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A verdadeira natureza das Águias e Ents

  • Criador do tópico Criador do tópico Haran
  • Data de Criação Data de Criação

Haran

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Olá pessoal

Parece ter ocorrido várias visões a respeito desses seres. A primeira e mais despreocupada é a que aparece nesses trechos, onde seriam simples seres encarnados, provavelmente ainur de menor poder ou outros espíritos menores que desceram a Eä junto com os ainur, cuja origem não era esclarecida com maiores detalhes.
"Pois seu trono situa-se majestosamente sobre o cume da Taniquetil, a mais alta das montanhas do mundo, que se ergue à beira do mar. Espíritos na forma de falcões e águias sempre chegavam em vôo à sua morada e dela partiam; e seus olhos enxergavam as profundezas dos mares e penetravam nas cavernas ocultas nos subterrâneos do mundo".
[O Silmarillion - Capítulo I: Do início dos tempos]

E é corroboada por impressões mais antigas do legendário:
"...duendes, fadas, pixies, leprechuans, e o que mais que não era nomeado, pois seu número era muito grande... eles nasceram antes do mundo e eram mais antigos que seu mais antigo, e não faziam parte dele, mas riam-se muito disso..."
[The Book of Lost Tales]

(há um trecho que eu me lembro que é falado que espíritos menores entraram em Eä sob a liderança de Yavanna, e posso estar enganado, mas tais espíritos eram de variados tipos - mas não achei tal fragmento)
Porém, quando Tolkien tenta desenvolver com mais embasamento essas criaturas, que até então, em suas próprias palavras, eram exceções não frenqüentes, ele se vê obrigado a mudar a sua visão sobre o assunto:
E quanto aos animais e pássaros que pensam e falam? Esses foram adotados frivolamente de mitologias menos 'sérias', mas representam papéis que não podem agora ser retirados. Eles são certamente 'exceções', não usados frequentemente, mas o suficiente para mostrar que eles são um aspecto reconhecido do mundo. Todas as outras criaturas os aceitam como naturais, se não comuns.
Mas as verdadeiras criaturas 'racionais', 'povos falantes', são todos de forma humana/ 'humanóide'. Apenas os Valar e Maiar são inteligências que podem assumir a forma que quiserem em Arda. Húan e Sorontar [1] podem ser Maiar - emissários de Manwë. Mas infelizmente em O Senhor dos Anéis Gwaehir e Landroval são tidas como descendentes de Sorontar.

(...)
Resumindo: acredito que pode-se assumir que 'falar' não é um indício necessário de possessão de 'alma racional', ou fëa. Os Orcs eram animais de forma humana (para zombar de homens e elfos) deliberadamente pervertidos/convertidos em uma aparência mais próxima dos homens. Sua capacidade de 'falar' era na verdade um 'registro' ajustado neles por Melkor.
Até mesmo suas palavras críticas e rebeliosas - ele sabia sobre elas. Melkor ensinou-lhes a fala, e quando procriavam herdavam isso; e eles tinham tanta independência quanto, digamos, cavalos ou cachorros têm de seus donos. Essa fala é bastante ecoada (como a dos papagaios); em O Senhor dos Anéis diz-se que Sauron inventou uma linguagem para eles.
A mesma coisa aconteceu com Huan e as águias: eles foram ensinados a falar pelos Valar, e acresceram a um novo nível - mas ainda não tinham nenhum fëa.
[Home X: Morgoth's Ring - Myths VIII]

O que parece haver nesse estágio é o seguinte:

- Tolkien leva a sério o real parentesco entre Thorondor, Landroval e Gwaihir, estes eram realmente irmãos. Não trata-se de nenhuma metáfora.

- Parece haver aqui dois tipos de espíritos: os ainur, que não tem o dom de ter sua própria prole, e os filhos de Eru, que tem esse dom (humanos, elfos e anões, que seriam "adotivos"). Tolkien dispensa então a possibilidade de um terceiro tipo de espíritos, como na versão anterior, um tipo de espírito menor que encontrava-se na natureza.

