Mercúcio
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Essa reação que Ciro tem enfrentado ao recrudescer as críticas a Lula é mais um efeito bem interessante da polarização - que, como já comentei, se perfaz não porque seus polos representam conjuntos opostos ou porque são igualmente extremos em suas expressões (tão cômodo negar a polarização sob essa redução, né?), mas porque se comprazem em se repelir, e se confortam nessa posição. O objetivo desta eleição se reduz para um lado a derrotar Bolsonaro assim como para o outro a derrotar Lula. Para quem está com Lula, criticá-lo só pode ser um ato bolsonarista, ou um ato que favorece Bolsonaro, então não pode, não pode! A crítica sobre o seu próprio lado e perspectivas sobre o projeto de governo que se está votando são simetricamente nulas.
Eu acompanho as plataformas de Ciro desde 2018. Ele nunca aliviou nas críticas a Bolsonaro - aliás, muito mais pesadas que contra Lula (até porque proporcionais ao que o atual presidente tem praticado). Enquanto eram só a Bolsonaro estava tudo bem, Ciro estava "do lado de cá"; mas foi só intensificar as críticas a Lula e aos governos do PT para ele se tornar quase indiferenciável da turba da extrema-direita. O tio bolsominion compartilhou Ciro criticando Lula: pronto, Ciro tá do lado de lá! Não é muito diferente desse mesmo tio que me chamava de petista quando eu já criticava Bolsonaro em 2017.
A única coisa mesmo que fica sem jamais ser atacada é o projeto. Pouco importa se o candidato debate a sério os problemas do país, se escancara em detalhes a solução proposta; não interessa que Lula esteja escondendo o jogo, nem interessa com quem esteja se aliando: todos estão comprometidos na luta contra o fascismo, é por isso, é por isso... primeiro a gente tiraa Dilmao Bozo, depois a gente pensa. Como se os motivos que o criaram fossem completamente irrelevantes e a sua mera derrota, não obstante o que se projeta para os próximos quatro anos, fosse suficiente para nos livrarmos de vez dessa semente.
Com todo o respeito, camarada Eriadão, acho que você constrói um espantalho aí...
Eu votei no Ciro em 2018 e também o acompanhei ao longo desse tempo todo, li o livro que ele lançou, estive em três eventos com ele desde 2016, testemunhei (e aplaudi) esse esforço de percorrer o país, de pular de Universidade em Universidade, de rádio em rádio, de dialogar com gente muito boa em suas respectivas áreas pra construir, pra imaginar, pra desenhar, pra propor...
Disse que tenho acordo com muito da crítica que Ciro faz da economia-política dos governos petistas, elogiei a imaginação e a engenharia institucional em termos de proposta de (re)desenho do Estado...
Disse também que, a meu ver, o Ciro cometia um erro tático ao queimar pontes com o petismo. Ainda assim, disse que considerava legítimo que ele buscasse construir o seu espaço e que não achava que ele tinha que viver de lamber o lulopetismo. Disse também que em relação às críticas do Ciro ao PT, achava que ele errava não tanto no conteúdo, mas no tom, concorrendo para armar aí uma teia de ressentimentos que em nada contribui para avançar as propostas que ele próprio defende. E não... eu não acho que o PT, de sua parte, seja a santa do altar.
Mas desde então, sonhando em ser o herdeiro do bolsonarismo arrependido, acho que o Ciro foi só elevando o tom e a violência dos ataques a ponto virar mesmo fornecedor da campanha do Bolsonaro, linha auxiliar mesmo. Acho também que essas críticas perderam qualidade e desaguaram, em boa medida, no mais raso antipetismo. Eu sei que tudo isso é medido, mas discordo dessas escolhas táticas e acho mesmo que, nessa linha, o Ciro caminha para um isolamento político ainda maior. Minha aposta é a de que ele vai ser engolido pelo voto útil mesmo e acho que o PT tem mais é que comer pelas beiradas, capturando a fatia do eleitorado do Ciro que ainda está vacilante.
Outro ponto. Acho curioso, aliás, que os ciristas falavam, nas redes, na construção de uma frente ampla e ante a incapacidade do Ciro de compor uma única aliança, de repente, estão aí a sonhar com um projeto cesarista, sem explicar muito bem como pretendem imprimir um reformismo de alta temperatura ao país sem construção de base política.
Aliás, sobre as ironias em relação ao Alckmin (aqui não são suas ironias, Eriadan):
Ciro Gomes: "PDT participa de construção ampla com Alckmin, Datena e Kassab"
Ciro Gomes: "PDT participa de construção ampla com Alckmin, Datena e Kassab" |
www.poder360.com.br
O Ciro bem que queria ter fechado esse apoio...
Mas aí o Alckmin fechou com o Lula e de repente virou o diabo.
Pra fechar, falando por mim, como já disse aqui, minha adesão ao Lula é pragmática e considera que esta eleição não é qualquer eleição; considera que o tabuleiro político se moveu desde 2018 e que não é mais momento pra arrotar purismos e bater pezinho. Quanto ao mais, eu não tenho que criticar o "projeto" do Ciro, porque, reitero, tenho acordo com boa parte do que está ali e cheguei a dizer aqui - é só usar a ferramenta "pesquisar" - que, no papel, o considerava inclusive mais avançado que o petismo. Só não vejo qualquer avanço na construção das condições objetivas para avançar o que ali está.
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