Fúria da cidade
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Plágio é um assunto bem complexo quando se fala de games. É possível fazer registros de muitos elementos de um jogo, como a história, os personagens e as artes. Mas não dá para possuir direitos autorais sobre a mecânica. Você não pode, por exemplo, dizer que é dono da ideia de "barra de vida" ou "pulo do Mario".
Só isso já abre várias brechas para certas "inspirações". Adicione ao problema o fato de que os jogos para celular são facilmente clonados e pronto, você tem todo um mercado vulnerável à prática do copie e cole.
Escolhemos 7 casos que são emblemáticos.
1) 2048 (2014) X Threes (2014)
Se você estava vivo e tinha um celular em 2014, você jogou 2048, o puzzle simples que consistia em somar números até conseguir o total de 2048. Foi uma pequena febre daquele ano, assim como o Flappy Bird. Outra coisa que esses dois jogos têm em comum é que ambos são plágios.
O que acontece muito com esses jogos de celular é que, quando um faz sucesso, dezenas de outros aparecem com uma fórmula idêntica e um nome muito parecido, sempre na intenção de pegar jogadores desavisados (afinal, as palavras de busca são as mesmas) e faturar uma grana com anúncios.
É uma prática comum nessa indústria e difícil de ser combatida, pois é muito fácil criar os clones, ao passo que decisões judiciais e processos são lentos. Você leva um mês para derrubar um clone sendo que, no dia seguinte, os plagiadores já surgem com outro.
Só que, com 2048, as coisas foram levadas para o lado pessoal. Um desenvolvedor chamado Asher Vollmer publicou um post em seu site dizendo que tanto o 2048 como outro game chamado 1024 eram clones de seu jogo Threes!.
Threes! saiu no dia 6 de fevereiro, 1024 saiu em 27 de fevereiro e 2048 saiu no começo de março.
Na carta, os desenvolvedores disseram estar sentidos com o desenrolar dos fatos. "Especialmente quando as pessoas dizem que Threes!, um jogo sobre o qual nos debruçamos por quase um ano e meio, é um clone de 2048. Outros fizeram pouco caso dizendo que 2048 é melhor que Threes!. Isso tudo doeu bastante. Nós sabemos que o Threes! é um jogo melhor, nós gastamos mais de um ano nele. E, obviamente, o Threes! é a razão de o 2048 existir", diz o documento.
A carta foi o início de uma série de posts que somam mais de 45 mil palavras falando sobre o caso. Afinal, nada melhor que um bom textão pra resolver uma treta da internet.
2) Genshin Impact (2019) X Breath of The Wild (2017)
Em agosto deste ano, a Sony demonstrou no evento chinês ChinaJoy um de seus novos jogos para o PS4: Genshin Impact. O problema foi que todo mundo notou a mesma coisa: o game é uma cópia descarada de The Legend of Zelda: Breath of The Wild, do Switch.
Tudo é parecido: o gameplay, o visual e até a música. Os fãs de Zelda ficaram bem desgostosos com a atitude e postaram fotos no estande da Sony fazendo gestos ofensivos aos banners do jogo. Um fã revoltado até mesmo destruiu seu PS4 na frente do estande.
Os protestos não alteraram o cronograma do jogo, que continua planejado para sair em 2020. Mas imagens recentemente postadas no site oficial de Genshin Impact indicam que os desenvolvedores tomaram algumas medidas para se afastar das comparações com Zelda, o que incluiu a adição de novos animais para interagir e NPCs para conversar (esperamos que nenhum deles tenha jantado o irmão).
3) Pong (1972) X tênis de mesa digital (mesma época)
Quando o revolucionário Pong saiu para o Atari, o inventor do console rival Magnavox Odyssey, Ralph Baer, entrou com um processo por violação de direitos autorais. Ele havia desenvolvido uma versão digital do esporte tênis de mesa para seu console, a qual afirmava que Nolan Bushnell, co-fundador da Atari, havia copiado.
Temendo que os custos com o processo fossem drenar os recursos da Atari, Bushnell preferiu fazer um acordo com Baer em 1976. A Atari pôde continuar distribuindo Pong para consoles desde que pagasse uma taxa de licenciamento para a Magnavox.
Pong acabou se tornando o primeiro videogame comercialmente bem-sucedido, abrindo caminho para os anos de ouro da Atari, então nós podemos deduzir que Bushnell agiu bem.
4) Limbo of The Lost (2008) X todo mundo
Limbo of The Lost talvez seja o caso mais escandaloso desta lista, e com justiça. Em 2008, mesmo ano de lançamento do game, o site GamePlasma descobriu e reportou que vários cenários do jogo haviam sido diretamente roubados de outros títulos.
Havia cenários e/ou objetos retirados de Oblivion, Silent Hill 4, Diablo 2, Return to Castle Wolfenstein, Painkiller, Thief 3, Crysis, Baldur's Gate, Bioshock e muitos outros. Era um festival de copie e cole!