- Esse texto na realidade é a respeito dos orcs e posteriormente é revisto no Myths X, mas o que parece mudar é a visão a respeito dos orcs, e não das águias e ents.

Eu tive dificuldade primeiramente em aceitar isso, afinal tais criaturas pareciam ter cultura, e Gwaihir era tratado como um igual por Gandalf. Mas, se pensarmos bem, todos os animais são tratados com cordialidade.

Além disso, não faria sentido Huan ser um maia e ser dado para Celegorm. E se lembrarmos que dragões, a sua maneira, tinham inteligência e grande lábia, não tendo fëa, tendo apenas uma parcela da parte de Melkor, fica fácil aceitar que as águias têm apenas parte do ser de Manwë. Assim como a espada de Eöl tinha parte de si, e todas outras obras sub-criativas.

O que me estranha nesse trecho é ele chegar nessa conclusão a respeito dos animais falantes, mas não a respeito dos ents, que também se reproduziam. Mas eu sempre considerei eles como tratando-se do mesma situação que as águias.

E por fim, tem esse conhecido trecho de O Silmarillion:
E Manwë falou: - Ó, Kementári, Eru pronunciou-se e disse: “Será que algum Vala supõe que eu não tenha ouvido toda a Música? Mesmo o som mais ínfimo da voz mais fraca? Vejam! Quando os Filhos despertarem, o pensamento de Yavanna também despertará, e ele convocará espíritos de muito longe, que irão se misturar aos kelvar e aos olvar, e alguns ali residirão e serão reverenciados, e sua justa ira será temida. Por algum tempo: enquanto os Primogênitos estiverem no apogeu, e os Segundos forem jovens.” Não te lembras agora, Kementári, que teu pensamento cantava, nem sempre sozinho? Que teu pensamento e o meu tampouco se encontravam, de modo que nós dois alçávamos vôo juntos como grandes aves que sobem acima das nuvens? Isso também irá se passar pela intenção de Ilúvatar; e, antes que os Filhos despertem, as Águias dos Senhores do Oeste surgirão com asas como o vento”.
[O Silmarillion - Capítulo II: De Aulë e Yavanna ]

O que eu sempre pensava é que esse trecho pertencia a mesma visão que os primeiros trechos, onde haviam espíritos em forma de falcões. Assim, estes dois trechos de O Silmarillion seriam versões ultrapassadas da visão de Tolkien sobre assunto, a versão válida seria a inexistência de fëa a neles.

Mas o que recentemente li no artigo sobre águias na Wikipedia inglesa é que esse último trecho de O Silmarillion é datado de 1963, enquanto o Myths VIII é datado da década de 50. Assim, parece que Tolkien novamente mudou de opinião, admitindo a entrada de seres menores não-ainur-não-eruhíni ou talvez até ainur menores que, talvez por autorizarão de Eru, poderiam assumir tais formas de kelvar e olvar e terem prole. O problema é que desconheço maiores esclarecimentos do autor.

E então, o que vocês acham? Alguém tem mais alguma informação ou poderia confirmar qual versão é a mais coerente com as últimas visões de Tolkien?
 
Última edição:
Oi!
Sobre a origem das águias eu achei no Silmarillion isto aqui:
"Que teu pensamento e o meu tampouco se encontravam, de modo que nós dois alcançávamos vôo juntos com grande aves que sobem acima das nuvens? Isso também irá se passar pela intenção de Ilúvatar; e, antes que os filhos despertem, as Águias dos Senhores do Oeste surgirão com asas como o vento"
Não sei se escalherece muito mas eu achei que deu uma melhorada...
Quanto a criação dos ents tem esse pedaço aqui que eu achei interessante:
"As Águias habitarãom a montanha e ouvirão as vozes daqueles que clamam por nós. Mas nas florestas caminharam os pastores de árvores."
Foi o que eu consegui achar de contribuição, espero que seja útil.
Abraços!
 
