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As Vinhas da Ira (John Steinbeck)

Lucas_Deschain

Biblionauta
[size=medium][align=center]As Vinhas da Ira (John Steinbeck)[/align][/size]

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The Grapes of Wrath (br / pt: As Vinhas da Ira) foi um livro publicado pelo escritor norte-americano John Steinbeck, no ano de 1939.
Por essa obra, Steinbeck recebeu o Prêmio Nobel de Literatura no ano de 1962.
Relata a história de uma família pobre do estado de Oklahoma, que durante a Grande Depressão de 1929 se vê obrigada a abandonar as terras que ocupava havia décadas, em regime de meeiros, devido à chegada do progresso, traduzido pela compra de tractores e máquinas pelos donos dessas, e de um novo regime de propriedade. Este factor tornou obsoleto o trabalho manual de aragem e plantio da terra, e forçou-os a rumar em direção à Califórnia.
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Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/As_Vinhas_da_Ira

[align=justify]Acabei de ler sexta-feira e não pude deixar de lembrar do Aluísio Azevedo enquanto lia, pela forma como ele conduz a narrativa, sempre fluida e dinâmica sem que com isso ele suprima as descrições precisas que estão presentes em cada página do livro. Quero ver o que os outros têm a dizer para que depois exponha mais meus pontos de vista.[/align]
 
Eu gostei muito de "Vinhas da Ira". A maior parte dos capítulos, mesmo com um narrador em terceira pessoa, tem a família Joad como foco, e vamos acompanhando cada uma das situações que eles enfrentam desde a tragédia com o "Dust Bowl" (temporada de tempestades de areia de 30 a 35), passando pela fuga para a Califórnia, até a adaptação a um ambiente em que eram tratados como bichos caipiras. Nisso tudo, como o Steinbeck ressalta a dignidade da família, a luta deles contra as circunstâncias acaba se tornando algo heróico. No final eu já estava tão afeiçoado a eles que só torcia para que acabasse bem...

Além disso, os demais capítulos procuram explorar perspectivas diferentes ou que apresentem um panorama mais amplo. Esses também são excelentes, muito engenhosos e às vezes cheios de lirismo. Lembro daquele em que se discute como esses descendentes dos pioneiros da colonização do Oeste, acostumados a resolver certas desavenças na bala, sentem-se perdidos ao lutar contra o "Banco", um monstro com muitos membros, mas nenhum deles vital. Ou do capítulo que se passa em um restaurante de beira de estrada, onde se torce pela chegada dos cadillacs e não de mais um daqueles caminhões improvisados cheios de gente e cacarecos.

Alguém chegou a assistir ao filme? Foi feita uma adaptação já em 1940, e parece ser muito bom também, uma das melhores notas do IMDB.

E só por curiosidade, vejam essa foto de uma tempestada de areia no Texas em 1935:

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duststormmini.jpg
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Louco, não? :susto:

Fonte: Wikipedia
 
[align=justify]Pois é, Gigio. É uma narrativa cheia de tristezas e desavenças, tu acaba se afeiçoando e torcendo pela família Joad justamente por que só sucedem desgraças com eles. Tem partes que isso chega a dar nos nervos. Sem rigor técnico nem metodológico, digo que a obra tem grandes traços clássicos do Realismo e é permeada por um pessimismo, evidenciado no fim, aterrador. A dinâmica da narrativa, que acompanhava as migrações da família Joad é interesante, pois mostra como a crise de 29 afetou diferentes lugares, desde Oklahoma, daonde eles saem, até a Califórnia, onde querem chegar para colher pêssegos, uvas e frutas em geral. A penúria é vivenciada não só pelos Joads mas também por um sem-número de outras famílias que seguem o mesmo caminho que eles e que buscam melhores condições assim como eles.
Vou ir falando em partes sobre o que achei do livro, aí vamos discutindo aos poucos.
Outra coisa que me agoniou no livro além das desventuras dos Joads foi o preço das coisas e dos salários. Pode ser que eu esteja falando uma besteira, mas tendo uma noção superficial sobre a célebre crise, não é de se duvidar: Steinbeck faz isso propositalmente, ou seja, esses preços são fictícios; ou o perrengue econômico pós-crack da Bolsa de Nova York assumiu proporções tão assustadoras? Cinco cents por um caixote de pêssegos colhidos? Isso é realmente assustador.[/align]
 
