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Minha palavra final sobre Orques e Gobelins

  • Criador do tópico Criador do tópico Imrahil
  • Data de Criação Data de Criação
A treta sobre o uso de termos como Orques e Gobelins nas novas edições da obra de Tolkien, publicadas pela editora HarperCollins Brasil, voltou com toda a força nos últimos dias. Eduardo Oliferr, do site Tolkien Brasil, que já tinha escrito uma série monumental (embora profundamente equivocada; stay tuned) de artigos sobre o tema condenando as novas traduções, iniciou uma verdadeira campanha em sua página do Facebook, conclamando outros fãs a manifestar sua contrariedade e praticamente exigindo que a editora altere os termos. Há uma ameaça mal-disfarçada de boicote no ar.

Bem, como vocês sabem, eu sou parte interessada nessa história. Sou o tradutor de A Queda de Gondolin, O Silmarillion e O Hobbit e membro do Conselho de Tradução da HarperCollins Brasil junto com os colegas tradutores Gabriel Brum (também aqui da Valinor) e Ronald Kyrmse. Creio firmemente, porém, que temos argumentos muito bons do nosso lado. E me parece claríssimo que a análise feita pelo Eduardo é parcial, enviesada e, em última instância, errada. Abaixo, explico o porquê disso ponto a ponto, aproveitando para citar várias críticas ou dúvidas das pessoas que estão atacando as novas traduções.

1)“Tolkien odiava/não aceitava adaptações fonéticas de qualquer tipo nos termos de suas obras”

Isso é, no máximo, sendo muito generoso, uma meia-verdade. O problema é tomar como verdade absoluta uma “fotografia” de UM momento específico citado nas Cartas de Tolkien, nos anos 1950, e extrapolar isso pra todos os lugares e todas as épocas em que foram feitas traduções da obra tolkieniana.

Não sei se vocês sabem, mas Tolkien era… gente. Um ser humano, que mudava de ideia, negociava, avançava e recuava, esquecia as coisas. Isso tem de ser levado em consideração.

Sim, Tolkien ficou chocado quando tradutores holandeses e suecos, nos anos 1950, resolveram traduzir ou adaptar a nomenclatura inglesa do Condado e dos nomes dos hobbits. A primeira reação dele foi vetar tudo, e aí teremos edições totalmente anglicizadas por aí. Mas lentamente ele foi levando em consideração que suas obras são, em tese, supostas traduções de manuscritos antigos em línguas que não têm nada a ver com o inglês, e que, portanto, tudo o que está em inglês – segundo essa teoria – seria “traduzível” ou adaptável foneticamente, em alguma medida.

Ele continuou meio infeliz com a ideia num nível visceral, mas sabia que era o certo a fazer.

E ele próprio sugere a possibilidade de adaptações ortográficas e fonéticas na Nomenclatura de O Senhor dos Anéis, documento que preparou para os tradutores nos anos 1960. Dois exemplos claros são os nomes Sharkey (o apelido de Saruman, traduzido como Charcote na edição da Martins Fontes) e Maggot, sobrenome do fazendeiro Magote.

Sobre Sharkey, Tolkien escreve: “A palavra, portanto, com uma modificação de ortografia para se adequar à LT [língua de tradução]; a alteração do sufixo diminutivo e quase afetuoso –ey para se adequar à LT também seria adequada”. Daí “Charcote” (a terminação lembra “mascote”, “filhote” em português).

Eis um trecho do verbete sobre Maggot: “A ideia é que seja um nome ‘sem significado’ (…) provavelmente é melhor deixá-lo intacto, embora alguma assimilação ao estilo da LT também fosse adequada”. Isso explica a remoção do “g” duplo e a vogal no final em “Magote”.

(Aliás, notem o “provavelmente”. Tolkien sabia que o trabalho de tradução comporta incertezas e soluções que variam – diferentemente de alguns de seus fãs…)

2)Mas ele jamais permitiria esse tipo de coisa com as palavras mais importantes de sua obra!!!