Obrigado, Zaribe. Era esse trecho que eu postaria ali na terceira parte, mas por algum motivo eu só postei parte dele (editarei e colocarei-o inteiro). Ele parece ser de 1963, segundo a wikipédia, o que é posterior ao texto que fala que as águias não têm espíritos, o que leva então a pensar: "Será que Tolkien reavaliou aquela decisão? Ou fora um escrito descompromissado, sem qualquer embasamento maior?"
 
Oi!
Eu não acho que esclareceu quanto ao espirito das águias, pois esse trecho só fala da criação dela não que elas tem espíritos.
Desculpa se eu embolei mais do que ajudei mas essa é a minha opnião...
Abraços!
 
Para mim os Ents e as Águias são dois casos diferentes: As Águias não tinham fëa já os Ents sim, um dos textos citados pelo Haran diz que as aguias e o Huan foram ensinados a falar, já os Ents tinham uma linguagem própria, não sei se isso de algum modo confirma que eles tinham um fëa, mas eu acho que se eles não tivessem fëa não haveria necessidade deles terem linguagem própria, eles também somente iriam aprender a falar com os Valar.
 
Em O Senhor dos Anéis Barbárvore afirma que os ents aprenderam a falar com os elfos. Não sei se trata-se ou não de uma crendice, mas enfim.
 
Um detalhe que, por falta de atenção, não havia percebido:

E Manwë falou: - Ó, Kementári, Eru pronunciou-se e disse: “Será que algum Vala supõe que eu não tenha ouvido toda a Música? Mesmo o som mais ínfimo da voz mais fraca? Vejam! Quando os Filhos despertarem, o pensamento de Yavanna também despertará, e ele convocará espíritos de muito longe, que irão se misturar aos kelvar e aos olvar, e alguns ali residirão e serão reverenciados, e sua justa ira será temida. Por algum tempo: enquanto os Primogênitos estiverem no apogeu, e os Segundos forem jovens.” Não te lembras agora, Kementári, que teu pensamento cantava, nem sempre sozinho? Que teu pensamento e o meu tampouco se encontravam, de modo que nós dois alçávamos vôo juntos como grandes aves que sobem acima das nuvens? Isso também irá se passar pela intenção de Ilúvatar; e, antes que os Filhos despertem, as Águias dos Senhores do Oeste surgirão com asas como o vento”.
[O Silmarillion - Capítulo II: De Aulë e Yavanna ]

Reparem na diferença de período que ocorre. As águias surgem antes que os Filhos despertassem, e é dito que só posteriormente ao despertar que Yavanna convocaria espíritos para dar origem aos ents. Fica claro que, segundo esse trecho, águias e ents têm origens diferentes.

Parece então que os ents são mais "altos" que as águias, possuindo espíritos, talvez ainur menores que até então não haviam descido a Arda, ou talvez espíritos fora da classe dos ainur ou dos Filhos.

As águias permanecem então como Tolkien falara no Myths VIII: "eles foram ensinados a falar pelos Valar, e acresceram a um novo nível - mas ainda não tinham nenhum fëa". E creio que fossem imortais, afinal é dito que havia animais imortais – e qual animal melhor dos que as águias para terem esse benefício, tratando-se de seres sem fëar?

Os espíritos em forma de "falcões e águias" citados em O Silmarillion podem serem interpretados como maiar em fánar. Vários maiar assumiam formas não humanas, mesmo Yavanna assumia a forma de uma árvore. Isso se considerarmos esse trecho como não descartado, pois parece vir de uma versão ultrapassada do legendário.

Porém, creio que as águias que conhecemos são todas animais (em hröar). É possível que Throrondor pudesse ser um maia e, junto a uma águia, criar uma prole animal. Porém, isso não me parece certo no ponto de vista dos valar, pois o casamento deveria acontecer por amor e entre iguais (mesmo que entre elfos, humanos ou maiar, ambos portadores de livre vontade). Agora, um casamento entre um maia, um espírito ancestral, e um animal feito por Yavanna e Manwë... Não parece algo que um maia de bem faria. Ele não seria um maia de reprodução, como talvez tenha ocorrido com maiar menores na origem dos orcs.