[align=justify]Uma dust bowl é descrita no primeiro capítulo. Essa descrição, embora apareça em outros momentos do livro, ficou, na minha opinião, meio deslocada dentro do livro. Voltei e li novamente para compreender, e isso leva a pensar uma coisa: que essas condições climáticas, tomando como base a sequência em que aparecem no livro (em primeiro lugar), é como uma abertura do caminho de desolação e penúria que vamos seguir com a família Joad pelas páginas da história. Esses dust bowls explicam ainda porque o tempo inteiro (mesmo!) há pó, não importa onde estejam ou aonde vão, sempre há poeira.[/align]
 
Lucas_Deschain disse:
[align=justify]Sem rigor técnico nem metodológico, digo que a obra tem grandes traços clássicos do Realismo e é permeada por um pessimismo, evidenciado no fim, aterrador.
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Aterrador mesmo! Mas entendo que o livro teve uma intenção de denúncia quanto à situação daquelas pessoas, que o Steinbeck conheceu diretamente quando estava fazendo algumas reportagens para um jornal. Se ele terminasse de alguma maneira muito positiva, talvez as pessoas não alimentassem a mesma indignação, não?

O que você achou da última cena?

Quando a Rose alimenta um homem faminto com o leite que teria sido destinado ao bebê, natimorto. A princípio isso me deixou atônito, é algo muito forte. Mas considerando a situação limítrofe em que estavam, acho que o propósito da cena era mostrar que aquelas pessoas eram capazes de ainda assim trazer ajuda a um desconhecido.


Lucas_Deschain disse:
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Outra coisa que me agoniou no livro além das desventuras dos Joads foi o preço das coisas e dos salários. Pode ser que eu esteja falando uma besteira, mas tendo uma noção superficial sobre a célebre crise, não é de se duvidar: Steinbeck faz isso propositalmente, ou seja, esses preços são fictícios; ou o perrengue econômico pós-crack da Bolsa de Nova York assumiu proporções tão assustadoras? Cinco cents por um caixote de pêssegos colhidos? Isso é realmente assustador.[/align]

Realmente, era algo muito grave, se não se conseguia o suficiente nem para alimentar uma família... Na página do Wikipedia sobre a Grande Depressão, diz-se que: "A agricultura e as áreas rurais sofreram com uma queda de 60% no preço dos produtos agrícolas". Some-se o efeito do excesso da mão de obra disponível e considere-se que o dólar valia mais naqueles tempos, e o resultado parece mesmo ser esse famigerado 5 centavos...

Lucas_Deschain disse:
[align=justify]Uma dust bowl é descrita no primeiro capítulo. Essa descrição, embora apareça em outros momentos do livro, ficou, na minha opinião, meio deslocada dentro do livro.
[/align]

Concordo perfeitamente. Sabe que na verdade só me dei conta do significado do primeiro capítulo agora que fui pesquisar sobre o Dust Bowl? Talvez o Steinbeck tenha escrito muito sob a presunção de que todos os leitores teriam ideia da situação daqueles tempos. Deve ser difícil imaginar que sua obra vá ser eternizada... :dente:
 
Eu comecei a ler esse livro mas tive que parar. Não estava conseguindo me concentrar muito na leitura, e daí chegaram outros livros para resenhar e optei por deixar ele de lado mesmo. Não ía conseguir fazer uma boa leitura dele com a cabeça em outros lugares. Espero que não demore muito para eu poder terminá-lo. Do Steinbeck só A Leste do Éden, que amei, então lendo na hora certa, sei que vou gostar de Vinhas da Ira também.
 
Gigio disse:
O que você achou da última cena?
Quando a Rose alimenta um homem faminto com o leite que teria sido destinado ao bebê, natimorto. A princípio isso me deixou atônito, é algo muito forte. Mas considerando a situação limítrofe em que estavam, acho que o propósito da cena era mostrar que aquelas pessoas eram capazes de ainda assim trazer ajuda a um desconhecido.