Errado. Um dos volumes da obra “The J.R.R. Tolkien Companion & Guide”, obra de referência organizada por Christina Scull e Wayne Hammond, mostra Tolkien totalmente aberto a negociar mudanças sutis e mesmo brutais para o termo “hobbit”. Sim, “hobbit”.

Em 1962, a editora Fabril, de Buenos Aires, estava negociando a publicação de uma tradução de O Hobbit, e Tolkien disse o seguinte: “Numa língua latina, o termo ‘hobbits’ parece horroroso e, se eu tivesse sido consultado antes, teria concordado imediatamente com alguma naturalização da forma: p. ex. ‘hobitos’, que combina melhor com ‘elfos’, palavra adotada há muito, além da boa sorte de conter o sufixo normal diminutivo do espanhol [-ito, no caso].”

A editora chegou a propor ‘jobitos’, uma vez que, como em português, o “h” do espanhol é mudo, enquanto o “j” do castelhano é aspirado. Tolkien disse que preferia “hobitos” e acrescentou que muitos hobbits provavelmente abandonavam o “h” aspirado no começo das palavras, tal como os camponeses da Inglaterra. Ou seja, alguns hobbits diziam ser “óbits”!

Em outra negociação, desta vez em 1968, com a editora francesa Editions Stock, a empresa propôs alterar “hobbit” para “hopin” porque “hobbit” parecia um palavrão francês (eles não dizem qual). Tolkien fez birra, jogou-se no chão e chamou os franceses de bobos, feios e chatos. Né?

Não. Tolkien embarcou na ideia.

“De qualquer modo, ‘hopin’ me parece uma solução apropriada e engenhosa: ‘hopin’ está para ‘lapin’ [“coelho” em francês] assim como ‘hobbit’ está para ‘rabbit’ [“coelho” em inglês].” Para quem não se lembra, essa comparação entre hobbits e coelhos aparece várias vezes no livro. Ele só pediu para os ilustradores não desenharem Bilbo com cara de coelho por causa disso.

Mas fiquem tranquilos – estamos sendo conservadores e não vamos mexer em “hobbit”. Mais conservadores que o próprio Tolkien, pelo visto…

3)Ah, mas nenhuma tradução europeia acabou seguindo essas ideias. Dois grandes especialistas em Tolkien também são contra elas. Vocês querem saber mais que eles?

Verdadeiro, porém irrelevante. Esse raciocínio parte de uma visão binária: se a nossa escolha de tradução é boa, a deles é ruim, e vice-versa.

Bom, em tradução isso é relativamente raro. A não ser que a gente estivesse errando o significado ou o tom de uma palavra (trocando um termo formal por gíria, por exemplo), não existe 100% errado ou certo nessa área. O que existe são ESCOLHAS que podem ser defensáveis ou não, por diferentes motivos.

Manter o termo original é defensável? Totalmente. Ligeiras adaptações ao estilo da língua de tradução são defensáveis? A resposta, como o próprio Tolkien deixou entrever, também é SIM.

Ah, e só pra arrematar, isso é, no fundo, argumento de autoridade. Ou seja, uma falácia lógica.

4)Vocês não estão traduzindo, estão só inventando palavra!

Bom, não sei se vocês sabem, mas palavras são inventadas o tempo todo. Tipo “futebol”, “upar”, e “shippar”. Isso normalmente acontece quando a língua de tradução não tem equivalentes considerados precisos para o termo designado na chamada língua de partida (o idioma original).

“Duendes”, em português, são entidades com associações fofinhas e naturebas que não dão conta dos “goblins” de Tolkien – daí a opção por “gobelim/gobelins”. Quanto a “Orc”, nunca tivemos uma palavra que sequer se aproximasse em sentido ou tom no nosso idioma.