O que não entendo é que a mesma problemática apontada por Tolkien no Myths VIII (sobre as águias terem prole, e assim não podendo ter fëa, se considerarmos que só há dois tipos de espíritos, eruhíni e ainur) existe no caso dos ents (que também têm prole). Ora, se ele abriu uma exceção para os ents, poderia tê-lo feito para as águias, e pelo que me parece ele queria, ao menos durante um momento, tê-lo feito, afinal conclui com relutância (usa até a palavra “infelizmente”) que águias não têm fëar.
 
Última edição:
A meu ver, Ents e águias tem tanto origem como condições de existência estritamente diferentes. Os primeiros eram claramente um tipo de ser cuja criação teve participação clara e aberta de Eru, por um pedido de Yavanna, inserindo neles um fëa, exatamente da mesma forma que procedeu com os Anões, porém com uma autorização prévia de Eru, pois o próprio afirma que os Ents também faziam parte da Canção e era da vontade dele que existissem e isso fica claro neste trecho:

E Manwë falou: - Ó, Kementári, Eru pronunciou-se e disse: “Será que algum Vala supõe que eu não tenha ouvido toda a Música? Mesmo o som mais ínfimo da voz mais fraca? Vejam! Quando os Filhos despertarem, o pensamento de Yavanna também despertará, e ele convocará espíritos de muito longe, que irão se misturar aos kelvar e aos olvar, e alguns ali residirão e serão reverenciados, e sua justa ira será temida. Por algum tempo: enquanto os Primogênitos estiverem no apogeu, e os Segundos forem jovens.” Não te lembras agora, Kementári, que teu pensamento cantava, nem sempre sozinho? Que teu pensamento e o meu tampouco se encontravam, de modo que nós dois alçávamos vôo juntos como grandes aves que sobem acima das nuvens? Isso também irá se passar pela intenção de Ilúvatar; e, antes que os Filhos despertem, as Águias dos Senhores do Oeste surgirão com asas como o vento”.
[O Silmarillion - Capítulo II: De Aulë e Yavanna ]


Seres cuja natureza provavelmente tende a ser de hibrido, são as árvores "vivas" de Fangorn, essas sim se assemelhariam mais aos animais com inteligência, já os Ents não, talvez eles tenham dado origem a estes seres unicamente "entescos" mas eles eram eruhín a meu ver, assim como os Anões, criados no entanto para atender as necessidades de Yavanna e sob o consentimento direto de Eru, que lhes deu um espírito;

Em O Senhor dos Anéis Barbárvore afirma que os ents aprenderam a falar com os elfos. Não sei se trata-se ou não de uma crendice, mas enfim.

De certa forma sim, pois provém daí o fato de que ents sabem usar outras linguas, além de sua própria que lhes é natural e mais adequada a sua natureza, esta poderia ter sido criada pelos próprios ou lhes dada por Yavanna.
 
Em O Senhor dos Anéis Barbárvore afirma que os ents aprenderam a falar com os elfos. Não sei se trata-se ou não de uma crendice, mas enfim.

Oi!
Não é uma crendice pois Celeborn chama Barbarvore de "mais velho" talvez porque ele seja o ent mais velho, o primeiro ent a ser criado.
Abraços!
 
O que Barbárvore dá a entende é que os ents aprenderam a falar com os elfos, independente da língua. Ele diz que os elfos "cured us of dumbness" ("nos curaram da mudez"). Creio que, depois desse contato com os elfos, os ents resguardaram-se e criaram sua própria língua.

Essa questão dos ents ainda parece-me complicada. Pois, segundo Tolkien, as verdadeiras criaturas 'racionais', 'povos falantes', são todos de forma humana / 'humanóide'. Tolkien parece ignorar os ents em todo o texto.

