Breno C. disse:
Já é a segunda vez que caímos nessa conversa e eu bato na mesma tecla: a Literatura pode ser uma ciência, mas antes de tudo é uma arte e a arte depende única e exclusivamente da interpretação pessoal.
Sim, antes de tudo ela é arte e, por isso, que a interpretação pessoal não é determinante numa obra artística. Como eu disse em outra conversa, é uma ciência humana e, como tal, está sujeita a modificações radicais e a interpretações bastante diferentes. Porém nunca que a carência de técnica tornou alguém artista.
A interpretação pessoal é determinante para o gosto ou a importância que aquela obra vai ter na sua vida, mas pra obra
per se pouco importa. Ela já existe, independente da sua interpretação pessoal ou do seu gosto, por isso que a arte transcende o gosto pessoal e a interpretação pessoal.
Breno C. disse:
Se você bate palmas para um músico que considerou ruim só porque outras pessoas dizem que ele é bom, então você não tem opinião. É da mesma coisa com a literatura como arte.
Eu bato palmas prum músico que eu considero ruim. Eu gosto de coisas ruins como todo mundo gosta, porém, ao contrário dos demais, eu não fico forçando uma interpretação pessoal ou buscando pêlo em ovo pra dizer que ele é fantástico por isso ou aquilo. Porém, aplaudo com prazer alguém que seja bom e eu não goste, como, por exemplo, Pollock. Eu não gosto, mas o cara é bom, vou fazer o quê contra isso?
Gosto é pessoal, técnica não. Simples assim. Aquela técnica pode não me agradar (que é o caso do abstrato), mas ela existe e o cara aplica bem.
Breno C. disse:
Você pode achar a escrita de um cara foda sem precisar que as outras pessoas concordem, mas é óbvio que também não podemos excluir a "técnica", que nesse caso sim deve ser avaliada e estudada comparando com outros autores.
Pra mim é uma atitude boçal limitar um assunto a "isso ou aquilo" (mesmo que as vezes eu seja obrigado a agir assim e me tornar um boçal também) e entendo que existe o estudo das técnicas que compõem uma arte, porém é um ato de confirmação de boçalidade ver tudo como ciência e esquecer o âmbito artístico.
A ciência artística está diretamente ligada com o âmbito artístico, se não o fosse ela não seria uma ciência artística. O domínio da técnica de um escritor é intimamente ligada com a beleza e a forma que aquelas palavras estão arranjadas no texto, o que é o objeto de estudo da ciência literária.
É exigido um grau bem alto de sensibilidade pra fazer a análise da técnica de alguém e, assim, transcender o gosto. É bem cruel, mas é bem verdade: você tem que se sacrificar pra arte ser o que é e isso inclui o seu gosto. Aceitar que o seu ego, a sua vontade e o seu tesão é menor do que a técnica artística é bem difícil, mas é necessário.
Esse tipo de estudo parece restritivo, mas é exatamente o contrário. Ele aumenta a sua visão de forma bastante significativa e faz você transcender a satisfação do seu ego e fazer com que se admire coisas que você nunca admiraria em outras épocas. A linha entre a admiração de uma técnica e o gosto pessoal é muito tênue e, na maioria das vezes, nem é enxergada.
Claro que você vê alguns literatos fãs empurrando leituras bizarras goela abaixo da galera só porque ele gosta extremamente daquilo, mas isso é bem fácil de identificar. As leituras forçadas existem aos montes e até de obras já consagradas, mas é só ficar um pouco mais atento para perceber a situação triste que é.
O seu gosto é determinante pra sua vida, porém a técnica artística é determinante para a arte. Você pode admirar alguém que quase ninguém admira porque você gosta daquilo, mas daí a dizer que ele é fantástico e extremamente competente em beleza artística é fazer seu gosto valer pela técnica.
No final das contas, cada um ler o que quer e que sejam felizes do jeito que lhe convierem. Pra mim, a catarse não é suficiente, para outros o é, para esses outros eu dou o nome de pseudo-leitores. Geralmente o leitor de best-sellers (e apenas eles) é exatamente assim, entretanto eu conheço inúmeros leitores de clássicos que não entendem patavina do que tá escrito e ainda fazem pose de super-caras. Aquele velho exemplo de entrar numa galeria de arte moderna, não entender nada e sair embasbacado, sabe? É como ler Saramago e fazer uma leitura digna de um livro do Paulo Coelho.
Concluindo: pseudo-leitores, leitores fracos, incompletos e afins não são apenas aqueles que leêm best-sellers, porém a tendência nesses é maior. É necessário ler e tirar coisas de obras clássicas e tidas como profundas pelos teóricos e coisa do tipo? Se você procura algo que te apenas uma Epifania, não, se você quer ir além e realmente se entregar à arte, sim.
O processo é sem volta e, nem sempre, eu tenho certeza se ele valeu à pena.
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Sobre a frase que eu coloquei, Brenoca, eu quis dizer o seguinte: aqueles que passam cinco anos numa faculdade estudando à exaustão técnicas artísticas e coisas do tipo e não ter nenhum ganho pessoal nesse processo todo é impossível. Ou a arte te toca, ou ela não te toca: como afirmei acima, os estudos artísticos denotam uma sensibilidade muito grande, não há como você aprender a fazer as leituras técnicas sem ter um ganho pessoal, se não o tem, a leitura, provavelmente, é errônea.
Ai ai, coisa triste demais...