[align=justify]Concordo contigo. Devido às condições completa e extremamente adversas que essas pessoas estavam vivendo, as medidas desesperadas foram tomadas, afinal, tendo como base as últimas páginas da obra, era realmente um caso de vida ou morte. Isso serve ainda como evidência de que Steinbeck tinha uma visão de vida como uma eterna tensão, cheia de agruras e desafios (inclusive à dignidade), provavelmente dessa aridez da vida venha o tom de protesto ou ao menos denúncia social da obra.[/align]

Gigio disse:
Realmente, era algo muito grave, se não se conseguia o suficiente nem para alimentar uma família... Na página do Wikipedia sobre a Grande Depressão, diz-se que: "A agricultura e as áreas rurais sofreram com uma queda de 60% no preço dos produtos agrícolas". Some-se o efeito do excesso da mão de obra disponível e considere-se que o dólar valia mais naqueles tempos, e o resultado parece mesmo ser esse famigerado 5 centavos...

[align=justify]Conversei com minha orientadora ainda há pouco e ela me confirmou que realmente, os preços que estão nos livros correspondem sim a realidade pós-Crise de 29. O próprio preço baixo que era pago pela produção e que fazia com que fosse economicamente mais viável destrui-la do que colhê-la (dar as multidões de famintos era uma alternativa, não realizada entretanto) mostra como a situação estava em proporções alarmantes. O livro é uma ótima maneira de conhecer o impacto da Crise de 29 na vida das pessoas em uma esfera mais micro, para que então passemos para um âmbito mais macro. A riqueza da obra de Steinbeck está em grande parte apoiada nesse pressuposto. Basta comparar aquela visão mais panorâmica que comumente se tem sobre a Crise, com números, fórmulas, resoluções governamentais, termos técnico-econômico-administrativos, para ver como a obra guarda uma riqueza enorme para sentir a manifestação do pior lado da superprodução e suas consequências.[/align]
 
[align=justify]24 de outubro de 1929. Até o final desse dia, essa data passaria a ser conhecida como a quinta-feira negra. Esse foi o fatídico dia em que a Bolsa de Valores de Nova York quebrou, o famoso crack que marcou o início da chamada Crise de 29 ou a Grande Depressão dos Anos 30. Mas o que essa crise econômica representou, cotidianamente, para as pessoas que não eram acionistas, empresários ou donos de grandes corporações?

O resumo dos livros didáticos não nos possibilita vislumbrar os desdobramentos mais perversos e seminais dessa crise. Acostumamo-nos, muitas vezes, a ver esse processo de cima, longinquamente, de forma técnica, através de termos técnicos e conceitos econômicos, o que deixa de lado uma parte considerável e importante dos efeitos da superprodução: o impacto cotidiano, nas populações que já não eram favorecidos antes dacrise, e que, após a quinta-feira negra, só viram suas condições piorarem.[/align]

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Para quem não quiser alugar e tiver acesso, vi que o Telecine Cult vai começar a passar o filme esse mês, dia 25 às 22h.

Os outros horários vão ser 27/07 às 19h35, 18/08 às 17h35 e 20/08 às 13h45.

Pela chamada pareceu um bom filme. Tenho o livro aqui, em uma das versões da Abril (dois volumes), mas devo confessar que tenho certo preconceito de autores estadunidenses (ainda mais do século XX) e por isso nunca o li.
 
obnóxio disse:
Pela chamada pareceu um bom filme. Tenho o livro aqui, em uma das versões da Abril (dois volumes), mas devo confessar que tenho certo preconceito de autores estadunidenses (ainda mais do século XX) e por isso nunca o li.

