Sacola-Bolseiros;

     

    • Vira para um cara chato e xinga: “Seu Uruk-Hai!”;

     

    • … e se ele não entender, responde: “Apenas um orc…”

     

    • Quando for pai, pensa em um belo nome para o seu filho ou filha: Fangorn, Ugluk, Saruman, Arwen…

     

    • Começa a ouvir Led Zeppelin e gostar de Blind Guardian, não sabe por quê;

     

    • Acha que a maior concentração de ents ainda vivos está na Floresta Amazônica…
  • Afinal, quem era Ungoliant?

    O grande problema é que não existe afirmação alguma que seja categórica, do tipo “Ungoliant, a Maia, se aproximou de Telperion”. Mas o que podemos (e devemos) fazer é tentar raciocinar em cima dos materiais que foram publicados a respeito da “senhora de sua própria luxúria”.

    De cara, podemos descartar a possibilidade de que ela fosse uma Vala. Conhecemos todos os Poderes Angélicos, e deles apenas Melkor se corrompeu. E os primeiros companheiros de queda de Melkor foram outras criaturas “angélicas”, da ordem dos Ainur, que se deixaram atrair pelo poder e majestade originais do mais poderoso dos Valar. Sem sombra de dúvida todas essas criaturas eram Maiar. E, embora os Eldar não soubessem com certeza de onde viera Ungoliant, eles acreditavam que “ela descera da escuridão que jaz à volta de Arda, quando Melkor pela primeira vez olhara com inveja para o Reino de Manwë, e que no princípio ela era uma dos que ele corrompeu para seu serviço” (O Silmarillion, “Do Escurecimento de Valinor”).

    O que pouca gente sabe, contudo, é que a passagem continuava nos manuscritos de Tolkien, narrando com mais detalhes a conversa de Melkor e Ungoliant quando ambos planejavam a destruição das Árvores. Tal conversa foi finalmente reproduzida no livro “Morgoth´s Ring”, da série “The History of Middle-earth”. Eis um trecho dos mais significativos: “´Vem para fora!´, disse ele [Melkor]. ´Três vezes tola: primeiro por deixar-me, depois por viver aqui em torpor estando ao alcance de riquezas incontáveis, e agora por evitar-me, Provedor de Dádivas, tua única esperança!´”.

    A implicação dessas passagens é que Ungoliant era realmente um espírito que Morgoth corrompera antes mesmo que Arda fosse feita, e que posteriormente tentou tornar-se independente de seu comando. Essas evidências me levam a crer, portanto, que a Destruidora das Árvores era realmente uma Maia.

  • O Apocalipse segundo Tolkien!

    Com a publicação recente de O Silmarillion no Brasil, os fãs brazucas
    de  Tolkien puderam finalmente conhecer a história da criação do mundo
    de Arda e a origem de Elfos e Homens. O que pouca gente sabe é que 
    Tolkien elaborou também uma narrativa sobre o fim do mundo. Publicada
    postumamente no livro The Shaping of Middle-earth, da série The History
    of Middle-earth, a história era inicialmente o epílogo do Silmarillion,
    mas acabou sendo retirada das versões posteriores da mitologia. Vale a
    pena conhecer esse texto:
     
     
     
    "Depois do triunfo dos Deuses, Earendel navegou
    ainda os oceanos do firmamento, mas o Sol o chamuscava e a Lua o caçava
    no céu…Então os Valar ergueram seu navio branco Wingelot acima da
    terra de Valinor, e o lançaram através da Porta da Noite. E por muito
    tempo Earendel navegou dentro da vastidão sem estrelas, Elwing a seu
    lado, a Silmaril sobre sua fronte, viajando pela Escuridão detrás do
    mundo, uma estrela reluzente e fugitiva. E de quando em quando ele
    retorna e brilha atrás dos cursos da Lua e do Sol acima das defesas dos
    Deuses, mais brilhante que todas as outras estrelas, o marinheiro do
    céu, guardando vigilância contra Morgoth nos confins do mundo. Assim
    navegará ele até que veja a Última Batalha ser lutada sobre as
    planícies de Valinor.

    Assim falou a profecia de Mandos, que ele declarou em Valmar no
    julgamento dos Deuses, e rumor dela foi sussurrado entre todos os Elfos
    do Oeste: quando o mundo for velho e os Poderes se tornarem cansados,
    então Morgoth retornará através da Porta, saído da Noite Atemporal; e
    ele destruirá o Sol e a Lua, mas Earendel cairá sobre ele como uma
    chama branca e o derrubará dos ares. Então a última batalha será lutada
    nos campos de Valinor. Naquele dia Tulkas combaterá Melkor, e à sua
    direita estará Fionwe e à sua esquerda Turin Turambar, filho de Hurin,
    Conquistador do Destino; e será a espada negra de Turin que infligirá a
    Melkor sua morte e fim definitivo; e assim serão os Filhos de Hurin e
    todos os homens vingados.