A opção mais lógica é abraçá-las como neologismos – desde que a adaptação fonética necessária seja feita. Aliás, no caso de “Orc” a adaptação fica na fronteira entre o fonético e o gráfico. Ou você conhece algum brasileiro que pronunciasse “Orc” de um jeito que não soasse como “Orque” (aliás, “orqui”, né)?

5)O próximo passo vai ser “robitos” e “Tomás Bombadinho”! É um absurdo!

Temer essa possibilidade é simples falta de atenção com a maneira como temos trabalhado. As mudanças só afetaram essas palavras porque elas não foram criadas por Tolkien nem são nomes pessoais, mas estão em uso na língua inglesa faz tempo e, portanto, podem ser pensadas como substantivos comuns “adaptáveis”. E, de novo, Tolkien ressalta que o importante é o SOM de “Orc”, não a grafia.

Aliás, nota de rodapé: “hobbit” também tinha registro em certos compêndios antes da obra de Tolkien, mas parece que era o termo usado para falar de um ente sobrenatural que não tem nada a ver com Bilbo e companhia. Para todos os efeitos, faz mais sentido tratá-la como invenção de Tolkien e, portanto, mais “intocável”.

6)Mas gobelim é nome de tapeçaria!

Meia-verdade, mas irrelevante. Na verdade o termo preferido pelos dicionários, como o Houaiss, é “gobelino”.

Mas e daí? Será que, a esta altura do campeonato, preciso mesmo apresentar a alguém supostamente tão douto quanto o Eduardo o conceito de homófono e homógrafo?

“Pena” pode ser de galinha, de dó ou de tempo passado na prisão. Isso por acaso faz a palavra ser proibida em português? De mais a mais, quantas pessoas com nível superior que você conhece vão imediatamente gritar “tapete!” quando você diz “gobelim”?

7)Vocês estão fugindo do debate!

Parafraseando Bilbo, parece que tem gente que sabe mais do que acontece dentro da minha própria casa do que eu mesmo (ou da casa dos demais membros do Conselho de Tradução).

O convite para o debate veio em janeiro, o mês em que eu tenho duas crianças pequenas de férias em casa o dia todo, quando eu também preciso trabalhar como repórter, atualizar meu blog (que sou pago pra fazer), escrever meu próprio livro (que tá atrasado…), traduzir O Hobbit, cozinhar, arrumar a casa, cuidar das porquinhas-da-índia… e eu ainda não defini data pra debater com o rapaz porque estou com medo. Então tá.

Debato com a maior tranquilidade – quando eu tiver tempo, e quando houver honestidade intelectual e um mínimo de cortesia pra debater. Nem um minuto antes disso.

Essa história toda me lembra a obra do psicólogo Jonathan Haidt sobre como as decisões humanas são tomadas. Ele resume os achados dele da seguinte maneira: “As intuições vêm primeiro, o raciocínio estratégico vem depois”.

A estranheza inicial de “Orques” e “Gobelins”, a “feiura”, fez com que intuitivamente muita gente achasse que as traduções estavam erradas. Correram, então, atrás de todo tipo de argumento para tentar justificar racionalmente essa intuição.

Faltou, porém, olhar os argumentos por todos os lados possíveis. Tudo bem você achar as palavras feias ou, em termos tolkienianos, “pouco eufônicas”. Tudo bem você achar que outra solução seria melhor. Mas dizer que as nossas opções estão “erradas” e “contrariam Tolkien” não é opinião, meu amigo. É puro autoengano.

E agora, se vocês me dão licença, tenho de entregar a tradução de O Hobbit até o dia 10 de fevereiro.
 
Olá. Vou ressuscitar essa discussão, pois estou interessado. Antes uma breve apresentação.

