"Então é isso. Acabou."
Veniss se vê andando num cenário completamente branco, sem chão, teto ou paredes mas em que, apesar de tudo, ele consegue andar como se existisse, sim, um chão, mas sua brancura se confundisse com a dos outros lugares de tal modo que ele não podia distinguir o que era o que. Ele está usando vestes igualmente brancas e parece diferente do que ele se lembrava de seu derradeiro combate. Algo mais leve, algo mais limpo. As feridas todas haviam se curado sem deixar qualquer lembrança, como se nunca houvessem existido. Aliá, parecia que nunca existia em seu corpo qualquer ferida, dor, mancha ou impureza. Ele parecia tão limpo quanto suas vestes, embora não tão branco. Se pudesse se ver, diria, também, que estava mais bonito, com uma aparência mais tranquila e com um que de angelical.
Ele lembra das derradeiras cenas de sua vida. O primeiro combate com o orc naquela cidade. A druida que havia devolvido a sua vida. O outro combate, onde ele sozinho derrubara três orcs, apesar dos gritos de "tolo" da druida (talvez se a tivesse escutado ele ainda estivesse vivo)... Quando, de repente, ele uma voz, fraca, mas alegre e que, aos poucos, vai ficando mais forte, à medida que ele vê ao longe uma pequena silhueta que vai se aproximando. Aos poucos ele consegue distinguir algumas feições do portador daquela voz. Um rosto jovial, embora não exatamente jovem de um homem de pele bronzeada, olhos alegres cabelos escuros e curtos e um bigode e um cavanhaque das mesmas cores. Belas roupas de rufião: um camisão branco de mangas bufantes(não tão branco como o seu branco, mas branco) coberto por uma túnica alaranjada com padrões vermelhos que lembravam interrogações e uma gola cinza. Em suas mãos levava um alaúde que parecia ser de ônix ou alguma outra pedra e, na cabeça, a familiar máscara bicromática de seu protetor.
"Então és de Olidammara? Sabe me dizer onde estou?
"Está aqui. Aqui que não é lá, mas também não é ali embaixo."
"Falas em enigmas. Com certeza é grande entre os seguidores do Ladino. Veio para me levar para os grandes salões onde brindaremos eternamente à nossa sorte?"
"Vim para te levar. Aonde? Não importa. Dize, onde queres ir?"
"Quero viver. Quero continuar. Não é possível que isso seja o fim."
"Na verdade é. Ou não é. Talvez. Isso cabe a você"
"Quero viver!"
"Não grita! Se você quer viver, vai viver. Mas vê se não morre de novo certo? E seja um pouco engraçado de vez em quando pra variar. Um servo de Olidammara sem graça... Bem... Não tem graça nenhuma."
"Mas e agora...?"
Antes que terminasse a frase, Veniss viu todo o branco a sua volta começar a se dissolver e se tornar negro. Suas vestes também sumiram e ele estava mais uma vez com suas roupas de sempre, mas também desapareceu depois de um tempo (se é que existia o tempo ali). Em poucos instantes, negro era tudo que ele via. Como um longo sono sem sonhos do qual ele não podia acordar.
Estirado no chão da feira, entretanto, seu corpo inerte estremeceu levemente.