    Serão nesse momento as Silmarils recuperadas da terra, do mar e do ar;
    pois Earendel descerá e entregará a chama que havia estado sob sua
    guarda. Então Feanor tomará as Três e liberará seu fogo para reacender
    as Duas �?rvores, e uma grande luz aparecerá; e as Montanhas de Valinor
    serão aplainadas, para que a luz chegue ao mundo inteiro. Naquela luz
    os Deuses se tornarão de novo jovens, e os Elfos acordarão e todos os
    seus mortos se levantarão, e o propósito de Iluvatar quanto a eles
    estará cumprido. Mas dos Homens naquela dia a profecia não fala, salvo
    apenas de Turin, e ela o nomeia entre os Deuses".

    Repare que, nas versões antigas do mito, o personagem que depois seria
    o Maia Eonwë é Fionwë Úrion, FILHO de Manwë e Varda. É extremamente
    tentador imaginar como seria a versão final dessa narrativa
    apocalíptica, se Tolkien tivesse podido completar o Silmarillion ainda
    em vida, mas o mais provável é que ela não vale como epílogo da
    mitologia que nós conhecemos.

  • Eram os Valar os deuses nórdicos?

    Quando Tolkien começou a esboçar sua mitologia, lá pelos meados dos anos 10 de nosso século, a inspiração mais forte para ele era a dos mitos do norte da Europa. E, aparentemente, o próprio conceito dos Valar surgiu influenciado pelos deuses do pantão germânico e nórdico.

    A pista para essa possibilidade aparece no livro The Book of Lost Tales II, que reúne as versões mais antigas das histórias de Beren e Lúthien, de Túrin, da queda de Gondolin e de Eärendil. O personagem principal dos Lost Tales, porém, é o marinheiro humano Eriol, que parte da Europa medieval e navega na direção oeste até alcançar Tol Eressëa, a Ilha Solitária, onde os Eldar lhe contam as histórias dos Dias Antigos.

    Eriol pertencia ao povo anglo-saxão, e contou aos elfos sobre os deuses de sua gente, como Wóden e Thunor (para os escandinavos, esses mesmos deuses seriam Odin e Thor, o senhor de Asgard e seu filho, o deus do trovão). Ao ouvirem as histórias de Eriol sobre seus deuses, os elfos imediatamente identificaram Odin com Manwë e Thor com Tulkas.

    É claro que essas idéias foram posteriormente abandonadas, tanto pelo fato de que Manwë não é o pai de Tulkas no Silmarillion que conhecemos, como pela transformação dos Valar de deuses em Poderes Angélicos, os guardiões do Criador no mundo. Mas não deixa de ser interessante imaginar como seria a mitologia do Silmarillion hoje se ela tivesse continuado com essa orientação.

  • Bored of the Rings: as histórias que Tolkien não contava

    Bored of the Rings: as histórias que Tolkien não contava

    Tudo bem, vamos pôr a coisa em contexto histórico. O ano é 1969, auge da contracultura nos EUA, e a edição norte-americana de O Senhor dos Anéis, lançada pela Ballantine Books em 1965, era um dos maiores fenômenos da cultura de massa na época. Foi então que dois estudantes de Harvard, Henry N. Beard e Douglas C. Kenney, resolveram criar a mais famosa e hilária paródia da trilogia: Bored of the Rings, que copia de forma corrosiva e às vezes obscena quase todos os aspectos do livro de Tolkien, até mesmo as línguas élficas, com o seu Auld Elvish, equivalente ao alto-élfico.

    Leia mais

  • Terra-média, o Um Anel de Morgoth

    Terra-média, o Um Anel de Morgoth

    Quem lê sobre o final da Guerra da Ira e a derrota de Morgoth, o primeiro Senhor do Escuro, no Quenta Silmarillion, tende a ficar abismado com a violência do ataque dos Valar. Afinal, para derrotar o Inimigo do Mundo, o exército de Valinor afunda quase toda  Beleriand.
    Pouca gente sabe, mas Tolkien deixou um ensaio que explica de maneira muito clara o porquê de toda essa destruição. Publicado no livro Morgoth’s Ring, o décimo da série The History of Middle-earth, o texto explica que Morgoth “fixou” sua forma física, ao contrário dos outros Valar, para “controlar a hroa, a ´carne´ ou matéria física, de Arda. Ele tentou identificar-se com ela, num procedimento muito parecido com o de Sauron e os Anéis, embora muito mais vasto e perigoso. Assim, fora do Reino Abençoado, toda ´matéria´ tendia a ter um ´ingrediente de Melkor´”.
    Silma John Howe melkor3

    Tolkien explica que, dessa forma, Morgoth foi transferindo sua antiga potência “angélica” para a própria Terra-média: “Por essa razão, Morgoth tinha que ser combatido, principalmente através de força física, e uma enorme destruição material seria o resultado provável de qualquer combate contra ele (…) Esta é a principal explicação para a contínua relutância dos Valar em entrar em combate aberto com Morgoth. A tarefa e o problema de Manwë eram muito mais difíceis que os de Gandalf. O poder de Sauron, relativamente menor, estava concentrado; o vasto poder de Morgoth, disseminado. Toda a Terra-média era o Anel de Morgoth”.

    O grande dilema dos Poderes do Mundo era que Arda seria irremediavelmente desfigurada, seja na vitória ou na derrota. Mas no fim, como sabemos, os Valar prevaleceram – ainda que pagando um alto preço.