Primeiramente queria dizer que eu fui um usuário relativamente assíduo do fórum da Valinor anos atrás. Li o Senhor dos Anéis pouco antes do primeiro filme chegar aos cinemas e logo comecei a frequentar o fórum. Com o passar do tempo, as coisas mudaram, a vida mudou e esse fórum ficou para trás (embora as boas lembranças tenham permanecido). Eu estava aqui quando começou a força-tarefa para achar todas as lacunas na tradução do Senhor dos Anéis.
Eu não faço a menor ideia de como era meu login e muito menos a senha rs. Então eu resolvi fazer uma nova conta.

Como disse antes, li o Senhor dos Anéis tempos atrás e fiquei encantando. Naturalmente fui atrás de outras obras de Tolkien e li todas as que estavam disponíveis no Brasil: O Hobbit, O Silmarillion e Contos Inacabados. Alguns anos depois eu li um bom pedaço do Silmarillion em inglês, mas não conclui a leitura. Mas me lembro que deu pra notar como o texto em inglês parecia ser mais complicado que sua versão em português. Imaginei que era por inabilidade minha na língua inglesa. Depois disso eu fui ampliando meus horizontes literários e confesso que Tolkien ficou meio de lado. Lembro vagamente da polêmica da tradução do termo "ananos" mas eu já estava indo em outra direção. Passei batido por todos os outros lançamentos da obra tolkeniana lançados pela Martins Fontes. Sempre pensava em voltar ao autor, mas acaba fazendo outras coisas, lendo outras coisas e não aconteceu.

Daí veio a Harper Collins, novo projeto, novas traduções... Um bom incentivo. Ainda mais considerando que seria uma ótima oportunidade para finalmente traduzirem o Senhor dos Anéis sem cortes!

Vi a nova polêmica da tradução de alguns termos. Li os argumentos contrários (em uma leitura BASTANTE dinâmica dos textos do Eduardo, pq né?) e li os argumentos dos tradutores. Achei que era válida a discussão, mas achei que o tom dela estava ridículo. Não dei muita bola.

Comprei algumas das novas edições dos livros, no entanto ainda não li nenhum (mas Tolkien já está encaixado na fila de leituras, para breve eu espero rs).

Recentemente me deparei mais uma vez com as polêmicas/discussões/histerias sobre as traduções. E dessa vez tinha um adendo: "não são apenas os termos escolhidos. As traduções estão cheias de erros". Busquei quais seriam esses erros, e depois de algumas horas de busca eu só achei um exemplo: o já famoso irmãos/filhos de Finarfin da página 171 de O Silmarillion. Olhei minha edição e de fato está errado. Procurei mais relatos de outros erros e tudo que encontrei foi um vago "vários outros erros".
Desconfiei bastante disso, pois sei da seriedade dos tradutores (evidentemente já conhecidos).

Bom, depois desse LONGO prolegômeno, vamos ao que me interessa perguntar/comentar:

1) Apresentaram algum outro relato de erros das novas traduções? Pq tudo que achei foi o erro mencionado. No meu entendimento um erro é perdoável, é claro. Acontece.

2) Só eu fiquei (mais uma vez) chocado com o tom das discussões sobre esse assunto? É tudo muito dramático, histriônico, desesperado. Devo dizer que beira o comportamento adolescente. Alguém imagina uma discussão sobre traduções nesse tom entre leitores de Joyce ou Proust ou a maioria dos autores mais cascudos? O único caso semelhante que vi foi sobre a tradução de Paulo Bezerra de Os Demônios do Doistoiévski. Mas nesse caso há a polaridade política no meio, então já era o esperado. Enfim, fiquei com uma péssima impressão do público brasileiro tolkeniano (minhas recordações não eram essas, estaria eu errado?), bastante infantilizado. Não foi possível evitar pensar naquele velho preconceito da "literatura séria" contra obras/público de fantasia e similares.

Não sei se é um tema sensível aqui, mas achei que seria interessante abordar essa questão por aqui. Sinto pelo longo post...
 
Ué, você esperava o que da internet? Na internet, onde estão hoje reunidos os leitores de "autores mais cascudos"? Pelo que sei não estão, porque Tolkien é autor popular, e a maioria dos "autores mais cascudos" não são.
 