E eu tenho dificuldades em ver os ents como eruhíni, afinal eles foram criados quase como um instrumento de Yavanna para proteger suas obras. Objetivo esse que assemelha-se mais aos objetivos das águias (animais), do que aos humanóides. Elfos, humanos e mesmo anões foram criados para prosperarem, aprenderem e criarem - existiam para si e seus próprios povos. Não parece ser o caso dos ents.
 
E é corroboada por impressões mais antigas do legendário:
"...duendes, fadas, pixies, leprechuans, e o que mais que não era nomeado, pois seu número era muito grande... eles nasceram antes do mundo e eram mais antigos que seu mais antigo, e não faziam parte dele, mas riam-se muito disso..."
[The Book of Lost Tales]

(há um trecho que eu me lembro que é falado que espíritos menores entraram em Eä sob a liderança de Yavanna, e posso estar enganado, mas tais espíritos eram de variados tipos - mas não achei tal fragmento)

Achei o trecho (na verdade , vejo agora, ele é a "versão completa" do primeiro):

"But with Aulė, was the great lady Palurien whose delights were richness and fruits of the earth for which reason has she long been called Yavanna among the Eldar. About them fared a great host who are the sprites of trees and woods, of dale and forest and mountain-side, or those that sing amid the grass at morning and chant among the standing corn at eve. These are the Nermir and the Tavari, Nandini and Orossi, brownies fays pixies, leprawns, and what else are they not called, for their number is very great: yet must they not be confused with the Eldar, for they were born before the world and are older than its oldest, and are not of it, but laugh at it much, for had they not somewhat to do with its making, so that it is for the most part a play for them; but the Eldar are of the world and love it with a great and burning love, and are wistful in all their happiness for that reason".
[The Book of Lost Tales - part 1]

 
O que Barbárvore dá a entende é que os ents aprenderam a falar com os elfos, independente da língua. Ele diz que os elfos "cured us of dumbness" ("nos curaram da mudez"). Creio que, depois desse contato com os elfos, os ents resguardaram-se e criaram sua própria língua.

Essa questão dos ents ainda parece-me complicada. Pois, segundo Tolkien, as verdadeiras criaturas 'racionais', 'povos falantes', são todos de forma humana / 'humanóide'. Tolkien parece ignorar os ents em todo o texto.

E eu tenho dificuldades em ver os ents como eruhíni, afinal eles foram criados quase como um instrumento de Yavanna para proteger suas obras. Objetivo esse que assemelha-se mais aos objetivos das águias (animais), do que aos humanóides. Elfos, humanos e mesmo anões foram criados para prosperarem, aprenderem e criarem - existiam para si e seus próprios povos. Não parece ser o caso dos ents.


Não sou uma conhecedora da história da origem dos entes, mas se a origem da criação deles foi para proteger as obras de Yavanna, não seria este o único objetivo da existência deles?
E não seria a capacidade de se comunicar com outros seres um meio de poder entendê-los para melhor cumprir sua função como ent?
 
Resgato um texto que postei aqui em jan/2015 sobre águias, ents e animais inteligentes.

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Quanto à evolução do pensamento de Tolkien na questão dos ents e animais inteligentes, penso haver duas fases do pensamento de Tolkien, uma anterior ao Myths VIII e outra posterior. Na primeira Tolkien não está interessado numa classificação mais rigorosa, as águias seriam possuidoras de espíritos; não só águias, mas vários outros seres da natureza, sem necessidade de explicações teológicas e classificações mais elaboradas desses espíritos, que só viriam na segunda fase, no Myths VIII, e que seriam concretizadas em textos posteriores.

