Primeiramente uma boa tarde a todos. Dentre os elementos que compõem o Legendarium se dá pela influência Cabalística na formação mitológica. Sabemos que a obra se inicia com a existência de Iluvatar como Entidade Suprema, provedor de todas as essências através da Chama Imperecível utilizadas pelos Ainur. Estes últimos gerados pelos seus pensamentos. Para fins de organização, elencarei alguns temas da Cabala que se parecem (creio) com o trazido na Obra:
1 - Chama Imperecível vs Luz de Deus no Vazio Primordial
Havia Eru, o Único, que em Arda é chamado de Ilúvatar. Ele criou primeiro os Ainur, os Sagrados, gerados por seu pensamento, e eles lhe faziam companhia antes que tudo o mais fosse criado.
Comparem com o Conceito Cabalístico do
Ein Sof:
Before He gave any shape to the world, before He produced any form, He was alone, without form and without resemblance to anything else. Who then can comprehend how He was before the Creation? Hence it is forbidden to lend Him any form or similitude, or even to call Him by His sacred name, or to indicate Him by a single letter or a single point... But after He created the form of the Heavenly Man, He used him as a chariot wherein to descend, and He wishes to be called after His form, which is the sacred name "YHWH"
Não fica exatamente explícito, mas O Silmarillion pontifica 2 (dois) conceitos antagônicos, mas complementares em sua cosmogonia, uma vez que Eru é tido como força criativa essencial para a formação e mantença do Mundo (EÄ), os Ainur se tornam "ferramentas" na origem divina a todo o Mundo Físico/universo criado. Mais do que um
Panteismo, isso lembra (e muito) o termo
Cabalístico denominado
Ein Sof: http://en.wikipedia.org/wiki/Ein_Sof
Ein Sof é um conceito Neo-Platônico que atribui uma origem divina a toda a existência criada, em contraste com o Ein (ou Ayn), que é o infinito não coisificado. O "EIN SOF" do silmarillion corresponderia a força criativa de Iluvatar com a Chama Imperecível. Em contra partida, o Ein Ayn da Obra seria o infinito não gerado, representado pelo Vazio não definido, desprovido de existência própria. Neste caso, podemos inferir como o
Vazio que Melkor vagou fora das Mansões de Iluvatar; os espaços desprovidos de Estrelas em que Eärendil navegou em Vingilot e o mais enigmático é a saída dos Maiar Corrompidos para regiões fora de Eä/universo:
Muitas vezes, Melkor penetrara sozinho nos espaços vazios em busca da Chama Imperecível, pois ardia neleo desejo de dar Existência a coisas por si mesmo; e a seus olhos Ilúvatar não dava atenção ao Vazio, ao passo que Melkor se impacientava com o vazio. E, no entanto ele não encontrou o Fogo, pois este está com Ilúvatar.
Sem dissentir:
Muito viajou ele naquela embarcação, penetrando mesmo nos vazios desprovidos de estrelas.
Ademais:
E muito ao longe, nas trevas, ele se enchia de ódio, sentindo inveja do trabalho de seus pares e desejando submetê-los. Assim, Melkor chamou a si os espíritos que desviara para seu serviço, fazendo-os sair das mansões de Eä, e se considerou forte.
Coincidentemente há outros elementos análogos com os retratados pelo Silma. Exemplo disso é o conceito do
Tzimtzum, um dos inúmeros processos criativos para formação da existência/realidade. A interpretação dada é a de que Deus utilizou-se de uma irradiação divina na elaboração de Reinos, Mundos e planos Finitos-independentes de existência. Tal criação tem natureza
EX-Nihilo, ou seja, a criação a partiu do Nada. O “Nada” aqui não só como uma ideia, mas um espaço tangível onde Deus teria colocado sua infinita luz no centro do Vazio, um “coração pulsante” ou a singularidade que gerou a existência de todas as coisas:
http://en.wikipedia.org/wiki/Tzimtzum
Prior to Creation, there was only the infinite Or Ein Sof filling all existence. When it arose in G-d's Will to create worlds and emanate the emanated...He contracted (in Hebrew "tzimtzum") Himself in the point at the center, in the very center of His light. He restricted that light, distancing it to the sides surrounding the central point, so that there remained a void, a hollow empty space, away from the central point... After this tzimtzum... He drew down from the Or Ein Sof a single straight line [of light] from His light surrounding [the void] from above to below [into the void], and it chained down descending into that void.... In the space of that void He emanated, created, formed and made all the worlds.(Etz Chaim,Arizal, Heichal A"K, anaf 2)
Em outras palavras:
Logo, eu digo: Eä! Que essas coisas Existam! E mandarei para o meio do Vazio a Chama Imperecível; e ela estará no coração do Mundo, e o Mundo Existirá; e aqueles de vocês que quiserem, poderão descer e entrar nele
Em termos concretos seria a nuvem nos quais os Ainur tiveram que entrar para gerar e gerir o Universo físico - Eä:
- E, de repente, os Ainur viram ao longe uma luz, como se fosse uma nuvem com um coração vivo
de chamas; e souberam que não era apenas uma visão, mas que Ilúvatar havia criado algo novo:
Eä, o Mundo que É.