Ué, você esperava o que da internet? Na internet, onde estão hoje reunidos os leitores de "autores mais cascudos"? Pelo que sei não estão, porque Tolkien é autor popular, e a maioria dos "autores mais cascudos" não são.

É verdade, eu pensei nisso também. Afinal de contas, é a internet. Mas sei lá, eu tinha uma lembrança de discussões tolkenianas tão civilizadas por aqui. Realmente me assustei um pouco. Parece até leitores de DC e Marvel (sem querer falar mal dos quadrinhos).

Leitores de "autores mais cascudos" não estão em fanpages, de fato, mas isso não significa que não usem a internet. Lembro de boas discussões sobre tradução no blog da Denise Bottmann, p.ex. Quando Caetano Galindo publicou sua versão do Ulisses vi discussões comparativas entre as três edições, aqui e ali. Enfim, são mais espalhadas e escassas, mas dá pra achar alguma coisa
 
Blog eu nem contaria como uma "discussão", e sim como um produtor de conteúdo munido de audiência capaz de dar algum feedback, é uma relação um tanto quanto assimétrica. Aí sim o nível tende a ser maior. Quanto menos popular o assunto tende a ser, mais esse formato tende a ser prevalente. Já se o assunto é popular, como política, cinema, etc. o modelo de discussão é (ou pode ser) mais "simétrico": o produtor do conteúdo não é bem definido, e há réplicas, tréplicas, etc, aí bagunça mesmo e a qualidade se perde. É isso que aconteceu com a questão dos "orques".

Mas enfim, fora do episódio do Eduardo Stark, o fandom de Tolkien tem sido relativamente civilizado sim, especialmente na Valinor. Justamente porque Tolkien tem sido cada vez menos popular e acaba prevalecendo um modelo mais assimétrico de discussão, baseado ou na resolução de dúvidas ou em textos postados por usuários. Não lembro de nenhuma polêmica ou rusga fora a questão dos "orques". Aliás, tinha bem mais rusgas nos anos 2000... Isso nas seções Tolkien né, já que a Valinor recebe um público com pouco ou nenhum interesse em Tolkien, aí o perfil é outro, há menos "produção de conteúdo" e mais "discussão" propriamente dita, e a Valinor difere menos da internet como um todo.
 
Última edição:
Não, não. Falo de discussão mesmo. O blog da Denise nem tem o intento de ser um blog sobre discussões de tradução. É um blog de memória da tradução (quem traduziu o que pra quem e quando) e, principalmente, de "vigília" contra plágios de tradução. Ela foi a "responsável" pela Martin Claret tomar um pouco de vergonha na cara. Mas algumas discussões acabavam surgindo às vezes, nos comentários, espontaneamente.

Mas lembrei de uma polêmica bem idiota sobre uma tradução de um autor não popular. Caetano Galindo (de novo rs) comentou em seu blog que pegou inspiração para a tradução de uma rima de um verso do T.S. Eliot em uma música do último disco do Gilberto Gil. Isso bastou para horrorizar um grupo de leitores no facebook, abismados com essa "contaminação" do popular brasileiro na imaculada obra eliotiana. Bem elitista e a cara desse país.

Mas estou fugindo do assunto, talvez.
 
Com relação ao ponto 2 eu procuro dar um bom desconto, porque existe uma ideia romântica de que a academia e o mundo profissional sejam sempre um exemplo de "lords ingleses" no trato das questões. Mas todos são humanos e autores consagrados podiam ser também influenciados, loucos, doentes (doentios) e até criminosos, não raro ainda hoje tem tiroteio de um autor contra outro na Rússia. Mas como escreviam bem o público apreciava a produção.