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Obnóxio, não sei se suas ressalvas são por conta disso, mas o Steinbeck, embora não integralmente, não apresenta uma visão favorável ao capitalismo e ao american way of life. Ainda mais nessa obra, que apresenta uma visão extremamente negativa sobre os desdobramentos dessa busca desenfreada pelo dinheiro etc. e tal. Se seu preconceito se deve a isso, pode ficar tranquilo, além de não-elogioso ele é ainda bem crítico.[/align]
 
Lucas_Deschain disse:
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Obnóxio, não sei se suas ressalvas são por conta disso, mas o Steinbeck, embora não integralmente, não apresenta uma visão favorável ao capitalismo e ao american way of life. Ainda mais nessa obra, que apresenta uma visão extremamente negativa sobre os desdobramentos dessa busca desenfreada pelo dinheiro etc. e tal. Se seu preconceito se deve a isso, pode ficar tranquilo, além de não-elogioso ele é ainda bem crítico.[/align]

Não sei. Tem a ver com isso. Eu não me considero o mais americanófilo dos brasileiros; acho o inglês uma língua feia; e as traduções sempre tem um quê de truncado, algo rançoso que não sei o que é.

Mas também sempre achei os "clássicos" do século XX menos clássicos e menos importantes que os clássicos "de verdade", não sei porque. Daí não gosto de (ou não me interesso por [sem nunca ter lido]) um Ernest Hemingway, um T. S. Eliot, um William Faulkner. Daí a coisa se espalha também (mesmo que não sejam estadunidenses) para um James Joyce e um George Bernard Shaw, por exemplo.

Claro que é burrice e provavelmente eurocentrismo meu... Então talvez seja bom dar uma chance para o Steinbeck.
 
[align=justify]É uma leitura bem agradável sem perder de vista uma preocupação social com os "outros" americanos que lhe rendeu galardões literários vários. Estou lendo agora A Pérola, que é a história de um índio mexicano, um protagonista não-convencional para muitas das concepções da época. Não posso dizer mais porque ainda não li o livro, comentei pela sinopse, quando terminar volto a comentar.[/align]
 
terminei de ler as vinhas da ira semana passada. um livro ótimo. mas preferi a primeira metade, enquanto a família joad tinha dignidade e sonhos. a segunda metade é apenas miséria sem fim

a narrativa deste livro é espetacular. ela é dividida tanto na descrição da jornada da família joad quanto de episódios paralelos. um livro cheio de coadjuvantes. sem contar que tem alguns capítulos que o narrador para de narrar a história pra entrar dentra da mente de outros personagens. uma hora se narra uma fase da viagem da família, em outra se escreve literalmente os pensamentos de um vendedor e as falas dele sem a respostas do interlocutor.

o tom joads, o protagonista, é um tipo muito altruísta, quase sem personalidade própria, e ainda assim é a personagem com a cabeça no lugar, mais pé no chão e prático do livro. me lembrei na hora do protagonista de um livro do neil gaiman, deuses americanos, o shadow, também um ex-presidiário.

não achei que o livro teve um desfecho. o final é chocante, mas não põe um ponto final na obra, e nem um ponto de ligação para uma continuação.

acho que o livro seria melhor se tivesse escrito mais sobre noah, o irmão de tom, e sobre casy, o pregador. sem contar que depois da metade do livro, se começa a discorrer menos sobre o outro lado, mais exatamente os californianos, os industriais e a polícia.

no final das contas, foi um livro ótimo pra se ler. agora vou partir para leste do éden
 
lhrodovalho disse:
no final das contas, foi um livro ótimo pra se ler. agora vou partir para leste do éden

[align=justify]Particularmente gosto mais de A Leste do Éden, até mesmo pela extensão da obra, abarcando gerações e fazendo um vôo mais sobre a "natureza" humana do que sobre as condições materiais do momento, como As Vinhas da Ira faz constantemente.

Quanto às conversas do vendedor de carros que tu citou, quando li fiquei pensando assim: alguém poderia ter escrito um As Vinhas da Ira mais urbano, né? Não que esse seja ruim ou que não aluda a cidade em algum momento, mas é que achei que desventuras pós-crise de 29 em um ambiente urbano poderiam ser uma boa. Fiquei imaginando, até me deu vontade de tentar rascunhar alguma coisa, não querendo dizer que me sinto preparado para tal empreitada, mas pelo menos deveria tentar...

