A Mitologia das Mitologias
Praticamente todos os dias recebo algum tipo de e-mail com algum dos seguintes comentários: "Tolkien copiou os Elfos, Trolls e Anões da Mitologia Nórdica", "eu conheço uma mitologia X que tem o seguinte detalhe que é igualzinho a tal coisa da obra de Tolkien", "Númenor nada mais é do que uma cópia descarada de Atlântida", "que seres Tolkien copiou de outra mitologias e que seres ele inventou de verdade?" e assim por diante. Na verdade nenhuma dessas frases está completamente errada (!!!) mas sim mal colocadas ou mal formuladas.
Para começarmos a entender o relacionamnto da "Mitologia Tolkieniana" com as demais mitologias é importante analisarmos quais eram as intenções de Tolkien. No início, até aproximadamente a década de 1930 ele tinha como ideal a criação de uma mitologia para a Inglaterra (é simples de perceber isso nos History of Middle-earth 1 e 2 - os dois Lost Tales). A partir de aproximadamente 1930 o foco mudou um pouco e a palavra Inglaterra acabou sendo trocada por "Planeta Terra" e o que Tolkien estava escrevendo (e deixou inacabado) era uma mitologia das mitologias, as histórias que deram origens às histórias das diversas mitologiais atuais ou melhor: as histórias reais que acabaram gerando as lendas mitológicas que chegaram até nós através de várias mitologias.
Bom, vou explicar com mais calma pra passar a real genialidade da obra de TOlkien, que a faz única. Claramente seria muito fácil para Tolkien criar nomes diferentes para as raças que ele "utiliza'" dentro de suas obras. Se ao invés de "Elfos" e "Trolls" ele usasse "Churbis" e "Blirbs" as raças dicifilmente seriam reconhecidas como "retiradas da mitologia nórdica" mas continuariam tendo as mesmas características que conhecemos, apenas com fantásticos nomes diferentes. Mas não, Tolkien fez questão de manter os nomes encontrados em outras mitologias. Claro, com um objetivo (ou alguém acredita que ele usou "Elfos" achando inocentemente que ninguém ia pensar na possibilidade de serem os Elfos da mitologia nórdica?): que achássemos realmente os nomes "familiares".
Vamos analisar algumas histórias tolkienianas sob essa nova visão. Comecemos com Númenor e a sua Queda. Dificilmente alguém que conheça a lenda de Atlântida vai deixar de fazer a conexão Númenor-Atalante-Atlântida. Inclusive muitos textos foram criados traçando paralelos entre Númenor e Atlântida. Textos completamente dispensáveis e desnecessários pois Númenor É Atlântida. A história de Númenor é a história REAL que, de boca em boca no decorrer dos séculos acabou se tornando a lenda de Atlântida e foi imortalizada por Platão. Agora as perguntas "onde ficava Atlântida?", "onde foi parar?", "pq caiu?" e "quem residia nela?" são facilmente respondidas por qualquer um que tenha lido o Silmarillion.
Mais uma? O Kalevala finlandês. Muitas pessoas apontam as imensas semelhanças entre Kulervo e Túrin Turambar, afirmando que Tolkien simplesmente plagiou (como se ele fosse inocente ao ponto de achar que nunca ninguém perceberia as semelhanças) esquecendo de pensar que simplesmente Kulervo é Túrin, ou melhor, a história de Kulervo é uma versão secular, passada de boca em boca, modificada com o decorrer dos séculos acabando por se tornar o Kalevala ou parte dele.
Outra: panteões divinos. Vários e vários textos conectam os Valar com o panteão greco-romano, panteão egípcio, panteão celta, panteão nórdico e vários e vários outros panteões. Estudos também desnecessários, pois cada um desses panteões nada mais são do que idéias distorcidas dos Valar e Maiar que, passadas através dos séculos por homens ingênuos tornaram-se o que conhecemos hoje como religiões politeístas. E, bem ao estilo católico monoteísta de Tolkien, todas originadas em erro (pois os Valar não são deuses) e portanto validando como "possíveis/válidas" apenas as religiões monoteístas.
E assim por diante. Os Elfos da mitologia nórdica nada mais são do que tênues versões apagadas e alteradas pelo tempo dos fantásticos Elfos que residiram na Terra-média há mais de 7 mil anos atrás.
[por Fabio Bettega]