But with Aule, was the great lady Palurien whose delights were richness and fruits of the earth for which reason has she long been called Yavanna among the Eldar. About them fared a great host who are the sprites of trees and woods, of dale and forest and mountain-side, or those that sing amid the grass at morning and chant among the standing corn at eve. These are the Nermir and the Tavari, Nandini and Orossi, brownies fays pixies, leprawns, and what else are they not called, for their number is very great: yet must they not be confused with the Eldar, for they were born before the world and are older than its oldest, and are not of it, but laugh at it much, for had they not somewhat to do with its making, so that it is for the most part a play for them; but the Eldar are of the world and love it with a great and burning love, and are wistful in all their happiness for that reason.

But Manwë Súlimo, highest and holiest of the Valar, sat upon the borders of Aman, forsaking not in his thought the Outer Lands. For his throne was set in majesty upon the pinnacle of Taniquetil, the highest of the mountains of the world, standing upon the margin of the sea. Spirits in the shape of hawks and eagles flew ever to and from his halls; and their eyes could see to the depths of the seas, and pierce the hidden caverns beneath the world.

See p. 138.-At the bottom of the page bearing the brief text V (p. 389) my father jotted down the following, entirely unconnected with the matter of the text:
Living things in Aman. As the Valar would robe themselves like the Children, many of the Maiar robed themselves like other lesser living things, as trees, flowers, beasts. (Huan.)

- Nota que encontra-se at the bottom of the page bearing the brief text V, que por sua vez foi achado on a single sheet, together with other more substantial writings similar in appearance, preserved in a folded newspaper of November 1958.

Resumindo: acredito que pode-se assumir que 'falar' não é um indício necessário de possessão de 'alma racional', ou fëa. Os Orcs eram animais de forma humana (para zombar de homens e elfos) deliberadamente pervertidos/convertidos em uma aparência mais próxima dos homens. Sua capacidade de 'falar' era na verdade um 'registro' ajustado neles por Melkor. Até mesmo suas palavras críticas e rebeliosas - ele sabia sobre elas. Melkor ensinou-lhes a fala, e quando procriavam herdavam isso; e eles tinham tanta independência quanto, digamos, cavalos ou cachorros têm de seus donos. Essa fala é bastante ecoada (como a dos papagaios); em O Senhor dos Anéis diz-se que Sauron inventou uma linguagem para eles.

A mesma coisa aconteceu com Huan e as águias: eles foram ensinados a falar pelos Valar, e acresceram a um novo nível - mas ainda não tinham nenhum fëa.

- O texto foi achado in the same small collection gathered in a newspaper of 1959 as texts III and VI. Like them it was written on Merton College papers of 1955.

E Manwë falou: - Ó, Kementári, Eru pronunciou-se e disse: “Será que algum Vala supõe que eu não tenha ouvido toda a Música? Mesmo o som mais ínfimo da voz mais fraca? Vejam! Quando os Filhos despertarem, o pensamento de Yavanna também despertará, e ele convocará espíritos de muito longe, que irão se misturar aos kelvar e aos olvar, e alguns ali residirão e serão reverenciados, e sua justa ira será temida. Por algum tempo: enquanto os Primogênitos estiverem no apogeu, e os Segundos forem jovens.” Não te lembras agora, Kementári, que teu pensamento cantava, nem sempre sozinho? Que teu pensamento e o meu tampouco se encontravam, de modo que nós dois alçávamos vôo juntos como grandes aves que sobem acima das nuvens? Isso também irá se passar pela intenção de Ilúvatar; e, antes que os Filhos despertem, as Águias dos Senhores do Oeste surgirão com asas como o vento”.

No one knew whence they (Ents) came or first appeared. The High Elves said that the Valar did not mention them in the 'Music'. But some (Galadriel) were [of the] opinion that when Yavanna discovered the mercy of Eru to Aule in the matter of the Dwarves, she besought Eru (through Manwe) asking him to give life to things made of living things not stone, and that the Ents were either souls sent to inhabit trees, or else that slowly took the likeness of trees owing to their inborn love of trees.