2 - Os Quatro Mundos da Cabala e o Ainulindalë:
É possível que o Ainulindalë se enquadre em 4 estágios que explicam a Cosmogonia intentada por Tolkien. O
1º Estágio se dá pela existência Uma de Iluvatar, a geração (por Pensamento) dos Ainur. O
2º Estágios segue-se por meio de uma "Grandiosa Música" que prenuncia um universo a ser manifestado. Tal universo é criado de acordo com a natureza e limitações de cada Ainur, com um começo e uma cadência definido-marcada pelo próprio Ilúvatar. Em
3º lugar, ocorre a Visão do Mundo (EÄ) prenunciado através da Música, ou seja, um mundo não manifestado, um pré-projeto a ser construído. Imperioso citar:
Mas quando os Valar entraram em Eä, a princípio ficaram assustados e desnorteados, pois era
como se nada ainda estivesse feito daquilo que haviam contemplado na Visão; tudo estava a ponto de começar, ainda sem forma, e a escuridão era total. Pois a Grande Música não havia sido senão a expansão e o florescer do pensamento nas Mansões Eternas, sendo a Visão apenas um prenúncio;
O
4º Estágio se dá pelo substrato divino concedido por Ilúvatar ao possibilitar (por meio da Chama Imperecível) o que até então era uma "Ideia". Gerou-se então Eä (o mundo que é) através da labuta cósmica dos Ainur. No que tange à Cabala, existem quatro mundos/planos espirituais de existência que parecem com o descrito no Silmarillion. São eles:
http://en.wikipedia.org/wiki/Four_Worlds
a)
Atziluth: O mundo da emanação, o mais alto grau de existência espiritual, representado no Ainulindalë
não pelas Mansões de Iluvatar, já que estas são posteriores a um
outro plano de existência exclusivo/próprio de ERU, ou seja, os Mansões são as moradas dos Ainur, enquanto havia (ou não havia) um plano espiritual de não existência. Interessante notar que na interpretação Cabalística do Atziluth há uma mudança de Paradigma de Deus, em sendo uma Entidade Suprema "solitária"/UNA que se "decidiu" pela criação/inspiração do Existir (Biblicamente falando seria o "Logos" - "Verbo"). Vale o entendimento do Silmarillion:
Havia Eru, o Único, que em Arda é chamado de Ilúvatar.
O Atziluth é uma tentativa de se interpretar elementos divinos da criação. Uma das problemáticas levantadas pelos Estudiosos Cabalísticos é o fato de Deus mesmo infinito, perfeito e poderoso ter criado/emanado seres/entidades menores e imperfeitos. Sejam os mesmos denominados Anjos/Arcanjos. Ou no caso do Silmarillion os Ainur:
Ele criou primeiro os Ainur, os Sagrados, gerados por seu pensamento, e eles lhe faziam companhia antes que tudo o mais fosse criado. (...) pois cada um compreendia apenas aquela parte da mente de Ilúvatar da qual havia brotado e evoluía devagar na compreensão de seus irmãos.
b)
Beri'ah: Beri'ah é o primeiro dos quatro mundos a ser criado
ex nihilo, ou seja, criado a partir do Nada Primordial. Seu correspondente seria justamente as Mansões de Iluvatar e a presença dos Ainur como seres conscientes, tendo noções de suas próprias existências.
Ilúvatar, porém, ergueu-se em esplendor e afastou-se das belas regiões que havia criado para os Ainur; e os Ainur o seguiram.
Um aspecto interessante é o fato de o Beri’ah descrever a existência de seres que habitam no
Atziluth, ou seja, "Criaturas Extraplanares" que antecedem a criação/formação dos próprios anjos; sendo, ademais, oprimidos pela Luz Divina Irradiada e destituídos de existência própria. Isso me fez lembrar muito dos
Seres Sem Nome de Moria "Mais Velhos que Sauron", Ungoliant e principalmente dos Deuses de Nan Dungortheb "mais velhos que Morgoth e os Senhores do Oeste", descritos nos HOMES. Odeiam a Luz e asseiam por ela (coincidência?):
Beri'ah is the first of the four worlds to be created ex nihilo, since Atzilut was emanated rather than created. Thus, although there exist beings that dwell in Atzilut, those beings are overwhelmed by the Divine Light and are unaware of their own existence; in Beri'ah however, the angels are dimly aware of their own existence as distinct from God's.
