Facebook me mostrou esta lembrança, e eu preciso compartilhá-la com vocês. Sou apaixonada por este livro, e, de modo especial, por este trecho, que, depois de tanto tempo, ainda me emociona (sim, eu choro quando releio isto):
"'Há uma enorme diferença entre pobres e ricos', Kite diz, dando uma tragada no cigarro. Estamos num bar, na hora do almoço. John Kite está sempre, a menos que o local não permita, fumando um cigarro, num bar, na hora do almoço.
'Os ricos não são maus, como tantos dos meus companheiros diriam a você. Conheci pessoas ricas — já toquei em seus iates — e elas não são grosseiras, ou malignas, e não odeiam os pobres, como muitas pessoas diriam. E não são estúpidas — ou pelo menos não mais que os pobres. Por mais que eu ache divertida a ideia de uma classe dominante composta de dândis tagarelas, incapazes de vestir as próprias meias sem uma babá para ajudá-los, ela não é verdadeira. Eles constroem bancos, e empreendimentos imobiliários, e formulam políticas, tudo com perfeita competência.
'Não — a grande diferença entre ricos e pobres é que os ricos são alegres. Acreditam que nada pode realmente ser tão ruim. Nascem com o adorável e aveludado lustro da jovialidade — como lanugem, num bebê — e isso nunca é prejudicado por uma conta que não pode ser paga; por uma criança que não consegue receber educação; por uma casa que deve ser abandonada por um abrigo, quando o aluguel fica alto demais.
'A vida deles é a mesma por gerações a fio. Não existe revolução social que realmente os afete. Se você se encontra confortavelmente na classe média, qual é o maior mal que uma política de governo pode fazer? O pior dos piores? Cobrar noventa por cento de imposto e deixar suas lixeiras cheias na calçada. Mas você e todo mundo que você conhece vão continuar a beber vinho — talvez mais barato —, tirar férias — talvez em algum lugar mais perto — e pagar seu empréstimo habitacional — embora com atraso.
'Pense, agora, nos pobres. O que é o maior mal que uma política de governo pode fazer para eles? Pode cancelar sua cirurgia, sem possibilidade de recorrer à saúde privada. Pode acabar com suas escolas — sem rota de fuga para uma escola particular. Pode tirar você de casa e colocá-lo numa pensão até o final do ano. Quando as classes médias falam apaixonadamente sobre política, estão discutindo seus privilégios — seus incentivos fiscais e seus investimentos. Quando os pobres falam apaixonadamente sobre política, estão lutando pela sobrevivência.
'A política sempre vai significar mais para os pobres. Sempre. É por isso que fazemos greve e passeatas, e entramos em desespero quando os jovens dizem que não votam. É por isso que os pobres são vistos como mais vitais e animalescos. Nada de música clássica para nós — nada de passeios em propriedades históricas do Tesouro Nacional, ou comprar assoalhos de anúncios. Não temos nostalgia. Não trabalhamos com o dia de ontem. Não suportamos isso. Não queremos ser lembrados de nosso passado, porque era terrível: morrer em minas, e cortiços, sem alfabetização ou direito a voto. Sem dignidade. Era tudo tão terrível. É por isso que o presente e o futuro são para o pobre — este é o lugar no tempo para nós: sobreviver agora, esperar pelo melhor no futuro. Vivemos o agora — para que nossos deleites quentes, rápidos e instantâneos nos incitem: açúcar, um cigarro, uma nova música ligeira na rádio.
'Você nunca, nunca pode esquecer, quando fala com uma pessoa pobre, que é preciso dez vezes mais esforço para chegar a algum lugar quando se sai de um código postal ruim. É um milagre quando alguém de um código postal ruim chega a algum lugar, filho. É um milagre que façam o que quer que seja'".
(Do que é feita uma garota, Caitlin Moran, p. 195-197.)