Parte 3: Profecias

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Escrito por Fábio Bettega

Profecias na obra de J. R. R. Tolkien
Sempre que eu penso no futuro não só me vêm a sensação de incerteza,
mas também um quê de desamparo. Essa percepção de impotência que tenho
com relação ao futuro, tenho certeza, é compartilhada por todo e cada
ser humano que algum dia já tenha parado para pensar “O que será de mim
amanhã?”. E como muitos dizem “A arte imita a vida”, tantos já foram os
autores que tentaram expor em suas obras um pouquinho de visão do
futuro, que o professor Tolkien foi um dos que também usaram profecias
em seus livros.

 

 

Sendo um dos personagens mais adorados pelos fãs do Mestre Tolkien,
muitos que estão lendo meu artigo neste momento lembrarão de Aragorn
Elessar. Sendo um grande rei dos Homens, sua importância e grandeza
foram previstas muito antes até mesmo da união de seus pais, seu
nascimento era imprescindível para que a Terra-Média fosse libertada
dos terrores que cada vez a assolavam com maior força e ímpeto.


Mas eu, particularmente, quando pensei em fazer esta terceira parte do
artigo não lembrei de Aragorn em imediato. Inicialmente, lembrei-me de
Galadriel. A elfa sempre soube, desde que adquirira o seu Anel de
Poder, que um dia a tentação do Um Anel viria buscar em seu coração a
fraqueza suficiente para abatê-la e dominar todo o mundo. Ao meu ver,
esta é uma profecia de caráter muito mais intenso do que a que se
refere a Aragorn e mais tarde discutirei o porquê.


Há ainda duas profecias de forte intensidade na obra de Tolkien. A
primeira é o Juramento de Fëanor, que ao mesmo tempo é uma maldição, e
a segunda é a Profecia de Mandos. Estas duas também serão discutidas
mais à frente, por se relacionarem intimamente e terem particularidades
que raramente são vistas.


Uma profecia, em geral, é feita por pessoas que estudam e buscam os
significados do futuro, profetas, mas há também vezes nas quais pessoas
leigas fazem predições que se provam verdadeiras com o passar do tempo.
É claro que nem sempre é fácil compreender uma profecia, muitas vezes é
necessária uma interpretação e como homens são falíveis, nem sempre é
possível ter uma quase certeza do que acontecerá em um futuro próximo
ou distante. Essas pessoas que realizam as chamadas profecias estão em
um momento de transe quando declaram as palavras proféticas e, na
verdade, não têm nenhuma consciência do que estão fazendo – raros são
os casos em que o adivinho lembra o que disse ou viu. Neste segundo
caso há as Visões propriamente ditas ou os Sonhos.


Para a ciência da psicanálise é no inconsciente e no mundo dos Sonhos
que o seu verdadeiro eu está, corresponde a um momento em que não há
máscaras. Freud não era um profeta, mas parecia compreender uma ínfima
parcela da misteriosa ligação entre o eu individual e o Inconsciente
Coletivo.


Vamos entender o que é Inconsciente Coletivo para depois falarmos mais
a respeito de profecias e destino. Para isso contarei a história dos
noventa e nove macacos.

Na década de cinqüenta, cientistas japoneses decidiram fazer
experiências com os macacos de ilhas ao redor pertencentes ao
território japonês. Um dos cientistas jogou aos macacos, batatas doces
na areia. Os espécimes adoraram a comida, mas acharam o gosto da areia
um pouco ruim. Depois de algum tempo, um dos macacos levou uma das
batatas a um lago e a lavou. Progressivamente o número de macacos que o
imitou, aumentou consideravelmente.

Os cientistas não conseguem explicar o motivo, mas depois que o número
de macacos fazendo a mesma coisa atingiu uma certa quantidade, os
macacos de outras ilhas – ninguém sabe explicar o motivo e nem como, já
que os macacos de diferentes ilhas não tiveram contato entre si –
começaram a fazer o mesmo processo.


Esta história ilustra claramente o que é o Inconsciente Coletivo:
idéias ou ações que em um determinado momento, sem explicação aparente,
acometem a Humanidade ou os seres vivos em geral e todos passam a um
novo momento – evolutivo ou involutivo. A descoberta do fogo ou o
esquecimento dos métodos egípcios por seu próprio povo, são exemplos
práticos do que estou querendo dizer.


E, voltando às profecias, a adivinhação por meio dos Sonhos é um
processo muito mais complexo não só porque a pessoa em questão está
dormindo, mas pelo motivo de que todos os seres humanos passam pelo
mesmo mundo dos Sonhos durante o seu sono. Este tipo de profecia é
muito mais abrangente, pois milhares de mentes podem estar conectadas a
um mesmo processo vital. Claro, ainda há o problema de quando a pessoa
acordar ela pode vir a esquecer a profecia que ouviu ou a Visão que
teve.


