Aew, revivendo o Tópico do Angra
Um amigo meu dos antigos tempos do fórum Valinor me mandou uma pergunta de um fã do angra para o Guitarrista Rafael Bittencourt muito interessante...
Pergunta do fã - E aí beleza? Gostaria de saber se você é simpatizante do demônio por causa da música Lullaby for Lucifer.
(Alexandre Frederico)
Rafael Bittencourt - Alexandre, obrigado pela sua pergunta. Adoro falar sobre isto. Não sou um simpatizante de Lúcifer, mas também não sou um antipatizante. Mas, acho que deveríamos desaprisioná-lo do inferno e convidá-lo a sentar-se em nossas mesas. Acho que a chave para a grande revolução do relacionamento entre as pessoas é o perdão. Se as pessoas perdoassem o demônio, viveriam mais tranquilas e sem medo. A cultura ocidental é muito primitiva e ignorante, divide o universo entre bem e mal, e seguindo este raciocínio, acaba dividindo toda a sociedade entre culpados e inocentes, aceitos e não aceitos, toleráveis e não toleráveis e por aí vai. Para mim, Deus é uma força maior que reúne o bem e o mal em uma coisa só, inexplicavelmente composto pelo tudo e o nada. A única maneira de se criar a vida é confrontando forças opostas. Por exemplo: uma tomada elétrica tem dois buracos, um é o positivo e o outro é o negativo. Como julgar qual buraco da tomada é melhor? É necessário que os dois existam para que as coisas funcionem. A presença de um anjo rejeitado por Deus, responsável por todo o mau do mundo na nossa cultura, como se diz de Lúcifer, é um pensamento mesquinho, ultrapassado e que deve ser combatido. Isto está atrapalhando e muito a evolução da raça humana. Para mim, a sociedade pode evoluir suas tecnologias e comunicações mas continua vivendo como a milhares de anos atrás. Nós nunca evoluiremos o nosso convívio se não vencermos a barreira do nosso modo limitado de entender a vida. É fato que o convívio entre os povos está cada vez mais difícil e intolerante, e a religião, da maneira que é praticada hoje, aliada à ignorância e à natural estupidez humana são a força motriz desta situação caótica. Tudo isto é fruto de um pensar que eu acabo de batizar de Teologia do Conformismo Pleno. Uma filosofia que está arraigada em todas as pessoas, praticantes ou não de uma religião. Porque herdamos da cultura greco-romana, do cristianismo e do judaísmo os blocos de tijolo que construiram os pilares da sociedade atual, fortemente caracterizado pelo individualismo capitalista. É o que talvez a psicologia chamaria de inconsciente coletivo. Mesmo discordando, temos isto inerente em nosso pensamento. Alguns ícones e estigmas povoam as nossas mentes e é muito difícil nos libertarmos deles, porém acredito profundamente que a razão humana só transcenderá se superados os medos destes fantasmas. Parece loucura, mas a crença em Deus está levado o mundo ao colapso! Símbolos como Deus do amor, Satã, pecado, juízo final, inferno e céu são completamente irracionais. Acho tudo isso uma grande igorância! A Teologia do Conformismo Pleno é o resumo da base de todas as religiões ocidentais. Ela prega indiretamente que o mundo nunca vai melhorar e que não é necessário lutar para que aconteça o contrário. Basta se conformar. Ela te cega e torna a sua vida mais fácil, te transformando em um cordeiro conformado com as injustiças. Afinal, este pensamento religioso que criamos nos liberta da dor que é ter a consciência de nossos limites e de nossa existência vã. A base da Teologia do Conformismo Pleno é: Um criador que pune os que agem contrário a sua aprovação criou tudo que existe no mundo. Mas, por amar suas criaturas é capaz de perdoá-las, dono de uma compaixão infinita. Satanás é o culpado por ter espalhado o pecado no mundo após ter sido expulso do Reino de Deus. Este pensamento nos exime de nossa própria culpa e mediocridade atribuindo a uma entidade personificada tudo que há de mau no planeta. Após a morte, existe o paraíso. Portanto, conforme-se com os sofrimentos e fatalidades da vida pois lá no "céu" a vida será melhor. Nas filosofias cristãs, aprimorou-se a técnica do conformismo, dando-se a Cristo, o posto de filho único e insuperável de Deus, o próprio Deus na terra. Nos colocando em um segundo plano, na condição de pecadores originais. Basicamente alegando que nunca alcançaremos a perfeição que Jesus teria supostamente alcançado. Eu pergunto: Porque melhorar nossa conduta se Satanás é o verdadeiro culpado por nossos desvios de comportamento? Porque não errar se Deus nos perdoará no final? Porque aprimorar o nosso modo de viver se, por mais que tentemos, nunca conseguiremos amar os nossos semelhantes e a vida como Jesus amou? Porque lutarmos para melhorar o planeta se existe um mundo bem melhor que este reservado após a morte? Digo mais, se Deus criou um mundo perfeito que posteriormente foi maculado pela disseminação do mau através do Diabo, logo o mundo que conhecemos hoje foi criado pelo Bem e pelo Mal. Então, a sociedade não pode se dizer monoteísta, pois considera a existência de dois deuses. A maioria das religiões ocidentais aconselha a adorar o bem e rejeitar o mau, e isto confunde as pessoas. Mais complicado isto fica, quando nos damos conta de que o certo e o errado são termos relativos e que variam conforme a avaliação de cada um. Vide, os padres que acham que não há mal nenhum estuprar criancinhas. Poucas culturas da raça humana conseguiram entender e praticar uma crença realmente monoteísta e, certamente, no mundo atual ocidental, nenhuma delas o pratica. Na minha opinião, deveria nascer uma mentalidade pacífica que unisse e servisse a todas as pessoas. Simples e fácil de entender, ensinada obrigatóriamente nas escolas. Com brechas para opiniões pessoais e aberta a discussão. Que se transforme constantemente com a sociedade, pois nada é imutável. Que nunca dite o seu caminho como sendo o único. E, que proponha uma real transformação da realidade que vivemos. Eu desconfio e não aceito como religião, um pensamento que não sirva a todas as pessoas. Para mim, isto é o que Jesus queria e que as pessoas entenderam tão mal. Atormentadas por medos e incapazes de se despirem das vestes sujas de crenças obsoletas. Eu espero que em alguns séculos as pessoas tenham se libertado destas correntes e olhem para o nosso tempo com o mesmo deboche com que olhamos atualmente as culturas mais primitivas que a nossa. Não são ridículas algumas práticas religiosas ancestrais? A morte das virgens, o Olimpo em suas anedotas heróicas, o trovão, o sol e a lua? Com a mesma incompreensão eu vejo os fiéis de hoje, das principais religiões. Cegos e nocivos. Tudo que se vê por aí é a Teologia do Conformismo Pleno, na qual, haverá sempre uma teoria um raciocínio que te conduza a se conformar com o que é ruim em você mesmo ou ao seu redor. A confirmação disto que estou dizendo mora no dia a dia e nos dizeres corriqueiros: "afinal, errar é humano! "
Muito inteligente o modo como ele fala abertamente sobre esses assuntos...