Eu comparo a ópera com a relação que eu tenho com instrumentos de sopro.
Meu pai, antes de ir dormir, escolhia algumas fitas K7, de música clássica com ópera, e entrava no quarto para escutar baixinho até pegar no sono.
Na época eu era pequeno, mas era possível notar que eram músicas que evocavam impressões emocionais específicas por meio de sons. As fitas me pareciam bastante complexas e eu permanecia pensando naquilo que o(a) cantor(a) se esforçava com tanta energia para exprimir.
Porque as vezes aquelas vozes traziam sofrimento, em outras vezes traziam suavidade, pressa, fúria...
Então por causa de certas partes vocalizadas das músicas, toda semana eu partia para aulas de coral na escola e na igreja e eu gostava de ouvir, comparando os sons das aulas de flauta que eu já gostava antes de ter ouvido as música de cantores de ópera.
Afinal, a flauta e a voz humana são parentes na origem porque dependem do sopro para produzir o som (que é diferente do ruído involuntário). Ambos são instrumentos de sopro.
Resultou disso que a complexidade da passagem do ar me fascinava. Por exemplo, sabe-se que a voz humana é um dos primeiros sons de comunicação que o bebê recebe de modo que se espalha com muito mais força no corpo das pessoas do que instrumentos comuns.
No que uma voz pode ser um bálsamo numa hora de tristeza mas pode ser muito desagradável se for produzida de forma errada. E há a possibilidade de ser totalmente negativa ou totalmente positiva.
Teve um artista japonês que falou que procurava modular a intensidade de uma obra visual pelo impacto que os olhos de uma pessoa podem ter em um desenho. Nos olhos habitava uma expressividade mágica capaz de imprimir tanto o maior terror quanto a maior benção que se pode produzir.
E na música é a mesma coisa porque o compositor não apenas desenha sons para serem ouvidos, mas que sua melodia seja também capaz de arrancar uma vontade sobrenatural de quem escuta.
Por exemplo, alguns dizem que Mark Knopfler consegue fazer a guitarra dele chorar. Procurem por "Brother in Arms" e é como se a guitarra estivesse chorando enquanto declama uma poesia.
Não a toa os corais são associados a anjos cantando no céu (como os Ainur de Tolkien). Um dos companheiros mais próximos dos instrumentos de sopor são as cordas (por exemplo, a harpa) A voz humana possui um poder que pode curar ou pode adoecer quem a ouve:
King's College Choir - Jesus Christ is risen today