USAR MÁSCARA em público antes significava uma fantasia de carnaval ou uma forma de cobrir o rosto para passar despercebido. No entanto, em poucos meses, devido à covid-19, esse item de vestuário passou a ser utilizado diariamente.
A
Organização Mundial da Saúde recomenda o uso de máscara cirúrgica — o tipo encontrado em hospitais — para pessoas que estejam com sintomas de gripe ou que estejam cuidando de uma pessoa doente. Os
Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos aconselham ainda o uso de uma cobertura de pano para todos que frequentarem locais públicos lotados. Algumas pessoas estão indo além das diretrizes oficiais e passaram a utilizar também luvas reutilizáveis ou descartáveis em público.
Os especialistas alertam, no entanto, que o uso indevido de qualquer um desses equipamentos de proteção pode expor a pessoa a praticamente a mesma quantidade de germes se estivesse sem proteção, pois as máscaras e luvas acumulam vírus se não forem limpas ou trocadas com frequência, além de serem uma possível fonte de contaminação das mãos ou itens tocados posteriormente sem proteção.
“Quando vejo alguém [de luvas] tocando as superfícies e depois mexendo dentro da bolsa, penso: agora ocorreu contaminação cruzada e qualquer tipo de proteção utilizada foi anulada”, diz
Jade Flinn, professora de enfermagem da unidade de biocontrole da Universidade Johns Hopkins em Baltimore, Maryland.
O distanciamento social e a lavagem frequente das mãos continuam sendo as medidas mais importantes, segundo especialistas, para evitar a propagação ou a infecção pelo SARS-CoV-2, o vírus que desencadeou a pandemia global.
Mas caso você saia de casa utilizando máscaras e luvas, veja como limpá-las, quando descartá-las e por que você não precisa ter medo de carregar o vírus nas demais peças de roupa que estiver usando.
Como limpar uma máscara de tecido
Um ciclo de lavagem padrão é suficiente para remover o coronavírus do tecido, de acordo com a
OMS e os
CDC.
“Por ser um vírus envelopado, ele é altamente suscetível a detergentes”, diz
Rachel Graham, virologista da Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill. O envelope que encapsula vírus como influenza e SARS-CoV-2 consiste em uma delicada camada de lipídios oleosos e proteínas, que fica unida por tensão superficial.
Os detergentes e sabões para lavagem de roupa contêm surfactantes, produtos químicos que rompem facilmente esse envelope, reduzindo a tensão superficial, explica
Joshua Santarpia, patologista do Centro Médico da Universidade de Nebraska, em Omaha. Uma molécula de surfactante possui uma extremidade que atrai óleo e gordura, enquanto a outra atrai água. A extremidade atraída pelo óleo invade o envelope do coronavírus e o rompe. Os resíduos ficam presos em invólucros circulares do surfactante denominados micelas e são levados pela água.
“A interação desse surfactante com o envelope viral destrói rapidamente a capacidade infecciosa do vírus”, explica Santarpia. Surfactantes potentes estão presentes na maioria dos produtos de limpeza doméstica e industrial.
A temperatura da água na máquina de lavar não importa, desde que você use detergente. “As máscaras de algodão suportam temperaturas mais altas; portanto, se você se sente melhor lavando-as com água quente, vá em frente”, diz Graham. O calor forte e concentrado da secadora de roupas oferece proteção adicional: é suficiente para matar a maioria dos micro-organismos.
E se eu utilizar uma máscara cirúrgica ou N95?
Ao contrário das proteções de tecido, as máscaras médicas descartáveis são feitas de TNT sintético, que é danificado no ciclo típico de uma máquina de lavar.
“Se essas máscaras forem lavadas, sua capacidade de filtragem ficará altamente comprometida”, diz Santarpia. Por necessidade, os profissionais de saúde estão reutilizado os respiradores N95 — as máscaras justas e em forma de cúpula
são o único método confirmado de filtrar eficientemente pequenas partículas como os vírus. Os locais onde Flinn e Santarpia trabalham utilizam desinfetantes de uso hospitalar que preservam a integridade da máscara durante o processo de limpeza.
O hospital de Nebraska, em Santarpia, também está higienizando as máscaras com UV-C, um tipo de luz ultravioleta de alta energia. Isso permite que a equipe reutilize as máscaras diversas vezes, diz Santarpia. Como a UV-C é considerada mais intensa e apresenta maior probabilidade de causar câncer em comparação à UV-A e UV-B, esse tipo de esterilização só deve ser utilizado sob a supervisão de especialistas treinados quanto ao uso da luz UV-C,
de acordo com os CDC.