Vide:
There the twain enfolded phantom twilight
and dim mazes dark, unholy,
in Nan Dungorthin where nameless gods
have shrouded shrines in shadows secret,
more old than Morgoth or the ancient lords
the golden Gods of the guarded West.
But the ghostly dwellers of that grey valley
hindered nor hurt them, and they held their course
with creeping flesh and quaking limb.
Yet laughter at whiles with lingering echo,
as distant mockery of demon voices1
there harsh and hollow in the hushed twilight
Flinding fancied, fell, unwholesome
Tradução de Ancalagon Killer transcrita abaixo:
Mergulharam ali em fantasmagórico crepúsculo
E em labirintos sombrios e perversos
Em Nan Dungorthin onde os deuses sem nome
Possuem templos ocultos por sombras secretas
Mais velhos que Morgoth ou que os senhores antigos
Os deuses dourados que guardam o Oeste
Mas os habitantes fantasmagóricos daquele vale cinzento
Não barraram sua trilha ou os feriram, e eles prosseguiram seu caminho
Por Fim, o Beri'ah é tido como a morada de arcanjos que não entraram no Terceiro Plano Espiritual, ou seja, fala-se de entidades que não adentraram no mundo de
Yetzirah; permaneceram, portanto, no plano de existência puramente espiritual:
Beri'ah is the abode of the permanent archangels, as opposed to the non-permanent angels which dwell in Yetzirah.
Sem dissentir:
Aconteceu, assim, de entre os Ainur alguns continuarem residindo com Ilúvatar fora doslimites do Mundo, mas outros, e entre eles muitos dos mais fortes e belos, despediram-se de Ilúvatar e desceram para nele entrar.
c)
Yetzirah: Seria justamente o "Mundo prenunciado/a ser formado". Retrata, à grosso modo, o processo que vai dá origem ao Mundo de
Assiah, sendo este último o Mundo da Matéria. No Silmarillion, o Yetzirah seria a grande Canção dos Ainur, o prenúncio de EÄ pela Visão concedida por Iluvatar e principalmente a descrição dos reinos "Elementais" do Mundo Material. Fogo (Melkor); Água (Ulmo); Terra (Aulë) e Ar (Manwë):
http://www.alchemylab.com/sepher_yetzirah1.htm
These divisions correspond to Jewish concepts such as the 3 letters making up God's name (
yud,
he, and
vav), the 7 days of the Jewish week, the
12 tribes of Israel, and the 12 months of the
Hebrew calendar, as well as to
early "scientific" or philosophical ideas such as the 4 elements (fire, water, air, earth)According to the Sefer Yetzirah, the first emanation from the spirit of God was the ruach (= "spirit," "air") that produced water, which, in its turn, formed the genesis of fire. In the beginning, however, these three substances had only a potential existence, and came into actual being only by means of the three letters Aleph, Mem, Shin; and as these are the principal parts of speech, so those three substances are the elements from which the cosmos has been formed.[5]
Seu Correspondente na Obra:
E observaram os ventos e o ar, e as matérias das quais Arda era feita:de ferro, pedra, prata, ouro e muitas substâncias. Mas de todas era a água a que mais enalteciam. E dizem os eldar que na água ainda vive o eco da Música dos Ainur mais do que em qualquer outra substância existente na Terra; e muitos dos Filhos de Ilúvatar escutam, ainda insaciados, as vozes do Oceano, sem contudo saber por que o fazem.
Ora, foi para a água que aquele Ainu que os elfos chamam de Ulmo voltou seu pensamento, e de todos foi ele quem recebeu de Ilúvatar noções mais profundas de música. Já sobre os ares e os ventos, mais havia refletido Manwë, o mais nobre dos Ainur. Sobre a textura da Terra havia pensado Aulë,
Por fim:
Ora, foi para a água que aquele Ainu que os elfos chamam de Ulmo voltou seu pensamento, e de todos foi ele quem recebeu de Ilúvatar noções mais profundas de música. Já sobre os ares e os ventos, mais havia refletido Manwë, o mais nobre dos Ainur. Sobre a textura da Terra havia pensado Aulë,
E, nessa obra, a parte principal coube a Manwë, Aulë e Ulmo; mas Melkor também estava ali desde o início e interferia em tudo o que era feito, transformando-o, se conseguisse, de modo que satisfizesse seus próprios desejos e objetivos; e ele acendia enormes fogueiras.
d)
Assiah: O último dos Planos de Existência na Cabala. É o mundo puramente material. Sendo a região governada pelos Ofanim. Tendo estes a tarefa de promover a audição das orações, apoiar o esforço humano, e combater o mal. Seria análogo, portanto, ao dito "Poder delegado" de Iluvatar aos Ainur.
