Eu gostei da primeira temporada, como deixei claro, à época, de um jeito torto, mas deixei. Esperava mais? Muito mais. Acontece que isso provavelmente é problema meu e das minhas expectativas.
Isso posto, a meu ver, o primeiro episódio da segunda temporada foi melhor do que toda a primeira temporada, hein? Gostei demais da conta de a série nos colocar naquela espécie de prólogo (?) em Dúrnost pré-congelamento, o que acaba por dar consistência e maior impacto — até mesmo criar uma rima cênica — com aquele momento da primeira temporada da Galadriel já em Durnost pós-explosão (não sei se é o termo certo) do corpo de Sauron, quando o lugar já está puro gelo.
O que acho fascinante, em ambas as situações, é que o cenário, Durnost, verde ou congelado, testemunha a ação de escolhas limítrofes, que haveriam de mudar o rumo da trama de todas as criaturas daquele universo. Ali acontece, por duas vezes, o que poderíamos chamar de virada de chave de narrativa, ou rima poética, que eu acho mais bonito, o que lá na frente, sabemos que dá origem à estrofe do encontro entre Sauron e Galadriel no mar.
Uma coisa curiosa é a seguinte: para mim, uma das melhores coisas da série tem sido o desenvolvimento do Halbrand (que eu quero pegar desde a primeira temporada. Mas vamos deixar para falar sobre meu dedo podre em outro momento, por favor). Tive receio de que, com a revelação de que ele era o Sauron, no fim da primeira temporada, a série não conseguisse conduzir o desenvolvimento do personagem de modo satisfatório, mas, até agora, tenho achado fascinante. Estou gostando da escolha de trabalhar a astúcia do personagem aliada à perversidade. Está funcionando bem.
Agora, para explicar o porquê de eu ter começado a falar que o desenvolvimento do Halbrand/Sauron é curioso, eu preciso falar sobre o prólogo novamente. Acho que ali a série titubeou, hesitou, não aproveitou o material que tinha. É de conhecimento comum da série o fato de que Sauron era um grande feiticeiro, isso não ficou restrito ao cânone. Achei um pouco problemático o fato de, nos primórdios, ele ser apresentado um tanto quanto fraco (não era, a gente sabe, tanto que congelou uma porção imensa da Terra Média quando "explodiu"), mas por que ser "derrotado" tão rapidamente? Era o propósito da série mostrar que a arrogância, a prepotência o derrubou?
Acho válido e coerente com o que foi mostrado na primeira temporada (inclusive, com a situação da Gala que, na primeira temporada, olhou tanto para o abismo, que ele não apenas a olhou de volta como a chamou para reinar com ele), mas acho que não precisavam mostrar um Sauron supostamente enfraquecido para provar o ponto. Mesmo porque, como eu já disse, ficou um cadinho contraditório ele ser subjugado daquela forma e, em seguida, causar um estrago daqueles com a perda da sua forma corpórea. Vale ressaltar, ainda, que eu esperava uma primeira versão corpórea do Sauron melhor esculpida, com maior presença, algo assim. (Mas deve ser expectativa minha, novamente).
Mais uma coisa que eu gostei, bastante, no episódio, e que está em consonância com a construção das camadas da personalidade do Sauron, e da série como um todo, foi a da discordância entre Elrond, de um lado, Gil-Galad e Galadriel de outro, sobre o que fazer com os anéis (A quinta série que habita em mim...). Embora a decisão tenha um caráter de urgência, ela ganha complexidade pelo fato de os argumentos de ambas as partes serem razoáveis. Tanto a perspectiva de usar quanto a de não usar os anéis pode condenar a todos. Aí reside o maior mérito de Sauron, colocar todos diante de escolhas impossíveis, e fazer com que se sintam culpados pelas consequências advindas do que escolherem.
Por termos conhecimento do porvir, tendemos a pensar que Elrond estava certo, porque embora não tenha forjado os anéis, Sauron instruiu Celebrimbor e, em última instância, (já tô dando um giro de 360°, aqui), todos os anéis estavam sob o controle do Um, mas não usar os anéis, abandonar a Terra Média, e esperar pela chegada dos males de Sauron, seria uma escolha justa? Complexo e, por isso, fascinante. É aquele negócio:
saltar da frigideira para o fogo. Mestre Círdan — o elfo mais velho, e sábio, da Terra Média — saltou, e, mesmo com toda a sua sabedoria,
foi corrompido pelos anéis, porque o poder, ora simbolizado pelos anéis, corrompe. Círdan fala, no episódio, que Celebrimbor queria forjar algo que comandasse o coração, ou algo do tipo, não é, mesmo? Esse algo já existe, se chama poder. O que o ferreiro fez foi apenas trazer algo do mundo invisível para o visível.