Tolkien conclui que as águias (e animais inteligentes genéricos) não têm fëa. Tivesse Tolkien mudado de opinião a respeito das águias após a escrita do Myths VIII, teria no texto tardio de O Silmarillion toda a oportunidade para deixar clara essa nova concepção das águias. Não o fez, pelo contrário, faz questão de separar as águias dos espíritos que virão de "muito longe": enquanto esses espíritos surgem quando os Filhos despertarem, as águias já existem antes que os Filhos despertem - logo não há no texto nenhuma indicação de espíritos nas águias. Tolkien não estende esses 'espíritos' para as águias, havendo assim uma diferença evidente entre elas e os ents.

A pequeníssima nota na margem da página do Myths V parece nesse contexto anterior ao Myths VIII e a visão de Tolkien mais elaborada sobre o assunto, por simples navalha de Occam: teria ele mudado de opinião após o Myths VIII sobre os animais inteligentes, não o faria através dessa nota pequeníssima e pouco explicativa. Caso oposto é a situação dos orcs, que no no trecho citado do Myths VIII são tidos como praticamente animais, mas no Myths X são reavaliados radicalmente e considerados humanos pervertidos de alguma maneira.

Entendo dos dois textos mais tardios que os ents estariam mais próximos dos anões do que dos animais ou ainur - do mesmo jeito que Eru compadeceu de Aulë e deu 'espírito' a seus filhos, também Eru compadeceu de Yavanna e deu 'espírito' às criaturas de seu anseio. Os ents seriam criaturas que Eru 'deu vida', exatamente como colocado no texto de 63, e tantos ents quanto anões proveriam da 'mercy of Eru'. Assim, tanto anões e ents surgem em uma ocasião especial e bastante particular, sob intervenção de Eru, e não como mero desdobramento da capacidade natural dos ainur de criarem ou de adentrarem em corpos materiais.

Assim, não entendo os "espíritos de muito longe" como ainur, e sim espíritos do mesmo "lugar" de fora de Eä donde vêm os espíritos dos elfos, homens e anões, enfim, de onde vêm almas. Nesse sentido faz bastante sentido a canção de Barbárvore citar quatro povos livres (elfos, anões, homens e ents) e só depois citar as águias, colocando-as juntas de outros animais como serpentes. Sem falar que, fossem os ents ainur, Tolkien precisaria rever toda a questão da descendência dos ainur, o que não indicou em nenhum lugar que tenha feito: sequer no Myths VIII se preocupou em mencionar os ents e os 'entinhos', de forma que desde ali parecia ver os ents como distintos dos animais inteligentes e próximos dos anões e outros 'humanóides' (Barbárvore é descrito como 'man-like' em O Senhor dos Anéis) que eram livres da problemática da progenitura.

Se os primeiros (ou talvez todos) ents são colocados frente à convocação de Yavanna antes de encarnar-se, é apenas uma autoridade que Eru chancelou e concedeu a ela e diz respeito ao papel que os ents desempenhariam no mundo, autorização não tão especial se lembrarmos que Mandos exercia papel semelhante na convocação após a morte dos eruhíni, e que os valar se envolviam no processo de 'fabricação' dos corpos dos elfos ressuscitados. Nesse sentido é até irrelevante se os primeiros ents entraram em árvores pré-existentes (de forma parecida com Carcharoth) ou assumiram a forma de árvores diretamente (de forma parecida com Melian): o texto de 1963 deixa aberta as duas possibilidades. Aqui a questão do 'tipo de encarnação' parece marginal.

Indo para uma discussão mais conjectural, não parece à toa então que anões e ents, embora povos livres e dignos por si só, inclusive podendo corromper-se (tornando-se violentos, rancorosos, ou introspectivos)*... parecem ter um papel mais curto e secundário no conto de Arda, existindo em uma pequena parte dele ("enquanto os Primogênitos estiverem no apogeu, e os Segundos forem jovens"). Por causa disso está uma espécie de desajuste entre os gêneros femininos e masculinos (nos ents, a diferença de temperamento entre ents e entesposas, o que os levou a viver separadamente e posteriormente perderem contato; e nos anões, um número menor de anões fêmeas e uma propensão menor ao casamento que os anões têm) refreando o crescimento na população, quase como se esse bom ajuste não fosse da capacidade dos valar, apenas de Eru.

