Novo coronavírus: caso Ronaldinho me mostrou como Brasil perde do Paraguai
Perrone
17/03/2020 13h51
Quando desembarquei em Assunção, no Paraguai, para cobrir o caso Ronaldinho Gaúcho, no final do sábado retrasado, minha temperatura foi medida por agentes de saúde na saída do avião. Antes de pisar no salão do aeroporto.
Nesta segunda, ao chegar ao mesmo aeroporto para voltar para casa minha temperatura também foi medida na entrada do salão principal em busca de um possível sintoma do novo coronavírus.
Quando embarquei em Cumbica rumo ao Paraguai ninguém mediu minha temperatura. Na volta, a mesma coisa. Nada de agentes públicos verificando as condições dos passageiros que acabavam de chegar do Paraguai em Cumbica.
Esses fatos mostram resumidamente como o caso envolvendo os documentos paraguaios falsos de Ronaldinho Gaúcho e Assis me revelaram a distância que o governo paraguaio abriu em relação ao brasileiro no quesito combate à evolução do novo coronavírus.
No último domingo, andei por ruas desertas do centro de Assunção em busca de um restaurante. Boa parte da população atendeu ao pedido do governo para não sair de casa. Parques estavam fechados, e os poucos restaurantes abertos praticamente vazios, atendendo mais a pedidos para viagem.
No Brasil, no mesmo dia, manifestantes favoráveis ao governo Bolsonaro foram às ruas. O presidente chegou a participar de ato com seus entusiastas em Brasília.
Quando uma funcionária do hotel em que me hospedei em Assunção me perguntou como estava a prevenção contra o novo coronavírus no meu país, falei sobre as manifestações e da atuação do presidente. Seu queixo literalmente caiu. "Como assim, o presidente apoiou uma aglomeração?", disse ela.
Sua indignação teria sido maior se eu tivesse dito que Bolsonaro chegou a tocar os manifestantes, algo que Ronaldinho Gaúcho, Assis e seus colegas de prisão foram orientados a não fazer. Eles participaram de palestra sobre medidas de prevenção.
O quartel da polícia paraguaia adaptado para também receber presos limitou as visitas a uma pessoa por detento. E os visitantes precisam passar por uma checagem médica antes de entrarem.
Nesta segunda, as autoridades paraguaias adotaram medidas restritivas para a circulação de pessoas e veículos entre a noite e a madrugada nas ruas do país. A decisão foi tomada após autoridades constatarem grupos de pessoas que se reuniram no fim de semana para beber e se divertir em locais públicos, ignorando o pacote de medidas anunciadas pelo governo.
Enquanto isso, no Brasil apoiadores de Bolsonaro defendiam o posicionamento do presidente em relação às manifestações e o risco de propagação do vírus que elas representam.
No início da semana passada, o governo paraguaio, quando existiam cinco casos confirmados no país, adotou medidas drásticas. Eventos com aglomerações e até aulas foram suspensas. A conta até a publicação deste post estava em sete casos.
Aos poucos, algumas localidades no Brasil vão adotando uma ou outra dessas ações. Isso reforça a impressão que tenho de que o Brasil está sempre pelo menos um passo atrás do Paraguai no combate ao novo coronavírus.
Ficou claro para mim que o governo paraguaio escancarou sua preocupação e se esforçou para que a população tivesse consciência da gravidade do tema. A informação segue seu fluxo normal e a maior parte das pessoas age de forma consciente.
Demonstração disso é que até restaurantes que insistiram em ficar abertos adotaram uma nova postura para convencer as autoridades. Um tradicional restaurante do centro de Assunção, que tem também um anexo com uma lanchonete, diminuiu o número de mesas para que as pessoas fiquem menos próximas umas das outras e anulou assentos em seu balcão. Há álcool em gel disponível em todas as mesas e no balcão. Pelo menos uma rede de supermercados orientou seus clientes a irem sozinhos fazer as compras. Pediu também que idosos e crianças não compareçam.
No Brasil tem sido uma confusão só. O governo aperta aqui, relaxa ali e os cidadãos batem cabeça. Enquanto isso, o vírus agradece e se espalha.