Quer dizer, não é incomum que o próprio meio editorial e as próprias universidades (justo os especialistas que muitas vezes discordam ferrenhamente) sejam objetivamente a fonte de arranca-rabos e que o fandom comum (blogs, colunas opinativas, etc...) sejam os mais visados na culpa disso. Porque tem horas que as vezes o povo pega fogo mesmo, o próprio Tolkien foi para a guerra e não usou a via diplomática (que por vezes não é mesmo uma opção).
 
Com relação ao ponto 2 eu procuro dar um bom desconto, porque existe uma ideia romântica de que a academia e o mundo profissional sejam sempre um exemplo de "lords ingleses" no trato das questões. Mas todos são humanos e autores consagrados podiam ser também influenciados, loucos, doentes (doentios) e até criminosos, não raro ainda hoje tem tiroteio de um autor contra outro na Rússia. Mas como escreviam bem o público apreciava a produção.

Quer dizer, não é incomum que o próprio meio editorial e as próprias universidades (justo os especialistas que muitas vezes discordam ferrenhamente) sejam objetivamente a fonte de arranca-rabos e que o fandom comum (blogs, colunas opinativas, etc...) sejam os mais visados na culpa disso. Porque tem horas que as vezes o povo pega fogo mesmo, o próprio Tolkien foi para a guerra e não usou a via diplomática (que por vezes não é mesmo uma opção).

Bom, ressalto que não tenho nenhuma visão romântica sobre a academia como um reduto de "lords ingleses", até pq eu fiz mestrado e doutorado, passei muito tempo nesse meio e sei como a coisa funciona.

Apesar de achar que é válida a discussão sobre as traduções de termos e sua adequação aos desejos do autor e, muito mais importante, a discussão das qualidades de qualquer tradução, eu sinto que falta maturidade na discussão. Só eu tenho a sensação de que a maior parte dos "revoltados" não está muito interessada em questões de tradução e sua adequação ao que pensava Tolkien, mas simplesmente estão incomodados com a diferença dos termos ao já consagrado? É claro que o "ficar incomodado" e o "desgostar" são sentimentos legítimos, mas não é basicamente assim que a questão tem sido exposta. E por mais legítimos que esses sentimentos sejam, ainda assim me parece imaturidade transformar isso numa querela histriônica. Nem tanto a discussão em si, mas o tom.
 
Enfim, fiquei com uma péssima impressão do público brasileiro tolkeniano (minhas recordações não eram essas, estaria eu errado?), bastante infantilizado. Não foi possível evitar pensar naquele velho preconceito da "literatura séria" contra obras/público de fantasia e similares.

A impressão só existe porque quem está fora do meio tolkieniano acaba vendo a minoria barulhenta, não uma representação equilibrada dos leitores. Nesses quase dois anos desde o anúncio das novas traduções, há um consenso entre tolkiendili de que as traduções estão (1) certas, (2) corretas e (3) melhores que todas as outras que já tivemos no passado (eu usei essa frase num evento de lançamento do Hobbit para tirar umas risadas do público). Tanto que o único (até o momento) erro real que apontaram eu (como leigo metido) nem considero como um erro de *tradução* -- erros de edição, afinal, pipocam toda vez que qualquer texto não-trivial é reeditado (e isso inclui todos os livros do Tolkien nas edições originais!).

Outra consideração é sobre onde as opiniões que deram essa impressão foram publicadas: fóruns incentivam diálogo, posts detalhados, troca de informação, discordância saudável e críticas bem fundamentadas. Sensacionalismo, polêmica rasa, bait e rage-clicks não funcionam aqui, não temos um algoritmo dando visibilidade a um post ou usuário em função de uma métrica de engajamento ou coisa assim. É um modelo oposto ao do Facebook/Twitter/Youtube/etc., que incentivam opiniões rasas, lançando usuários a uma corrida ao mínimo, ao sensacional e ao polêmico, tudo com o menor esforço possível para ganhar o maior número de likes/rts/views/etc. Quem acompanhou isso pelo Facebook, por ex., viu raivosinhos martelando insistentemente os mesmos pontos sem nunca trazer nada de novo, porque ser truculento dá engajamento (eu estou resistindo a fazer um paralelo com discussões políticas no FB, mas pior que o mecanismo de ação é o mesmo).
 
