O Índice de Liberdade Econômica foi positivo e significativo nos dois modelos em que foi incluído, sendo que sua magnitude varia consideravelmente entre os casos: em termos médios, no modelo de efeitos fixos um incremento de 10 pontos no Índice está associado a 2,7 pontos a mais no CPI, enquanto que no modelo de efeitos mistos esse valor é de 4,4 pontos. Em qualquer caso, a associação entre os indicadores é forte, e sugere que países onde a economia seja mais livre também tendem a apresentar menor incidência de corrupção. Embora tal resultado vá ao encontro da literatura [11], é importante ressalvar que, dado o fato de o Índice de Liberdade Econômica incluir um indicador de liberdade da corrupção, a associação encontrada com o CPI pode ser espúria. Assim, o segundo modelo de efeitos fixos e o segundo modelo de efeitos mistos abrem mão de tal variável, e utilizam alguns de seus componentes desagregados.
Nesse sentido, o coeficiente para os direitos de propriedade foi positivo em ambos os modelos, mas foi significativo apenas no modelo de efeitos mistos, o que requer maior cautela em sua interpretação. A garantia de tais direitos pode ser encarada como uma proxy para o vigor da lei, que por sua vez tem papel fundamental para combater a corrupção [12]. Contudo, esta também tende a estar muito associada ao nível de desenvolvimento humano do país, o que pode gerar multicolinearidade e afetar a estimativa do parâmetro.
Para os gastos do governo, os dois modelos apontam que, em termos gerais, maiores níveis de gastos estão associados a menores níveis de corrupção (maior CPI). A princípio o resultado pode parecer contraintuitivo, a depender do arcabouço teórico que se leve em conta na análise. A fim de testar se tal relação é válida para países com níveis de desenvolvimento maiores, criou-se uma variável de interação entre os gastos e uma dummy identificadora de tais países (com IDH maior ou igual a 0,7). Nesse caso a relação se inverte, de modo que incrementos nos gastos governamentais se associam a maiores indicadores de corrupção percebida. Tal constatação reafirma a ideia de que, ao analisar a relação do tamanho do governo (em termos de seu nível de gastos) é necessário levar em consideração o nível de desenvolvimento do país, uma vez que para países onde o nível de desenvolvimento é baixo, poucos gastos governamentais podem indicar a falta de estruturas mais básicas, que venham a garantir outros fatores institucionais importantes, como os direitos de propriedade. Nesses países o governo e a lei tendem a ser mais fracos, de modo que torna-se difícil coibir, vigiar e punir atos de corrupção. Por outro lado, em países que já atingiram um nível de desenvolvimento alto ou muito alto, onde os instrumentos da lei estão solidamente estabelecidos, a continuação da expansão do Estado pode ser um fator que incremente as possibilidades de corrupção. Nesse sentido, quanto maiores os gastos do governo, maiores as quantidades de dinheiro fluindo através dos homens de Estado e, por consequência, maiores os incentivos e oportunidades para que interesses particulares busquem capturar parcela de tais fluxos.
A liberdade de negócios, por sua vez, se relaciona positivamente com o CPI nos dois modelos, ou seja, quanto maior a liberdade que os cidadãos possuem para obter uma licença, iniciar, manter ou fechar um negócio, menor tende a ser a corrupção percebida naquele país. O resultado é esperado, uma vez que a falta de tal liberdade geralmente se dá por excesso de burocracia (muitos procedimentos requisitados), que elevam o custo (em tempo e dinheiro) para iniciar ou encerrar uma atividade, o que por sua vez abre oportunidades de suborno para os agentes do governo envolvidos com tais regulações, tanto em um nível primário – individualmente, para “facilitar” os procedimentos – quanto em grande escala – através de grandes empresas já estabelecidas procurando manter tais regulações para impedir a concorrência. Os coeficientes são relativamente semelhantes entre os modelos estimados, de modo que o acréscimo de dez pontos no indicador de liberdade de negócios está relacionado, em média, a um CPI entre 0,97 e 1,2 pontos maior.
Para a liberdade de comércio, os coeficientes foram positivos, mas apenas o modelo de efeitos fixos revelou significância para o mesmo. A interpretação de tal resultado é semelhante àquela da liberdade de negócios: como a liberdade de comércio se relaciona com a existência de barreiras tarifárias e não tarifárias sobre exportações e importações de bens e serviços, ela também pode refletir o protecionismo a empresas nacionais e/ou já estabelecidas internamente, que podem manter relações escusas com a burocracia governamental a fim de garantir tal proteção e reduzir a concorrência. Também é preciso notar que tal variável se correlaciona com a de comércio internacional, de forma que a insignificância estatística no modelo de efeitos mistos pode se dever à multicolinearidade.
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[11] Chafuen e Guzmán (2000), Paldam (2002), Goel e Nelson (2005), Shen e Williamson (2005), Saha, Gounder e Su (2009)
[12] Para uma discussão mais específica sobre essa conexão, ver Nwabuzor (2005). O trabalho de Uslaner (2005) apresenta resultados empíricos suportando esse argumento.