*Não há indícios (excetuando talvez passagens de O Hobbit) que águias e dragões tenham uma liberdade desse tipo - isto é, corromperem-se por livre inclinação do espírito, no caso das águias, ou fazerem o bem, também por livre inclinação, no caso dos dragões, o que serve como argumento adicional de que, como espécie, dragões e águias não tenham espírito.

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Faço esse resgate porque A Natureza da Terra-Média parece trazer novidades. O texto mais tardio de O Silmarillion diz que

Quando os Filhos despertarem, o pensamento de Yavanna também despertará, e ele convocará espíritos de muito longe, que irão se misturar aos kelvar e aos olvar, e alguns ali residirão e serão reverenciados, e sua justa ira será temida.​

Até agora não havia nenhuma menção mais direta sobre a origem e natureza desses "espíritos de muito longe". Havia quem defendesse que seriam espíritos genéricos (provavelmente ainur) já adentrados em Eä e sob a autoridade de Yavanna, o análogo benigno de lobisomens como Draugluin e Carcachorth. Mas de minha parte, conforme discorri no texto, enxergava uma semelhança estrutural entre o surgimento dos anões e dos ents, e acreditava que os espíritos dos ents vieram "do mesmo 'lugar' de fora de Eä donde vêm os espíritos dos elfos, homens e anões, enfim, de onde vêm almas". Pois bem, Tolkien diz, em texto publicado em A Natureza, situado em cerca de 1959:

Os fëar dos Elfos e Homens (e Anãos, via Aulë, Ents, via Yavanna) são intrusões em Eä a partir de fora. Tal como os Valar foram enviados para dentro de Eä.[530]​

[330] O quarto (e último) parágrafo do esboço breve tem, neste ponto:​
Os fëar de Elfos e Homens, e de coisas que surgiram depois (Ents? Anãos) foram intrusões da parte de Eru, assim como dos Valar — Aule e os Anãos. Yavanna e os Ents. Maiar poderiam tomar formas de Águias etc. — [? estes] foram enviados a Eä. Não são de Eä, mas agentes de Eru em Eä.​

Ents e anões parecem, nessa linha de raciocínio, serem "intrusões em Eä", assim como elfos e homens. Alguém poderá defender que são ainur vindos de fora, mas o texto (especialmente se iluminarmos a interpretação com sua versão esboçada) estabelece uma diferença entre "enviados" (ainur) e "intrusões" (de elfos e homens). Repare que, no esboço, foram intrusões "da parte de Eru, assim como dos Valar", para em seguida dizer "Aule e os Anãos. Yavanna e os Ents". Quer dizer, assim como Eru "acarreta" a intrusão de espíritos de elfos e homens (e não é, ele próprio, intruso), Aule e Yavanna "acarretam" a intrusão dos espíritos de anões e ents. Enfim, acho bastante consonante com o que defendi no texto.

Só me estranha essa menção a águias como maiar tão tardiamente quanto 1959, mais ou menos na época do texto tardio em O Silmarillion, sendo que nos Mitos Transformados VIII, Tolkien já reconhece a dificuldade de as águias serem maiar por terem descendentes (visto que é dito em O Senhor dos Anéis que Landroval e Gwaihir são descendentes de Thorondor). Mas pode ser um dos vários lapsos e descuidos, que há aos montes em A Natureza, o que condiz com o caráter rascunhado da maioria dos textos. E essa menção, em especial, aparece no esboço, e não na versão "final". Outra possibilidade é que, na realidade, essa conjectura tenha sido escrita anteriormente ao pensamento mais bem acabado que vemos no Mitos Transformados VIII - pelo que me parece, esses textos não são datados com grande precisão, todos são datados de cerca de 1959...
 
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