Fiquei muito embasbacado mesmo depois de assistir esse filme. Não sei se ele me exauriu emocionalmente, se entrei em pane por causa de tantos sentimentos contraditórios me invadindo... não sei, sei que fiquei em uma malemolência gigante depois que vi. Mexeu muito comigo.
"Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças" é um espetáculo. É um espetáculo estético, uma obra com temática aparentemente ingênua, com execução genial, valor filosófico óbvio e de uma beleza ímpar.
O que mais me chocou foi ver o quão batido é esse tema filosófico: o sofrimento. Ele é tratado em muitos filmes e livros, incluindo meus autores e filósofos favoritos, que o trataram de diversas formas. Cada filósofo coloca o sofrimento em determinado prisma, que é realçado pelo existencialismo a partir de Nietzsche. Cada um dá sua interpretação. 'Brilho eterno' dá a sua.
Aqui o sofrimento que falamos é o do desgaste de um relacionamento. Se o amor é a meta da nossa vida, aquilo que mais nos inspira, comove e impulsiona, as dificuldades do amor são particularmente mais intensas, frias, ardentes, dolorosas. A dor é mais dor no amor, como o sentimento é mais profundo e tudo é mais intenso, caótico e difícil. Aqui nós vemos um amor que enfrentas as dificuldades de todo relacionamento e, a partir das idiossincrasias dos amantes, o vazio Joel e a impulsiva Clem, vemos o amor sendo sufocado pela morte lenta e antinatural das lembranças que o mantém vivo, as boas e as más. Nós vemos algo básico do ser humano: a vontade de eliminar a dor, o sofrimento, toda angústia e arrependimento.
Toda a nossa vida é marcado pela alegria e pela dor e isso é mais claro nos nossos relacionamentos, que é onde temos mais de ser nós mesmos, mais completamente, e aprendemos pela filosofia que a dor tem um sentido. A alegria, não. A vida não é um passeio no parque, pois isso seria destituí-la de todo sentido, mas não é um inferno, isso contradiz a realidade daquele fim para o qual todos parecemos nos encaminhar. Mas a vida não é uma dualidade de sentimentos e fatos, é uma complementaridade, toda a vida é vida enquanto é marcado pelas alegrias e tristezas de todos nós, triunfos e fracassos, amores e decepções, boas e más recordações. E tudo isso é humano, tudo isso é vida e é ainda mais vida no amor, é ainda mais forte.
Não se pode eliminar a dor como Joel e Clem tentaram fazer, não dá pra jogar no lixo toda a miséria e ficar apenas com as boas lembranças. Porque o que nos humaniza, nos fortalece e prepara para a vida que exige tanto de nós, é exatamente essa complementaridade de felicidade e sofrimento. Sem isso a vida se torna vazia e nosso crescimento pára, estagnamos, e não há felicidade possível, há só boas memórias desconexas, que nem são tão boas porque perderam totalmente sua origem, contexto, referencial, da dor que lhes dá valor e sentido.
É disso que se trata esse filme. Adorei a forma como uma história romântica e um tema existencial tão clássico se entrelaçam aqui, se refletem um no outro. Certo que toda história de amor é uma história da vida, da vida mais íntima, mas aqui... todo o lance de sci-fi foi colocado de forma tão sutil, só como um recurso, uma ideiazinha que permite possibilidades bizarras. E nós vemos as possibilidades bizarras, vemos a mente confusa de Joel, as doces lembranças indo embora junto com as ruins, a mágoa, ressentimento. A impulsividade da apaixonante Clementine, seu ressentimento, a vontade de dividir tudo por entender que amor é isso, e esse conflito da expansividade dela com a introversão vazia de Joel. Tudo para chegarmos à conclusão que Joel é preenchido por Clem, sua vida adquire sentido no melhor e pior redencionismo possíveis. E Joel é o porto seguro de Clem, não onde ela se apoia, mas onde ela tem sua insegurança refletida, suas fraquezas revisitadas, seu amor correspondido. E mesmo o redencionismo não sendo a coisa mais saudável do mundo, nós vemos como esse casal se completa, se complementa, não como bem e mal, mas como dois viventes apenas que são fracos, tropeçam, erra em si mesmos e um sobre o outro, se atrapalham e se perdem e depois de toda essa mágoa, ressentimento, depois de todo esse SOFRIMENTO, eles redescobrem o amor, eles se dão nova chance, eles se curam, se purificam, porque é assim o sofrimento: ele purifica, nos purga, ele abre nossas mentes e limpa nossos corações para a felicidade.
Enfim, filme lindo, profundo, belo, terrível e doce. Mexeu muito comigo apesar do tema ser tão batido pra mim. Batido, mas muito caro.