Quanto aos personagens secundários que tu falaste lhrodovalho, concordo que o Steinbeck deveria ter falado mais sobre o Casey, que é o meu personagem predileto do romance. Ah, e sobre o Tom Joad e seu altruísmo, achei bem legal, pois funciona bem, já que ele é como um bastião da família, uma muralha quase inexpugnável para aquela família. É engraçado que ele se sobressai bem mais que o próprio pai, que, em tese, era o homem da família.

Ah, um detalhe que não sei se tinha falado aqui, mas a história de As Vinhas da Ira é baseada em fatos reais. Steinbeck, jornalista e repórter na época, foi contratado para investigar o caso de uma família que tinha saído da poeira (uma constante no livro todo) de Oklahoma, passado pela famosa rota 66, vivido em hoovervilles e morrido (ironicamente) afogados em algum lugar a leste dos Estados Unidos.

Acho um baita livro, consegue discorrer sobre a situação daquele momento em específico e alçar vôos bem interessantes em âmbito mais amplo, sobre a condição humana, a vida etc. (embora essa característica venha a ser mais trabalhada em A Leste do Éden. Depois de ler ele (A Leste do Éden) coloquei ele no meu top10)[/align]
 
o homem da família era a mãe. o pai joad foi perdendo a autoridade depois que a família começou a se desintegrar e ele não conseguia mais emprego. o principal defeito do pai era a raiva descontrolada. a mãe até aceitaria ser espancada, desde que o pai trouxesse comida pra casa. esse era o argumento que ela usava pra ser ouvida e dar a resolução final para os problemas familiares. sem contar, que como ela não fazia apenas atividades domésticas, não tinha como ela ser inferiorizada diante dos homens da casa. aliás, até as crianças trabalhavam.

a mãe também era altruísta. o único interesse dela era ter a família unida. o tio john era até bom, mas muito egocêntrico. achava que tudo que acontecia de mal era por causa dele. pior que nem deixaram ele desabafar. se o deixassem, talvez ele melhorava. a filha grávida só tinha olhos pra si mesma e o bebê. eles viviam numa miséria mas no mundinho dela havia tantos sonhos que ela estava completamente alienada da situação em que se encontravam. o noah, a ovelha negra da família, acho que ele se deu bem. pelo menos fome não deve ter passado. pena sua história não ter sido bem explorada. as crianças, aquelas lá eram umas pestes! dá até pra imaginar aqueles bichinhos imundos brincando na lama e tendo caganeira depois de engolir trocentos pêssegos. e os avós, se eles tivessem durado mais tempo, dariam um tom mais cômico a história. e eu pensando que a morte do avô em miss sunshine era algo original...

raramente houve algum traço urbano na história. mas teve. além da parte dos comerciantes, houve a parte dos turistas que foram pra califórnia, dando uma idéia de como os mais ricos se divertiam e eram infelizes. a parte escolar provavelmente também era urbana. e as favelas, sim, elas eram urbanas. mas eles ficaram pouco tempo no primeiro acampamento. e o acampamento do governo, com certeza tinha mais gente que muitos municípios brasileiros.

fico imaginando, que com essa história do steinbeck glorificar os acampamentos urbanos, com seus inúmeros comitês, poderia dar argumentos pros caçadores de bruxas que ele seria um vermelho

eu esperava mais do casy. pensei que quando ele voltasse, ele daria um grande discurso. o máximo que conseguiu foi explicar umas coisas pro tom joad. e depois, o tom joad não faz nada, só tenta sobreviver

depois de ter lido as vinhas da ira, passei a ter outra visão dos sem terra. e minha família é de fazendeiros. mas duvido que os sem terra passem fome. eles recebem cestas básicas do governo, e num tempo igual ao nosso, não tem mais como voltar às origens rurais. a população mais pobre estaria mais bem assistida nas cidades do que no campo
 
[align=justify]Depois que você falou da Mãe Joad me lembrei que ela realmente tem um papel todo especial na manutenção da família, mas mantenho minha opinião, o Tom Joad é a muralha da família, ele é a ponta da lança, a mãe parece ter mais a função de retaguarda mesmo, função de mesmo ou maior peso e importância em tempos tão difíceis como aqueles que os Joad passaram, né?

