Livro de estreia do @Béla van Tesma !
Brasil Ópera-Bufa, de Luís Fernando Neis Blaschke - editorapatua
LUÍS FERNANDO NEIS BLASCHKE Luís Fernando Neis Blaschke nasceu aos 4 de setembro de 1982 em Porto Alegre (RS), onde cresceu e vive até hoje, sozinho, sem gato nem cachorro, fazendo o tipo ermitão num apartamento antigo de três quartos. De humor fleumático-melancólico, foi cedo condenado a...
www.editorapatua.com.br
§
Conheça 3 poemas do livro Brasil Ópera-Bufa, de Luís Fernando Neis Blaschke
Aviso
Em tempos como os tais em que se vive (hesito
Chamá-los de sombrios, como é sempre dito,
Porque é recurso de retórica surrado),
Quando se exige a cada cidadão que um lado
Bem definido escolha, como fosse urgente,
Sobre um qualquer assunto que se lhe apresente;
Em tempos como os tais, parece até mais sábio
Fazer silêncio, um zíper nos selando o lábio,
Quando não se domina bem o tema em pauta,
Pois opinião de leigo é doxa e não faz falta.
Protocolo de Quioto, Acordo de Paris?
Só ouvi falarem, mas não sei nem jamais quis:
Não tenho a pretensão de controlar o clima.
Pouco me importam Chernobil e Fukushima;
Lamento as mortes, mas é tudo: não consigo
Fazer um julgamento acerca do perigo
Que a usina nuclear de fato representa,
Ou se é melhor painel solar onde não venta.
Eu não duvido que o planeta seja um globo
E acho simpático ser primo do bonobo:
Questões assim não deixam dúvida. O problema
É quando entramos num terreno em que o dilema
Não se resolve com ciência stricto sensu
E abre-se a arena do debate sempre intenso,
E sempre interminável. Nada contra isso:
Há quem dedique a vida a esse compromisso,
De compulsar milhões de livros sobre tudo
Que diz respeito à vida em sociedade; estudo
Que não me atrai em nada, alheio como vivo
Em minha torre de marfim, contemplativo…
Não faço parte de nenhum partido ou grupo:
Somente de poesia e letras eu me ocupo.
E dos políticos, que penso? Ou Bolsonaro:
Qual é minha opinião acerca desse ignaro?
De Lula e Moro e dos ministros do Supremo?
Eu dou de ombros a tudo, em meu desdém extremo.
Mas não sou patriota?, agora tu me indagas.
E eu digo não, que eu vim ao mundo nestas plagas
Por mero acaso: a pátria é sempre um acidente.
Eu amo, todavia, a nossa brava gente
(Com tudo que essa ideia tem de abstrato e brega),
Que sua, sangra, e a seu país se doa e entrega.
Em benefício do Brasil juro que torço,
Porém nunca vislumbro um coletivo esforço;
Falta um projeto de nação, falta-nos rumo:
Eis num só verso minha análise, em resumo.
Hoje é assim ou sempre foi?, tu me perguntas.
Não sei mas, por exemplo, nossas leis defuntas:
Já não me dão muita esperança na Justiça
(Com efeito, esse assunto até me dá preguiça).
E os três Poderes estão podres: ratazanas
Roeram a bandeira pela qual te ufanas.
Nosso antigo monarca, Dom Pedro Segundo,
Expulso foi; mandaram-no correr o mundo;
Deram fim à nobreza, ao Antigo Regime,
Mediante um golpe militar e muitos crimes…
E em seu lugar apenas temos outro bando.
Além do mais, recordo o Doutor Johnson, quando
Diz ele: “o patriotismo é o último refúgio
Do canalha”. De acordo. E acaba quando ruge o
Leão do Imposto… Aí, meu caro, sobram poucos:
Os cidadãos de bem fazem ouvidos moucos
Aos problemas do povo, ocultam seu dinheiro
De forma ilícita, até mesmo no estrangeiro,
Dizendo “imposto é roubo” ou coisa semelhante.
E vão marchar à rua atrás de algum berrante.
Nenhum político, outrossim, em alta estima
Eu tenho; e nenhum deles poupo em minha rima.
Por todo o exposto é que imagino cair dentro
Daquele círculo restrito: o extremo-centro.
Para a polêmica não tenho vocação;
Apenas dos políticos, de coração,
Zombo sem ver a quem, qualquer partido e cargo.
E dá-me inda mais gosto, e ainda é mais amargo
O fel satírico da minha pena, o acúmen
Com que os espeto, quanto mais de si presumem.
É um malho assim que algum caráter neles forja,
E é um dever cívico malhar aquela corja.
Mas, se pareço muito à esquerda reclinar-me,
Conforme o foco dado ao longo destes carmes,
No cômputo dos versos, é porque a direita
Ocupa a situação. Se a esquerda fosse eleita,
Seria o alvo preferível da devassa:
É que chutar cachorro morto não tem graça.
*
Prólogo
Duas quadrilhas, desiguais na indignidade,
Lá na bela Brasília (e um pouco em Curitiba),
Disputam o país — pra azar da sociedade
(É a tese que defende o humilde vate-escriba):
Uma, de esquerda chique e intelectuais orgânicos,
Mantinha um criminoso esquema de poder;
Outra, à direita, com maus bofes messiânicos,
Em contubérnio co’ a milícia está a viver.
Aqui as duas se desnudam brevemente
Para causar em vós risadas e repúdio:
É o que agora vereis, nas páginas à frente,
Contado em versos, em dois atos e interlúdio.
O que o prólogo oculta, o resto vos inteira:
Eis nossa grande ópera-bufa brasileira!
*
Resumo da ópera
— Como vota, deputado?
— Como puta devotado.