(...) mas outros, e entre eles muitos dos mais fortes e belos, despediram-se de Ilúvatar e desceram para nele entrar. No entanto, essa condição llúvatar impôs, ou talvez fosse conseqüência necessária de seu amor, que o poder deles a partir daí fosse contido no Mundo e a ele restrito, e nele permaneceria para sempre, até que ele se completasse, para que eles fossem a vida do mundo; e o mundo, a deles. E por esse motivo foram chamados de Valar, os Poderes do Mundo.
3 - A Importância da Luz na Cabala e no Silmarillion:
A luz é uma das fontes primordiais para a existência da vida (baseada na que conhecemos), em razão desta importância, a luz sempre representou a emanação de propriedades divinas em inúmeras culturas. No que tange à Cabala, os estudiosos interpretam que a luz de Deus como irradiação espiritual/metafórica é análoga com a luz no sentido físico/material/energético. A esse conceito denomina-se
Ohr(
http://en.wikipedia.org/wiki/Ohr). Ohr ou LUZ que descreve a analogia da luz física para descrever as emanações Divinas, bem como entender a relação alma e corpo. Esse conceito tá presente (creio) nesta passagem falando das Silmarils:
Contudo, esse cristal estava para as Silmarils como o corpo para os Filhos de Ilúvatar: a morada do fogo interior, que se encontra dentro dele e, ainda assim, em todas as suas partes; e que é sua vida. E o fogo interior das Silmarils, Fëanor criou a partir da fusão da luz das Árvores de Valinor, que ainda sobrevive nas jóias, embora as Árvores já há muito tenham definhado e não brilhem mais.
Ohr ("Light"
Hebrew: אור; plural:
Ohros/Ohrot "Lights"
Hebrew: אורות) is a central Kabbalistic term in the
Jewish mystical tradition. The analogy of physical light is used as a way of describing
metaphysical Divine emanations.
Shefa ("Flow"
Hebrew:שפע and its derivative,
Hashpoah "Influence"
Hebrew: השפעה) is sometimes alternatively used in Kabbalah, a term also used in Medieval
Jewish Philosophy to mean Divine influence, while the Kabbalists favour
Ohr because its
numerical value equals
Raz("mystery").
[1] It is one of the two main metaphors in Kabbalah for understanding
Divinity, along with the other metaphor of the human soul-body relationship for the
Sephirot.
[2] The metaphorical description of spiritual Divine creative-flow, using the term for physical "light" perceived with the eye, arises from analogous similarities. These include the intangible physicality of light, the delight it inspires and the illumination it gives, its apparently immediate transmission and constant connection with its source. Light can be veiled ("
Tzimtzum"-constrictions in Kabbalah) and reflected ("an ascending light from the Creations" in Kabbalah). White light divides into 7 colours, yet this plurality unites from one source. Divine light divides into the 7 emotional Sephirot, but there is no plurality in the Divine essence. The term
Ohr in Kabbalah is contrasted with
Ma'ohr, the "luminary", and
Kli, the spiritual "vessel" for the light.
Uma vez que a percepção humana para usufruir da Luz parte da emanação por parte de objetos que emanam a luz. A cabala cita a existência de receptáculos ou fontes de luz. A Exemplo do conceito
Ma'ohr(astro/estrela/luminária). Usa-se, neste caso, a relação entre o sol e a luz que ele emite . No entanto, a luz que vem do sol não é o exemplo perfeito para a Ohr, a luz do sol que existe já foi limitado em sua qualidade e, portanto, não tem a essência do verdadeiro Ohr. O Silmarillion pontifica tal conceito, é muito parecido, haja vista a luz divina outrora emanada pelas Arvores existirem apenas como uma lembrança no SOL guiado por uma Maia:
No entanto, nem o Sol nem a Lua conseguem trazer à lembrança a luz que existia antes,a que emanava das Árvores antes que elas fossem tocadas pelo veneno de Ungoliant.Aquela luz sobrevive agora apenas nas Silmarils.