E quanto a acusação de vermelho que tu comentaste, ela é verdadeira. Estava comentando com minha orientadora e lendo uma biografia dele, daqueles que vem junto com fascículos das coleções da Abril; e sim, Steinbeck causou muita polêmica e foi sim acusado de comunista, subversivo e vermelho na época, principalmente depois de escrever Luta Incerta, em 1936 (estou para comprar esse livro na Estante Virtual pois não achei ele em biblioteca alguma que frequento), livro que fala sobre uma greve de trabalhadores agrícolas na Califórnia.

Minha orientadora disse que nesse cenário pós-crise e de extrema instabilidade, o terreno ficou bastante propício para manifestações, greves, movimentos reivindicatórios e levantes populares, de modo que uma extrema direita conservadora se ocupou em taxar de comunista a obra de Steinbeck, pelo tom de denúncia que ele fazia, já que estava escrevendo sobre o que ele via e vivia diariamente em sua condição de repórter e jornalista. É interessante, pois na época vários outros escritores se ocupavam de denunciar e mostrar as condições de penúria da população mais pobre, estando entre eles nomes como John dos Passos e William Faulkner. Até comentei isso no tópico do Steinbeck e fiquei de achar os títulos dos livros em português.[/align]
 
Lucas_Deschain disse:
Gigio disse:
O que você achou da última cena?
Quando a Rose alimenta um homem faminto com o leite que teria sido destinado ao bebê, natimorto. A princípio isso me deixou atônito, é algo muito forte. Mas considerando a situação limítrofe em que estavam, acho que o propósito da cena era mostrar que aquelas pessoas eram capazes de ainda assim trazer ajuda a um desconhecido.

[align=justify]Concordo contigo. Devido às condições completa e extremamente adversas que essas pessoas estavam vivendo, as medidas desesperadas foram tomadas, afinal, tendo como base as últimas páginas da obra, era realmente um caso de vida ou morte. Isso serve ainda como evidência de que Steinbeck tinha uma visão de vida como uma eterna tensão, cheia de agruras e desafios (inclusive à dignidade), provavelmente dessa aridez da vida venha o tom de protesto ou ao menos denúncia social da obra.[/align]

Acabei de ler esse livro, e achei o fim muito forte. Sempre gosto de finais abertos, e esse em especial me causou uma certa impressão e meditação sobre o que ele quis dizer com aquilo. O que o Lucas citou abre um caminho, indicando as medidas desesperadas que as pessoas foram forçadas a tomar para sobreviver. Então, seria o livro sobre o desespero da sobrevivência sob condições desumanas? Talvez. Mas acabei pensando numa linha complementar.

O que mais me impressionou no livro não foi a resistência e o preço da sobrevivência dos Joads. O mais esmagador de tudo foi a indiferença, volubilidade e egocentrismo dos outros. Em alguns momentos eu sentia profundo nojo, mesmo algo próximo ao ódio, das pessoas que os exploravam. Pior de tudo quando eram seus iguais (como o vendedor da mercearia no campo de algodão). Pelo meu ponto de vista, mais do que o desespero, o livro é sobre a ganância, e os Joads representam nessa história o "expurgo" (não achei a palavra certa) que insiste em não descer pela descarga.

Talvez uma frase banal, mas que pra mim resume a essência do livro é aquela em que diz que eles eram maltratados porque não eram cavalos, mas homens. Putz grila. Até que ponto a gnt consegue sacrificar outras vidas por causa de lucros ou qq coisa semelhante?