E o pior é que a maioria das cópias era descarada, sem nenhuma alteração. Conforme dá pra ver nas imagens, basta colocar as telas de Limbo e uma de suas "inspirações" lado a lado para constatar o plágio.
Em um pronunciamento oficial, o Majestic Studios, responsável pelo jogo, botou a culpa em "materiais com direitos autorais apresentados por fontes externas ao time de desenvolvimento".
Jeito bonito de falar que foram pegos com as calças curtas.
Na realidade, a história que corre é que Limbo era o projeto de estimação de Steve Bovis, o programador-chefe. Sem dinheiro para bancar um departamento de arte, ele simplesmente usou modelos em domínio público e roubou cenários de outros jogos.
Segundo é discutido em um fórum do Reddit por um usuário que diz conhecê-lo, Bovis pretendia lançar uma "edição especial" do jogo com arte original – só que, para criar isso, ele precisava do dinheiro das vendas da versão plagiada primeiro. Mas que plano genial, não é mesmo?
O GamePlasma saiu do ar, portanto a reportagem original não está mais disponível. Mas essas imagens de comparação estão disponíveis em outros sites:
Limbo Of The Lost (esquerda) e Oblivion (direita)
Limbo Of The Lost (esquerda) e Thief 3 (direita)
Limbo Of The Lost (esquerda) e Unreal Tournament 2014 (direita)
Chocadérrima com as revelações de plágio, a distribuidora Tri Synergy tirou o game do mercado.
5) Candy Crush Saga (2012) X Scamperghost (2009) e CandySwipe (2010)
O estúdio desenvolvedor de Candy Crush, chamado King, foi acusado em 2014 de ter plagiado o game indie Scamperghost. Segundo denúncia do criador de Scamperghost, Mathew Cox, a King iria originalmente distribuir seu jogo, mas o acordo não deu certo e, para contornar a situação, a King simplesmente clonou o game.
E esse é só o começo da história!
Surpreendida pelo sucesso de Candy Crush, a King entrou no modo full pistola e saiu processando todo joguinho que usava "candy" e "saga" no nome. E aí eles resolveram processar um jogo chamado CandySwipe.
Só tinha um detalhe: o CandySwipe tinha saído dois anos antes de Candy Crush. Tanto é que o criador de CandySwipe, Albert Ransom, havia registrado a marca em 2011 e já tinha processado a própria King por copiar o seu jogo.
Mas nada disso importava pra King, porque ela comprou os direitos de um game ainda mais antigo chamado Candy Crusher. Com essa compra, a King pretendia assumir de vez a propriedade da marca "candy" e varrer os clones do mapa, mesmo seu jogo não sendo nada original (cá entre nós, esses joguinhos de combinar 3 peças já existiam desde os anos 1990).
E a história termina de uma forma dramática, com Ransom publicando uma carta aberta pra King dizendo: "espero que vocês estejam felizes tirando comida da boca da minha família".
6) Crouching Dragon Legends (2014) X Hearthstone (2014)
Hearthstone (esquerda) e Crouching Dragon Legends (direita)
Em 2014, a Blizzard venceu um processo contra a chinesa Unico Interactive por violação de direitos autorais. A empresa alegava que Crouching Dragon Legends, jogo da Unico muito famoso na China na época, era uma cópia de seu Hearthstone.
E era mesmo! Crouching Dragon Legends possuía o mesmo gameplay, alterando apenas o tema das cartas de baralho.
Com a vitória judicial da Blizzard, o jogo chinês sumiu das lojas de apps. A Unico disse que o dinheiro gasto pelos jogadores no título seria reembolsado com itens em outros jogos desenvolvidos por ela.
Tudo isso para, em 2019, a Blizzard fazer essa pataquada com o jogador de Hearthstone de Hong Kong que protestou numa transmissão ao vivo.
7) Fortnite (2018) X PUBG (2017)
PUBG (esquerda) e Fornite (direita)
Em 2018, a coreana PUBG, que criou o PlayerUnknown's Battlegrounds, saiu processando todo mundo que utilizasse o esquema de "battle royale" em seus jogos, ainda que ela não fosse a primeira a ter a ideia.
Entre as vítimas estava a NetEase, que faz o Knives Out e o Rules of Survival, mas o alvo principal era a Epic Games, que criou Fortnite. O game da Epic havia saído alguns meses antes, em 2017, mas o modo "battle royale" só foi adicionado depois.
O documento do processo é especialmente engraçado, com a PUBG reclamando autoria de todas as ideias do gênero, como o salto do avião, a procura por armas, as roupas, os veículos, etc. Tem até um item dedicado exclusivamente à frigideira.
Se você estiver com tempo livre, o documento tem 157 páginas de puro suco de capitalismo.
E não serviu pra nada, pois a PUBG resolveu retirar o processo seis meses depois e seguir com a vida.
https://controlfreak.blogosfera.uol...-crush-a-fortnite-7-games-acusados-de-plagio/