Boa noite.
Primeiramente, nós, da banca de defesa, congratulamos o excelentíssimo Juiz, os sábios jurados e a digníssima banca da promotoria, assim como demais membros do fórum Valinor que prestigiam este julgamento.
Estamos aqui para mostrar-lhes que Maeglin, filho de Eöl, não é culpado de nada a não ser ter sido uma ferramenta do destino.
Para analisarmos os atos do réu precisaremos retroceder até sua infância. Aredhel, sua mãe, foi aprisionada por Eöl na floresta de Nan Elmoth. Quando nasceu, Maeglin foi condenado ao mesmo destino de sua mãe: jamais sair de Nan Elmoth desacompanhado e nem poder procurar seus parentes maternos.
Certo dia, cansado da injustiça de seu pai, Maeglin convence sua mãe a partir, pois ela sabia a localização de Gondolin, e assim partem rumo à liberdade, mas a sombra sinistra de Eöl os persegue até Gondolin, onde este, visando atingir Maeglin, mata Aredhel na frente do próprio filho e de Turgon, senhor do Reino Oculto, que acaba por condenar Eöl à morte.
Desde o momento em que Maeglin chegou a Gondolin, amou Idril Celebrimdal, mas por respeito às tradições dos eldar, nunca a assediou, como a acusação alega que fez. Onde há crime nesse amor platônico nutrido pelo réu? Qual o motivo para que a promotoria denigra a imagem do réu no que se refere ao puro amor de um elfo por uma elfa?
Por sempre ter respeitado as leis de Gondolin, Turgon deu a liderança de uma das Doze Casas a Maeglin e durante a Nirnaeth Arnoediad, Maeglin cumpriu com sua obrigação e lutou ao lado de Turgon, junto com os demais líderes da cidade. Ora, se o réu fosse um criminoso desde sua chegada a Gondolin, teria deixado o rei à própria sorte ali, no meio da mais triste das batalhas de Beleriand, mas não, ele lutou firmemente ao lado de Turgon.
Depois dessa batalha, Turgon cria a proibição de qualquer conhecedor dos caminhos que levavam a Gondolin sair das Echoriath, mas com exceções quando a missão se mostrava importante para o futuro do reino. O próprio Turgon enviou mensageiros à foz do Sirion para que tentassem alcançar Valinor, mas todos falharam.
Maeglin, sabendo que as reservas minerais do interior das Echoriath não durariam para sempre, organizou incursões ao lado exterior para que fossem encontradas futuras minas, já que sem metal os gondolindrim ficariam completamente indefesos.
Um dia chega um mortal acompanhado do único sobrevivente enviado por Turgon rumo a Valinor. Tuor era seu nome, se dizia enviado por Ulmo, mas falhou miseravelmente em convencer o rei e seus conselheiros.
Turgon, sendo um rei bondoso, permitiu que Tuor vivesse em Gondolin até sua morte. Este mortal, aproveitando-se de tudo que os noldor lhe ofereciam de conhecimento, seduziu Idril que, cochichando no ouvido do rei, convenceu seu pai a permitir o casamento que ia contra TODOS os costumes dos eldar. Um mortal e uma imortal, algo completamente contra a natureza das duas raças criadas por Erú Ilúvatar, que têm destinos separados. Mas Turgon preferiu dar a mão de sua filha a um mortal que falhou na única coisa que fez na vida do que a Maeglin que sempre se mostrou leal ao rei. Nos perguntamos se Turgon não fez isso para que Tuor não incitasse o povo a abandonar Gondolin, já que nutria amor incondicional à cidade e todas as obras que havia feito.
Maeglin, mesmo traído pelo tio e rei, continuou leal ao seu suserano e continuou suas incursões ao exterior das Echoriath para garantir o futuro do povo.
Numa dessas incursões Maeglin foi capturado por servos de Morgoth Bauglir e levado até os Infernos de Ferro, que chamamos de Angband. Lá foi torturado física e mentalmente pelo próprio Senhor do Escuro, aquele que foi capaz de derrotar os demais Valar no início de Arda. Quem aqui tem coragem de dizer que suportaria tudo isso? Se Finrod Felagund, um nascido em Valinor durante a era das Árvores, fio derrotado por Sauron, quem seria capaz de derrotar Morgoth?
Antes de prosseguirmos, gostaríamos de fazer um pequeno adendo. A promotoria acusa o réu de denunciar a localização de Gondolin, mas é sabido que Morgoth já sabia que Gondolin estava localizada próximo às Echoriath porque Húrin denunciou a localização ao bradar pela ajuda de Turgon e amaldiçoar seu antigo anfitrião. Depois de esclarecermos esse ponto, continuemos.
Os sábios dizem, com razão, que quem vê pelos olhos de Morgoth enxerga tudo deturpado. E com Maeglin não foi diferente. Este nobre noldo, Senhor da Casa da Toupeira, viu o futuro horrendo que engoliria Gondolin e sua população. A cidade seria destruída até sua fundação, a colina seria nivelada com a planície e nenhum vestígio restaria.
Ora, diante desses fatos, Maeglin decide pela única opção capaz de salvar Gondolin da destruição total: ajudar o Sinistro Inimigo do Mundo.
Mas não foi o amor por suas obras que motivou Turgon a ficar na cidade e condenar seu povo? O mesmo amor que motivou Turgon a condenar seu povo, pois já fora avisado por Ulmo de que seu reino seria destruído, levou Maeglin a tentar salvar alguma coisa da destruição total.
Arrasado mental e emocionalmente, Maeglin volta a Gondolin, mas o terror de Angband nunca o deixou, pois Morgoth nunca abandona seus atormentados, pois sua maldade não tem limites e sua mente é como uma mão de braço comprido que os acompanha onde quer que estejam.
Motivado pelas visões aterradoras que Morgoth engendrou em sua mente e pela traição de seu tio, que se mostrou um péssimo governante, já que arriscou a vida de seu povo pela ganância e vaidade da beleza de suas obras, Maeglin realmente ajudou as hordas de Morgoth a invadirem a cidade, mas ele sabia que Morgoth o recompensaria deixando que governasse como seu lugar-tenente em Gondolin e poderia reconstruí-la e deixá-la ainda mais bela. Ora, reino vassalo é melhor que reino nenhum, onde o povo é obrigado a vagar pelos campos sem água nem descanso, como Turgon condenou seu povo a viver.
Como consideração final da banca de defesa: Turgon fora avisado Vinyamar antes da partida para Gondolin que ele não deveria ter amor em excesso pela cidade, afinal Turgon também estava sob a condenação de Mandos e quando o perigo se aproximasse viria alguém de Nevrast para avisar. Tuor foi o enviado como mensageiro de Ulmo para anunciar o perigo e que a partida de Gondolin era necessária, porém Turgon decidiu desobedecer apesar de ser de seu conhecimento as consequências desses atos. O orgulho e apresso pela cidade foi o que mais contribuiu para as mortes decorrentes da Queda de Gondolin, e para aquela população um outro fim seria dado caso tivessem partido para a foz do Sirion, como Ulmo aconselhou.
Maeglin, no desespero para salvar o reino e o que fosse possível de sua população, sucumbiu perante a tortura de Morgoth para fazer aquilo que era dever de Turgon, o verdadeiro culpado pelas mazelas de Gondolin.