A impressão só existe porque quem está fora do meio tolkieniano acaba vendo a minoria barulhenta, não uma representação equilibrada dos leitores. Nesses quase dois anos desde o anúncio das novas traduções, há um consenso entre tolkiendili de que as traduções estão (1) certas, (2) corretas e (3) melhores que todas as outras que já tivemos no passado (eu usei essa frase num evento de lançamento do Hobbit para tirar umas risadas do público). Tanto que o único (até o momento) erro real que apontaram eu (como leigo metido) nem considero como um erro de *tradução* -- erros de edição, afinal, pipocam toda vez que qualquer texto não-trivial é reeditado (e isso inclui todos os livros do Tolkien nas edições originais!).

Outra consideração é sobre onde as opiniões que deram essa impressão foram publicadas: fóruns incentivam diálogo, posts detalhados, troca de informação, discordância saudável e críticas bem fundamentadas. Sensacionalismo, polêmica rasa, bait e rage-clicks não funcionam aqui, não temos um algoritmo dando visibilidade a um post ou usuário em função de uma métrica de engajamento ou coisa assim. É um modelo oposto ao do Facebook/Twitter/Youtube/etc., que incentivam opiniões rasas, lançando usuários a uma corrida ao mínimo, ao sensacional e ao polêmico, tudo com o menor esforço possível para ganhar o maior número de likes/rts/views/etc. Quem acompanhou isso pelo Facebook, por ex., viu raivosinhos martelando insistentemente os mesmos pontos sem nunca trazer nada de novo, porque ser truculento dá engajamento (eu estou resistindo a fazer um paralelo com discussões políticas no FB, mas pior que o mecanismo de ação é o mesmo).

O vídeo de hoje do Reinaldo sobre a polêmica da Tatiana Feltrin e Silmarillion me fez lembrar desse tópico. Fiquei surpreso ao notar que eu não tinha visto sua resposta. Por algum motivo não vi a confirmação de email de que tinha uma nova resposta (não é meu email principal, talvez por isso).

Gostei bastante de sua resposta. Seu segundo parágrafo é extremamente verdadeiro. O meio é fundamental para isso. E é inegável que esses meios são, há algum tempo, os principais locais agregadores de público, infelizmente.

Talvez eu tenha sido injusto com o público tolkieniano de forma geral. No entanto, como o autor e seu universo têm um apelo grande dentro da cultura nerd ou geek ou seja lá que nome queiram dar, ainda acho que há alguma verdade na minha impressão. Ainda acho que boa parte desse público é bastante superficial e infantilizado, mesmo que orbitando obras bem mais densas como a de Tolkien. Mas por mais que Tolkien atraia esse público, não está restrito a ele. Há diversidade.
 
As paginas do Tolkien Brasil fizeram uma verdadeira guerra com essas traduções.
Recentente usaram um recorte de um video da Tatiana Feltrin para por mais lenha na fogueira imaginária deles.
Bem, não sei se tem um tópico para esse debate a respeito do video que ela postou sobre a tradução do Silma pela HCB, e a resposta que o Reinaldo deu a ela.
Segue o link da crítica da Feltrin: aqui
Resposta do Reinaldo aqui e aqui
 
Ela criticou bastante o uso da expressão "ter lugar" como "acontecer", "ocorrer". Reinaldo respondeu bem, mencionando texto do Brasil Império... Mas não precisava ter ido tão longe, todo mundo que está familiarizado com alta literatura contemporânea decerto já encontrou a expressão durante a leitura indispensável dos...

...posts do Haran Alkarin no fórum Valinor. Já usei a expressão aqui, aqui e aqui, por exemplo. Daí a importância de ler os meus posts...
 
