Percebo a mobilidade dos tópicos, mas não concordo com a abstração total das idéias. Porém, não parece-me de fato ser o caso.
Quanto ao uso do arco do Japão, chama-se Kyudo.
No passado, o arco era utilizado para diversos propósitos: caça, guerra, jogos e rituais da corte, cerimônias religiosas e torneios. Muitos dos jogos e rituais ainda são praticados atualmente, mas o arco japonês perdeu a sua utilidade como arma há muito tempo atrás. Hoje em dia, o Kyudo é praticado principalmente como um meio de desenvolvimento físico, moral e espiritual.
A combinação de graça, dignidade e tranqüilidade dá ao Kyudo um ar solene, quase religioso, mas Kyudo não é uma religião. Ele recebeu, no entanto, grandes influências do Shinto (a religião nativa do Japão) e do Zen- budismo. O Shinto se manifesta mais visivelmente na cerimônia, na indumentária e no respeito demonstrado ao arco, flechas e Dojo (local onde é praticado). A influência Zen se dá mais na filosofia e prática do Kyudo.
As origens do Kyudo estão cercadas de mitos e lendas. Note-se que Jimmu Tenno, o lendário primeiro imperador do Japão, é sempre representado com um arco e flechas, o que ilustra a importância do arco como símbolo de poder e autoridade nos primórdios da história do Japão.
Há inúmeras lendas a respeito de grandes guerreiros que eram exímios arqueiros nos tempos antigos. Os mais famosos são Minamoto no Tametomo e Nasu no Yoichi.
Minamoto no Tametomo teria sido um homem de excepcional força e estatura. Seu arco era tão poderoso que precisava de cinco homens "normais" para puxá-lo. Um de seus feitos mais famosos seria o de ter afundado um navio com uma única flechada.
Nasu no Yoichi é conhecido pela sua extraordinária habilidade demonstrada na batalha de Yashima onde, respondendo a um desafio, ele acertou um leque colocado no alto do mastro de um navio, ancorado a cerca de setenta metros da costa, atirando montado a cavalo, à frente de ambos os exércitos que se enfrentavam na praia.
Os arqueiros gozavam de grande respeito na sociedade feudal do Japão quando foram introduzidas as armas de fogo no século XVI. O arco como arma de guerra tornou-se obsoleto, e os guerreiros passaram a dedicar-se mais ao arco-e-flecha cerimonial e a torneios de habilidade, como o do templo Sanjusangendo, onde os adversários deviam atirar, sentados, em um alvo situado a cerca de 120 metros, ao longo de um estreito corredor do templo. O recordista neste torneio foi Wasa Daihachiro, que acertou 8.133 flechas de um total de 13.053 disparadas, em um período de 24 horas, ou seja, cerca de 9 flechas por minuto, um feito verdadeiramente inigualável.
Com a restauração Meiji, na segunda metade do século XIX, o Japão se abriu ao ocidente, com os hábitos e cultura européias se tornando populares, e a cultura tradicional sofreu um acentuado declínio. O Kyudo quase que caiu em desuso. Na virada do século, Honda Toshizane, instrutor da Universidade Imperial de Tokyo, combinou elementos dos estilos guerreiros e cerimoniais para criar um sistema "híbrido" de arco-e-flecha, que se popularizou e garantiu a sobrevivência do Kyudo até os nossos tempos.
Após a guerra, a prática de artes marciais foi proibida, e somente em 1949 que foi autorizada a formação do Zen Nihon Kyudo Renmei (Federação de Kyudo do Japão), que estabeleceu os padrões modernos de forma, etiqueta e procedimentos do Kyudo atual. Estima-se que haja atualmente cerca de 500.000 praticantes de Kyudo em todo o mundo, principalmente no Japão.