O que eu achei bacana nesses "sumiços de persongens" ao longo do livro é que ele não deixa o fim das histórias pro final, como acontece em odiosos fins de novela na tv, com três casamentos, dois funerais, treze bebês e um vilão morto num episódio só. O fim é gradual, e vai espelhando o fim de todos os migrantes, encarnando-os no personagem. Assim, ele trabalha do específico para o geral da mesma forma com que brilhantemente trabalha do geral para o específico quando fala de todos (como na venda azarada dos bens de família no início da história) para explicar o que se passou com os Joads. Uns enlouquecem, como Noah, outros se resignam, como o pregador, outros resistem e lutam, como a mãe, outros se organizam em sindicatos, como Tom, outros ficam apáticos, como o pai, e assim por diante. Só não teve suicídio. (Vai ver suicícido é coisa de rico. Pobre que é pobre não se dá a esse luxo, rs)

Sendo assim, por mais que o fim tenha sido "triste", por não dar sucesso à família, enxerguei nele uma esperança oculta, uma saída aberta muito bem escondida no ato final de Rosa de Sharon. Eu a achava insuportável, tudo era ela e aquela criança, como se o mundo não tivesse outra ocupação a não ser esperar pelos dois. Ela, pra mim, era a personificação desse egoísmo que citei acima, presente nos personagens opressores do Joads, embora ela fizesse parte da família. Surpreendeu-me o fato de que ela tenha, no fim, deixado de pensar em si mesma para salvar o moribundo. Talvez essa fosse uma indicação do autor para a solução do problema. Ela estava exaurida (como também estava o próprio sistema produtivo), e, seja por opção ou por falta dela, Rosa de Sharon deu de si para que uma vida continuasse, já que a "vida" que ela gerou foi um fruto natimorto.

E de certa forma, foi isso o que aconteceu com o sistema após essa situação insustentável com Keynes e o estado de bem estar social, que começou a remediar a situação (digo remediar porque não dá pra sustentar marmanjo com leite humano, nem uma sociedade com a política keynesiana.). Pronto, é isso. Rosa era o sistema, um parasita egoísta que só após a exaustão causada pela concepção de um cadáver conseguiu lançar o olhar pra fora de si.

(Viajei, hein?)

Preciso dizer que adorei? Adoro livro que me destrói a alma. =)
 
[align=justify]Pô, gostei das tuas considerações Manu, mas elas não diferem tanto das leituras que tínhamos feito anteriormente, embora as complementem.

Muito bem lembrado o Estado de Bem-estar Social, o keynesianismo, que começou com o New Deal e foi se constituindo até chegar a "humanização do capitalismo" pode muito bem ter sido uma das bandeiras do Steinbeck, embora eu não tenha como confirmar nada disso, é meramente uma hipótese. A situação dessa população de classe baixa foi de fato excruciantemente sofrida. As condições a que eles foram submetidos são evidência disso, os racionamentos de comida que os Joads fazem é de dar dó mesmo, isso sem contar o que os adultos omitem às crianças, para poupá-las em alguma medida da adversidade em que vivem e as perspectivas nada animadoras que lhes aguardam.

Estou lendo Batalha Incerta, que antecede em 2 anos As Vinhas da Ira. A polêmica envolvendo Steinbeck e sua pretensa posição "vermelha" começaram nesse livro. Estou parado na leitura por conta de outros livros que tenho que dar conta, mas até agora a questão dos sindicatos e de partidos políticos já apareceu bastante, e justamente por conta da situação que transparece em vários de seus livros: as dramáticas condições de vida dessas populações "disposessed".

Quanto a ir do específico ao geral, creio que é isso que faz esse livro ser um clássico. A situação de miséria e exploração dos mais pobres é uma constante até hoje (embora sob novas condições e novos aspectos), o sofrimento e miséria estão presentes. A Grande Depressão contribuiu para agudizar essa situação que Steinbeck pinta com cores fortes e marcantes (que destróem a alma, como tu mesmo disseste), e fez com que ela se tornasse emblemática por ter sido um momento dramático e extremo, mas que não foi nem é único, mas que se repete todos os dias.

Tem um livro chamado A América e os Americanos, uma reunião de ensaios (não sei se dá para chamar assim), onde o Steinbeck fala "menos literariamente" e defende algumas posições políticas e visões acerca de sua sociedade e de seu tempo. Estou para comprar esse livro já faz tempo, mas ainda não consegui. Para entender melhor a visão dele a respeito de tudo isso e também os porquês de sua literatura, acho que esse livro é uma boa pedida.

