O socialismo é uma alternativa de modelo de desenvolvimento social calcado em novas relações sociais e de produção, relações tais que permitam que um sociedade possa produzir para suprir suas próprias necessidades básicas e de uma forma não-expropriatória, ou seja, de uma forma onde como alternativa à formação do capital e de todas as suas relações sociais alienantes, uma nova consciência de homem seja construída. O corolário básico do marxismo não é um 'determinismo econômico', quem o afirma desconhece o marxismo filosófico, os trabalhos propriamente de crítica que Marx propôs contra o idealismo hegeliano e seus seguidores, de direita e de esquerda. Mesmo contra o materialismo mais ingênuo e crasso o alemão barbudo desferiu suas flechas dialéticas. O estudo da economia política se dá, em Marx, a partir de sua intuição fundamental de que não é pela objetivação sucessiva do Espírito que se dá a formação da vida social, cultural, ideológica, mas, ao contrário, que a ideologia e a superestrutura de maneira geral é que são reflexos, manifestações de uma série de transformações tais que, operadas no seio da vida social, condicionam esses fenômenos, ou seja, a própria consciência coletiva e individual. O segundo insight foi identificar na economia política, no desenvolvimento das relações produtivas observadas ao longo da História, o germen e o motor da consciência social, o demiurgo da ideologia, a ratio fundamental por trás dos processos de condicionamento social, de formação das realidades jurídicas e estatais.
Não é determinismo afirmar que o motor da história, o trabalho, ou a ratio da transformação da natureza em cultura, aquele processo social pelo qual riqueza é produzida, intersubjetivamente, e, primitivamente, também intersubjetivamente é distribuída para atender às necessidades da coletividade, é responsável por fundamentar a história e a cultura. Essa ideia só revela uma unidade fundamental de processo e razão, de destino historicamente sedimentado, que revela que permeando o trabalho há uma relação poderosa de valor, de valoração, e objetivação e reflexionamento de valores que, antes de serem traduzidos materialmente em produtos, alimentos, bens úteis, se interrelacionam de forma dialética na consciência mesma. O que vai definir como esses processos produtivos se refletirão na consciência individual e coletiva é a forma como se articula socialmente esses processos produtivos, sua apropriação por instâncias e controle e distribuição, e qual a natureza mesma desse processo. Dependendo da resposta você terá que lidar com desenvolvimentos primitivos mas funcionais, onde as liberdades individuais são valores subordinados a determinados valores sociais mais amplos e mais justos, tão mais justos quanto mais cristalina for a sua relação com o desdobramento do trabalho como valor fundamental. Ou então terá de lidar com o mascaramento da axiologia do operar, do trabalho, em função de valores-máscaras, eles mesmos engendrados por relações sociais injustas, que negam essa limpidez nas relações, sua pureza.
O capitalismo pertence exatamente a esse segundo grupo. Ele não revela as instâncias de administração e controle dos processos produtivos a partir de uma relação límpida, mas as mascara a partir de uma ideologia, ela mesma engendrada pelos detentores dos meios de produção, relação que mente, mascara, vaporiza a natureza real e os interesses sociais muito particulares desses grupos sujeitos da história, as classes detentoras dos meios de produção e, consequentemente, do poder político. Não há desmerecimento axiológico do trabalho nele, muito pelo contrário, apenas simplesmente a mentira e engodo sobre o caráter de equidade, de justiça de relações que são essencialmente expropriadoras e das mais vilipendiadoras do ser humano e sua dignidade. Daí a necessidade de uma ideologia como o liberalismo nos seus momentos de expansão, ou seja, de uma ideologia otimista, romântica, abstrata no mais alto grau e incapaz de lidar com a realidade fora dos esquematismos de um essencialismo individualista, a desfigurar o valor do trabalho.