Profecias e Visões são enigmas antigos da humanidade, que remontam à
mais antiga civilização que se tem notícia: Atlântida. Muitos dizem que
a Cidade Perdida tinha um conhecimento que não só rivalizava como
também superava enormemente a sociedade egípcia, há que diga que até
mesmo os nossos atuais conhecimentos. O próprio filósofo Platão,
discípulo do sábio ignorante Sócrates, escreveu tratados sobre a
cidade. Walt Disney transportou para as telas em forma de desenho
animado: Atlantis. Deixando de lado as profecias deste antigo povo que
viu o seu próprio fim muito antes dele acontecer, há um trecho de “Os
Livros da Magia – O convite” baseado na obra de Neil Gaiman e John
Bolton que explicam a relação entre a Cidade Perdida, Sonhos e a Magia
(qualquer forma dela, inclusive as predições):

“(…)– De qualquer forma – prosseguiu o mago – , o que a humanidade
de seu tempo faz de errado é imaginar Atlântida como um lugar que tem
alguma forma de existência quantificável.(…) Houve muitas Atlântidas,
e ainda haverá outras. É só um símbolo. A verdadeira Atlântida está
dentro de você, assim como está dentro de todos nós.
(…)
– É a cidade perdida que afundou sob histórias e mitos. O lugar que a
gente visita nos sonhos e que de vez em quando aparece na superfície da
consciência.(…)”

De forma que a arte da adivinhação não é fácil e quando feita em
Sonhos, um processo tão difícil quanto descobrir uma terra coberta
pelos mares.

Deixando de lado as dificuldades e analisando os fatos propriamente
ditos, o primeiro tipo de profecia que analisarei é aquela que segue o
estilo da que foi feita para Aragorn: para que toda a vida existente
sobreviva é preciso que tal líder ou líderes apareçam para salvar e
liderar o povo para a vitória. Esta análise não será concluída nesta
terceira parte do artigo. Para iniciar este longo processo, escolhi
seguir a linha do professor Tolkien com relação ao aspecto religioso. A
obra abrangida neste artigo será “As Crônicas de Nárnia”.

A obra foi escrita pelo inglês C.S.Lewis, grande amigo de Tolkien –
embora este último considere os livros infantis. Lewis hospedou algumas
crianças em casa durante a Segunda Grande Guerra e ficou tão surpreso
com as histórias que inventavam, que resolveu escrever sobre elas. Ele
fez sete livros ao total de aventuras em Nárnia, um deles “O leão, a
feiticeira e o guarda-roupa” já foi adaptado para o cinema.

Nárnia é uma terra mágica que pode ser alcançada através de um portal:
um guarda-roupa enfeitiçado. Quando a Inglaterra declara guerra à
Alemanha em 3 de setembro de 1939, o governo inglês decide retirar
todas as crianças de Londres e enviá-las para o interior do país. É
desta forma que Lúcia, Pedro, Susana e Edmundo vão morar com o
professor Kirke e, durante uma brincadeira de esconde-esconde, Lúcia –
a caçula – descobre o guarda-roupas em um cômodo abandonado na casa do
professor.

A terra de Nárnia está amaldiçoada por Jadis. Esta Feiticeira Branca é
descendente de gênios e de gigantes. Vive num castelo com imensas salas
de gelo e tem um jardim com quase cem criaturas de pedra que ela
própria enfeitiçou. Mas tudo isso não é nada quando comparado com a
maldição que ela lançou sobre Nárnia: ser um lugar eternamente gelado,
sem outra estação que não seja o inverno.

No auge do seu reinado é feita uma profecia: o poder da feiticeira
acabará quando os quatro tronos do castelo Cair Parável forem ocupados
por dois filhos de Adão e duas filhas de Eva. E fica claro que esses
são os quatro irmãos anteriormente citados.

A relação entre esta profecia e a de Aragorn é tão perceptível que não
há como não lembrar que os dois autores eram amigos e compartilhavam de
muitas idéias em comum. Em ambas as predições a situação do ambiente em
que são realizadas é praticamente insustentável: o povo vive em
situação desesperada e assustada, a dominação cresce dia após dia e não
há ninguém, por mais corajoso e destemido, que consiga libertar o povo.
Há uma expectativa geral em busca das pessoas a quem fala a profecia,
mas uma frustração cada vez maior também por medo de a salvação nunca
chegar.

E é exatamente nestes contextos angustiantes que as profecias citadas
surgiram: não só para anunciar resgate e salvação, mas também para
incitar esperança no povo e despertá-lo para a luta quando a hora
chegar. Porque estas importantes pessoas preditas não podem salvar seus
respectivos mundos sozinhas, elas desempenham papéis extremamente
importantes – sim – mas sua maior função é ser símbolo de esperança e
líder na derrota do adversário. Este é o verdadeiro símbolo da realeza:
servir ao povo e assumir este cargo apenas por extrema necessidade, e
não para conquistar benéficos ou vaidades próprios.


Bem, por ora estas são as palavras que desejava expor. Como disse, há
muito assunto para ser discutido em apenas um artigo. É por isso que na
continuação deste artigo continuarei falando sobre profecias e
abrangerei novamente a predição feita para Aragorn, mas agora em
comparação com um livro que se passa nos nossos dias e em uma realidade
relativamente mais próxima: a famosa saga de Harry Potter.

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