Haran
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É preciso cancelar o cancelamento
Julgamentos online desviam a atenção dos jovens e esvaziam debates importantes
Com o programa BBB, muita gente de esquerda está revendo seus posicionamentos e seguindo essa linha. Vide o grupo "Quebrando a Tabu":
É uma pena que muitos tenham precisado de uma bosta de programa como o BBB para começarem a intuir isso, já que são pouco sensíveis a discursos ou mídias que não estejam estritamente alinhados a suas ideologias sectárias. Foi preciso assistir em detalhes gente de carne e osso sofrer na mão de otários progressistas, para só aí tomarem alguma vergonha na cara. Isso sendo que, no BBB, o sujeito meramente sai do programa. Na vida real a pessoa sai do emprego, da amizade, do grupo social, ou até se mata.
O pior é que, ainda assim, o aprendizado deixa a desejar. Por exemplo...
Ele se sensibiliza, mas continua sectário: "bora ser tolerante pessoal, mas ainda não dialogo com fascistas malvadões". Mesmo parte da esquerda com algum senso de ridículo tenta empurrar esse sectarismo para "identitários", como se o sectarismo não estivesse também intrinsecamente presente na esquerda mais ortodoxa, de linha marxista ou similar, que combate "opressores", "fascistas", etc., e que enxerga "mal caratismo" mais em certo eleitorado do que nos correligionários corruptos ou que cometem agressão física ou verbal. Enfim, o sectarismo no identitarismo é mera herança do autofagismo proveniente da crença marxista na luta de classes.
Por exemplo, já os marxistas da URSS "cancelavam" antigos aliados, até apagavam inimigos de fotos, ou mesmo os chineses impunham sessões de autocrítica, onde o sujeito era humilhado publicamente, obrigado a admitir crimes e faltas morais frente a um público hostil, e caia em desgraça social - também era, pode-se dizer por analogia, cancelado. Lembro que a primeira vez que vi um filme que retratava isso, achei forçado... Pensei: "Roteirista forçou a barra... Tanto ódio, para no final não matarem o cara, e deixarem ele de boa? Se uma multidão está nesse nível de hostilidade, no mínimo o cara é arrebentado". Pelo menos era o eu achava, mas pesquisando depois, vi que o negócio era bem por ali mesmo, e hoje em dia, após o ódio virar um elemento tão comum no debate público, aquela realidade ficou evidente mesmo fora dos registros históricos.
Nesse sentido, sua excelência Mamãefalei ganhou fama, inicialmente, meramente com esquerdistas que não aguentavam o contraditório e metiam o louco, muitas vezes saindo na mão. Para quem acha que ele manipulava as situações ou sei lá o quê mais, tente imaginar ir discutir periodicamente em grupos liberais, ou católicos, e conseguir fazer tantos vídeos naquela mesma linha. Implausível. Só algumas ideologias, na sua maioria legítimas religiões (místicas ou políticas), têm esse sectarismo tão incrustado. Boa parte desse sectarismo religioso está calcado nas ideias de "vontade do povo" e "inimigos do povo", e como Eduardo Jorge disse, "quem é inimigo do povo está a meio caminho de ser eliminado". Em suma, a luta de classes marxista desemboca no sentimento de "nós contra eles" semeado pelo petismo e que contribuiu, inclusive, para a propulsão do bolsonarismo. E tudo isso se deu antes do identitarismo ganhar a força que tem atualmente.
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