Se você gostou desse livro então provavelmente vai gostar bastante dos outros do Steinbeck. Ratos e Homens e Boêmios Errantes são sensacionais. Vale a pena.
(Se tu viajaste imagina eu então) Vamos continuar a discussão.[/align]
 
Vinhas Secas e Vidas da Ira?

Mudei o assunto da resposta só pra ir um bocadinho além no assunto.

O exemplar do livro que eu li, peguei emprestado com uma mulher que estava lendo Graciliano Ramos, e ela me disse assim: "Esse é o Vidas Secas americano". Isso me chamou muito a atenção. A pena é que eu li Vidas Secas há quase sete anos, e minhas anotações se perderam por aí. Já não me lembro dos detalhes, só do principal do enredo e do impacto da leitura.

Talvez o assunto não renda muito, mas achei interessante ao menos compartilhar com vcs essa possível correlação. Ambos foram publicados na mesma época - Vidas Secas em 38 e Vinhas em 39 - e têm temáticas muito semelhantes. Acho que isso dava até pra virar monografia, mas, apenas como sugestão para quem quiser refletir sobre a miséria humana, é interessante comparar a trajetória, cenário, contexto e desenvolvimento das duas famílias, até pra compreender as diferenças sociais (porque elas existem até mesmo na miséria, rs), econômicas e etc. que havia entre Brasil e EUA. Tudo bem que Vinhas acaba sendo mais "urbano" que Vidas, mas, enfim. Também é bacana pra comparar a visão dos dois autores sobre o tema e sobre a sociedade a que criticam. Tenho cá pra mim que o brazuca é beeem mais pessimista, só que digo isso no calor da emoção, sem nenhum rigor intelectual. :pipoca:

(Aliás, fosse eu professora de história largava o Cotrim pra pegar Graciliano e Steinbeck. Seria genial, rs.)

É isso. Obrigada pela paciência, rs.

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Lucas, vou ver se consigo ir pra Ratos e Homens agora, vc deu o empurrãozinho que eu precisava, rs. A mulher tem todos os livros dele, acho que ela me empresta esse tb. Se bem que eu to curiosa pra ler O Destino Viaja de Ônibus. Conhece?

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Pensando bem... seria super bacana se a gnt conseguisse organizar um roteiro de leitura para reescrever a história através da literatura, hein? Vamos amadurecer a ideia, hein, hein?:hanhan: Quem topa? hihihi
 
[align=justify]Tenho O Destino Viaja de Ônibus sim (mas não li), e mais vários dele, pretendo preparar um projeto de mestrado em que investigue mais essa relação entre História e Literatura, que, aliás, já rendeu tantos bons frutos.

Fico pensando que, se o hábito da leitura e o gosto pela aprendizagem fosse um pouco mais receptivo, os alunos deveriam ler As Vinhas da Ira ou ao menos trechos dele quando estudassem a Grande Depressão. Acho que redimensiona completamente o entendimento dos livros didáticos, oferece um "outro lado" do processo, visto pelos olhos de outros personagens, mostra como as consequências do crack foram ainda mais dramáticas para aqueles que já não tinham condições favoráveis de vida antes da crise de 29.

Enfim, ler o livro inteiro soa meio utópico, mas não deixa de ser uma perspectiva bacana, que certamente renderia bons frutos.

Steinbeck me encanta pela crueza com que relata as coisas, você se sente angustiado pelos Joads, sente pena deles e raiva da realidade que os condena a serem miseráveis apesar de todos os seus esforços. As frutas podem apodrecer porque não compensam serem recolhidas por conta do valor (o que é por si só absurdo), e não podem servir de alimento para os famintos trabalhadores que se aglomeram em busca de um salário de fome que mal consegue fazer com que eles subsistam.

É um livro que choca mas que deixa alguma esperança, não foi o único que botou o dedo na ferida, mas construiu uma saga da resistência dos humildes frente aos cruéis desdobramentos de um sistema em que a manutenção de preços é mais importante do que a vida das pessoas.[/align]
 

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