Para o público em geral, o ideal é que as máscaras médicas sejam utilizadas apenas uma vez — e, caso sejam reutilizadas, devem ficar guardadas entre as utilizações por tempo suficiente para o vírus se deteriorar.
Por quanto tempo? Os cientistas ainda estão analisando exatamente quanto tempo o SARS-CoV-2 dura nas superfícies, no ar e nas máscaras. Evidências preliminares divulgadas no fim do mês passado, sem ainda terem sido revisadas por pares,
constataram que resíduos do coronavírus permaneceram por tempo considerável nos respiradores N95.
“O que devemos ter em mente é que o vírus pode permanecer contagioso por várias horas, provavelmente por alguns dias, em diversas superfícies, incluindo as máscaras”, de acordo com
Amandine Gamble, uma das autoras do estudo e especialista em doenças infecciosas da Universidade da Califórnia em Los Angeles. Ela suspeita que o coronavírus fique afixado nas fibras da máscara, o que representa um risco até que, com o tempo, ocorra a degradação espontânea do germe. Por esse motivo, os CDCs desaconselham o uso do
respirador N95 por mais de oito horas no total e, a menos que especificado de outra forma pelo fabricante, esses filtros faciais devem ser descartados após cinco reutilizações.
Mas mesmo fora dos hospitais, os respiradores N95 reutilizados repetidamente em público
podem coletar vírus ao longo do tempo e aumentar as chances de exposição acidental do usuário.
“O importante é saber que a probabilidade de infecção aumenta com o número de partículas virais com as quais se tem contato”, ela explica. “Não é um processo variável, mas gradual.”
As luvas podem ser reutilizadas e lavadas?
As organizações de saúde pública não recomendam o uso de luvas de qualquer tipo para evitar contaminação pelo coronavírus.
“Se sua pele estiver intacta, serve como uma barreira imunológica bastante eficaz”, diz Graham, acrescentando que também não há evidências de que o coronavírus possa atravessar um corte e ressaltando que ele não circula bem na corrente sanguínea.
No entanto, se suas preocupações forem grandes a ponto de não conseguir seguir as diretrizes de saúde e você sentir a necessidade de uma camada extra de proteção, tenha o mesmo cuidado que teria com as mãos sem luvas. Limite o número de objetos que você toca e, como sempre — não toque no seu rosto.
“Preocupo-me com o fato de que algumas pessoas acreditam estar protegidas” com as luvas, diz
Jane Greatorex, virologista da Universidade de Cambridge, no Reino Unido “que precisam ser descartadas ou lavadas da mesma forma que a mãos.”
Os CDC fornecem
instruções passo a passo sobre como retirar as luvas e recomenda lavar as mãos depois de retirá-las.
“As luvas de uso único não devem ser lavadas, pois há grandes chances de haver um furo nas luvas”, diz Santarpia. “As pessoas devem se concentrar muito mais na higiene das mãos do que no uso de luvas.”
E as outras peças de roupa que estou vestindo?
Ir ao supermercado não significa que você precise jogar fora suas roupas. Isso porque vírus envelopados como os coronavírus
não sobrevivem facilmente em superfícies porosas, como camisetas de algodão, blusas de poliéster e jeans.
A disseminação dos coronavírus ocorre principalmente por meio de gotículas respiratórias, compostas principalmente de água e que mantêm o vírus úmido até ele encontrar outro corpo. Com o tempo — que varia de alguns dias a uma semana — os vírus se deterioram e simplesmente secam, diz
Gerardo Lopez, microbiologista ambiental da Universidade do Arizona que
estudou como ocorre a transmissão dos vírus em diversas superfícies.
Por ser um germe que se espalha tão facilmente como o SARS-CoV-2, ele explica que é importante limpar frequentemente qualquer coisa — mãos, máscaras, maçanetas, telefones — que receba contato humano regularmente. “Não subestime a possibilidade de permanência de um vírus sobre algo”, acrescenta Lopez.
Mas não é preciso se preocupar com as roupas que você utiliza no dia a dia. Quando as gotículas respiratórias pousam em tecidos como o algodão, elas absorvem um pouco da umidade, secando as gotículas e expondo as partículas do vírus e seus frágeis envelopes ao ar.
“A camada lipídica externa vai secar e a proteína que ele precisa para se afixar nos receptores deixa de funcionar”, diz Lopez. O material genético do vírus pode até permanecer, “mas não é mais viável”, acrescenta ele. E sua máquina de lavar cuidará disso.