Última edição:
Desculpem se isso já estiver respondido em algum dos vídeos, mas tem um detalhe que eu fiquei sem entender. Quando me disseram que as novas traduções tinham optado por Noldoli em lugar de Noldor, eu deduzi que tinham adotado a estratégia de uniformizar os termos e expressões em Quenya e Sindarin de acordo com as últimas correções de Tolkien, que mudava de opinião muitas vezes; uma espécie de atualização de todos os textos: como eles provavelmente ficariam se Tolkien tivesse escrito todos eles no final da vida. Achei uma excelente ideia. Mas aí me lembrei que em A Queda de Gondolin o texto preserva os "gnomos" do texto original, o que seria contraditório com essa estratégia de atualização. O que motivou cada uma dessas opções?
 
Provavelmente é Noldoli no original também...
Não me lembro dessa construção na tradução antiga. A não ser que a Martins Fontes tenha decidido que Noldor era melhor que Noldoli em qualquer situação...

Só para esclarecer melhor: pelos comentários, eu entendi que a nova tradução separou os devidos usos: Noldoli para falar do povo noldo (-li plural partitivo) e noldor para mais de um noldo (-r plural normal). Foi isso mesmo?
 
Última edição:
No The Silmarillion original não aparece "noldoli", então esse papo tá estranho. Acho que devem estar confundido a tradução de O Silmarillion com a tradução de A Queda de Gondolin ou de outros livros, como o Neithan fez na página anterior...
 
Pelo que me lembro d'A Queda de Gondolin, foi utilizado Noldoli para todos (povo e indivíduos) nos textos que utilizavam esse termo, e Noldor nos textos que Tolkien utilizou Noldor. Não houve unificação.

Tanto que no primeiro texto do livro, aquele em que Tuor encontra Ulmo no Sirion, é utilizado noldoli todas as vezes. Já no segundo grande texto, em que Tuor encontra Ulmo no mar (e não no Sirion como da primeira vez), é utilizado noldor todas em vezes também.
 
Confirmei agora, ele estava falando do prólogo de A Queda de Gondolin. Então nesse aspecto a tradução só deve ter reproduzido o original mesmo.
 
Primeiramente, eu quero dizer que não postei aqui, antes, porque estou de pleno acordo com as escolhas feitas pelo Reinaldo para a tradução. A mim, orques e gobelins nunca incomodou. E, embora eu ainda não tenha comprado a nova edição do Silma (que é meu livro preferido do Professor), já quero, muito, essa edição.

Só vou colocar isto aqui para satisfazer a curiosidade das pessoas e pedir que vocês me ajudem a entender: o que motiva isso? Assim, sério. A meu ver, se as pessoas não conseguem lidar com as palavras utilizadas nas novas traduções, não compram essas edições, e seguem com a vida. Mas sinto que essa insistência em transformar escolhas de tradução em erro seja uma necessidade desesperada de estar certo.

Página Tolkien Brasil disse:
Foram feitos pedidos de esclarecimento sobre por que achamos erros nas traduções da Harper Collins Brasil. Como foram vários fizemos essa tabela para ficar evidenciado. Segue abaixo a tabela com as duas regras dadas pelo Tolkien em seu GUIA PARA TRADUTORES e que foram ignoradas completamente pelos tradutores brasileiros. Eles simplesmente pegaram as palavras em francês "Orque" e "Gobelim" e substituiram (o que não é tradução e não foi colocado como regra pelo Tolkien).
Na tabela estão as regras ditas pelo Tolkien no guia e como tradutores de países de línguas parecidas com a nossa traduziram. Será que todos os tradutores estrangeiros erraram e só os 'iluminados' da HarperCollins Brasil acertaram?
Todos os livros da HarperCollins Brasil estão vindo com esses erros evidentes e que desrespeitam a vontade do autor e é nosso dever esclarecer para todos vocês e não ficar preocupando com parcerias, como outros fazem.
#tolkien #ohobbit #osenhordosaneis #hobbit #tolkienbrasil

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